sábado, 1 de dezembro de 2018

O SUICÍDIO DO BOI

A imagem pode conter: nuvem, ar livre e água

A história desse "boi afogado" em Salvador foi tratada como -- mais -- um caso jocoso do cabedal de histórias afeitas ao realismo fantástico desta cidade (a mais Macondo das urbes latino-americanas). 

No entanto, enxergo essa narrativa bovina pelo viés do drama, que uma por uma linha cômica e divertida, como usualmente acomete estas plagas. 

Sigamos o fio por este pasto adubado.

O boi tinha 3 anos (idade que um animal desta monta já é considerado adulto). Veio da cidade de Teodoro Sampaio, no centro norte da Bahia. Era um boi de reprodução.

Ou seja, passava vida numa fazenda cruzando com outras vacas ou tendo o sêmen recolhido para produzir bezerros puros, fortes e saudáveis -- na lógica dos produtores, não pode haver erro nestes cruzamentos. A gestação do boi é muito longa. 283 dias. 9 meses e meio (maior que do ser humano). E, diferente de outros mamíferos, não há ninhada. Apenas um filhote por vez. Daí o porquê dessa eugenia darwinista escancarada.

No último sábado, nosso herói de 600 kg foi levado para a Fenagro para ser exposto como um boi de reprodução. Num lance de até 12 mil reais. Estava lá como um produto a ser exposto e colocado em leilão. Esperto, aproveitou o vacilo do transporte no desembarque e fugiu.

Num primeiro momento, os donos até tentaram recapturá-lo, mas ele se embrenhou mata adentro para (desejo dele) não ser mais encontrado.

O boi queria a liberdade. Passou cinco dias vagando como um animal livre, vadio, se alimentando de mato selvagem (ao invés da ração proteíca, balanceada e servida com hora marcada nas baias).

Quando o avistaram perto do aeroporto, a cavalaria montada da polícia foi chamada para a diligência. O boi correu para o mar (poético).

"Ele queria ver o mar", canta Renato Russo. O mar aqui é uma metáfora da liberdade. A imensidão do oceano em contraste com a prisão interiorana em uma fazenda de corte, leite e curtume.

O boi preferiu o exílio da morte que a recaptura. O mergulho definitivo que ceifou sua vida arrebentou o último laço que o prendia. O suicídio era uma prática comum entre os escravos quando recapturados pelos capitães do mato.

A história, na verdade, é um libelo de liberdade e uma crítica severa à indústria agropecuária -- animais alimentados para o abate, em cativeiro para reprodução continuada etc. A narrativa está pronta. Só precisa de alguém com talento para romancear e publicar.

Em seu último ato, o boi foi servido para uma multidão faminta que rasgou sua carne em cortes de açougue. Sua alma, no entanto, não foi repartida. Estava, finalmente, livre.

Parafraseando Mastruz com Leite, menestreis do cancioneiro popular:

No mar da liberdade: valeu, boi.

2 comentários:

  1. Nunca li / ouvi imbecilidade tão grande. Como todo o resto do texto.
    Foi aflitivo assistir. O boi não se suicidou.
    "Licença poética" demais para meu gosto, que estava lá. Demagogia mesmo.
    Estou farta de babacas demagogos.
    O animal já havia saído duas vezes do mar. A tal "multidão faminta" que rapidamente surgiu não sei de onde é que gritava tanto, uivava histérica, que assustou mais ainda o boi.
    Os rapazes do Salvamar quase conseguiram pegá-lo.
    Mas foi justamente aqueles que - de verdade - estavam torcendo para retalhar o boi na areia da praia, fizeram o pobre entrar mais ainda em direção a arrebentação, ultrapassá-la, para depois se afogar.
    O boi estava apavorado com os gritos selvagens da tal multidão nada faminta mas assassina por natureza. Morreu aterrorizado tentando se salvar. Essa horda já foi para a praia com facões e peixeiras.

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  2. É a desgraça do ser humano, ou de alguns seres humanos.

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