sábado, 9 de fevereiro de 2019

CUIDA DELES,FLAMENGO

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MARTÍN FERNANDEZ

8 de fevereiro de 2019 não pode ser só o dia mais triste da história do Flamengo. Deveria ser a data da última tragédia do futebol brasileiro
Nada vai trazer de volta o Arthur Vinicius, nem o Áthila, nem o Bernardo, nem o Christian, nem o Vitor, nem o Pablo Henrique, nem o Jorge Eduardo, nem o Samuel, nem o Gedinho e nem o Rykelmo. Mas há muito a ser feito por seus pais, por essa gente que aceitou conviver com a saudade e a distância dos filhos, que confiou ao Clube de Regatas do Flamengo o que tinha de mais precioso. Há muito a ser feito para evitar que esses nomes não sejam esquecidos e para que essa lista nunca aumente.
Há muito a ser feito pelo Jonatha e pelo Cauan e pelo Francisco, que estão no hospital; pelo Weverton, que postou o vídeo dos moleques cantando o hino do Flamengo; pelo Guga e pelo Henrique e pelo Pablo e pelo Ryan e pelo Samuel e por todos os outros que conseguiram escapar daquele maldito contêiner ou deram a sorte de não estar ali.
Este 8 de fevereiro de 2019 não pode ser só o dia mais triste da história de um clube centenário, o mais popular do país. Precisa ser a data da última tragédia do futebol brasileiro.
Nenhuma nação chega perto do Brasil quando se trata de negociações internacionais de jogadores de futebol. A fonte é inesgotável. A fábrica de talentos é imparável, apesar da precariedade em que opera. Quase 500 atletas nascidos no Brasil que já atuavam no exterior trocaram de país no ano passado — e R$ 3,2 bilhões foram movimentados. Pelas regras das transferências internacionais, R$ 160 milhões (5% do total) voltaram para os clubes onde esses jogadores foram formados. Deveria ser dinheiro suficiente para garantir que ninguém morresse queimado num alojamento.
É agoniante constatar que nem o clube mais rico do país consegue cuidar de seus garotos; é exasperante pensar no que acontece onde não há o dinheiro, o interesse e a atenção que o Flamengo consegue atrair. A tragédia do Ninho do Urubu serve ainda para lembrar que o futebol, apesar de suas cifras exageradas e seu falso glamour, é uma parte indissociável do Brasil, esse lugar desatinado onde tanta gente morre soterrada por lama, em que os períodos de luto se sobrepõem.
As primeiras manifestações após tragédias dessa magnitude quase sempre tendem a ser sensatas. O passar do tempo é que se encarrega de embrutecer o ambiente, turvar a visão de quem toma decisões e tirar do foco o que é realmente importante. Já faz mais de dois anos que 71 pessoas morreram a bordo de um avião em que nunca deveriam ter entrado e ainda há disputas judiciais em curso entre a Chapecoense e os familiares das vítimas.
Foi um alívio perceber que a Ferj adotou o bom senso que faltou à Federação Mineira após a tragédia de Brumadinho e adiou a rodada do Campeonato Carioca. Foram bonitas as manifestações de solidariedade dos rivais do Flamengo. Agora falta todo o resto.
Movido por contratações milionárias, o Flamengo começou o ano sob uma obrigação autoimposta de reconquistar protagonismo, ganhar títulos, justificar investimentos. A morte de dez adolescentes em seu Centro de Treinamento exige uma revisão rigorosa de prioridades. O clube tem muitas respostas a dar e muitas obrigações a cumprir. Cuida deles, Flamengo.

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