sábado, 11 de janeiro de 2020

NÃO DÁ MAIS!


Terminei o ano irritado. E começo 2020 ainda mais p... da vida.  O que é péssimo para minha saúde. Os motivos se concentram meramente nas decisões governamentais envolvendo a conservação do patrimônio, sempre levianas, mas prontamente divulgadas por apressados assessores de imprensa. Quantas vezes já se trompeteou a restauração das igrejas e convento de São Francisco de Salvador? É só abrir o Google. São páginas e páginas. Mas nada de concreto. Existe uma evidente falta de vontade política. Só pequenos surtos sem conceito geral.



Agora fomos informados do resultado de nova licitação para a dita obra. Seria interessante termos acesso à proposta. Nos meios profissionais fala-se de escolha baseada no “orçamento mais baixo” o que, se for verdade, seria uma monumental estupidez, um flagrante de incompetência por parte do júri. Se júri houver. Aliás, de modo geral, após acertado o preço bem camarada, serão acrescidos oportunos “aditivos”. Gente! A sociedade evolui e não aceita mais decisões monocráticas.
O conjunto de São Francisco vem se deteriorando desde 1992, quando o pátio do convento serviu de almoxarifado para a restauração do Pelourinho. Em 1999, a Fundação Ricardo Espírito Santo propôs restaurar a azulejaria da Ordem Terceira de São Francisco. Zeila Maria Machado, de longe a mais competente restauradora que temos na Bahia neste campo, alertou os técnicos lusos sobre a errônea escolha de técnica. Não deram importância. O deprimente resultado é hoje visível a quem visita o templo. De nariz empinado, a lusitana presidente Maria-João Bustorff, que seria anos mais tarde, uma medíocre e efêmera ministra da Cultura, nos legou uma obra antropofágica.    



Cansei. Cansei de rezar para que, milagrosamente, o patrimônio da Bahia seja salvo da indiferença e omissões de órgãos que nós pagamos para que a primeira capital do Brasil não seja transformada numa banal Guarujá. 
De irritação em irritação resolvi iniciar um movimento de opinião pública contra a inércia dos órgãos ditos competentes e entrar com ação no Ministério Público. Não podemos mais confiar em governantes que se preocupam somente com pontes, viadutos, monotrilhos e sambódromos.
Restauradores temos, sim. Apesar da profissão não ter sido reconhecida pela ex-presidente Dilma, são os valiosíssimos guardiões do patrimônio nacional, seja ele sob a tutela da UNESCO ou não. Posso até citar o exemplo do convento de Santo Antônio, em Recife, cujos preciosos painéis de azulejos foram salvos pela professora Pérside Omena.  Não conheço hoje nenhuma técnica que consiga preservação de igual qualidade.

Em Salvador teremos, mais uma vez, aquilo que costumo chamar de curativo Band-Aid.                        

Dimitri Ganzelevitch
Jornal A Tarde
11/01/2020

Nenhum comentário:

Postar um comentário