quarta-feira, 6 de julho de 2022

PICASSO E A ARTE NEGRA

 

Pablo Picasso e a Arte Negra

“L´art nègre ? Connais pas ! (Arte Negra? Desconheço!)”

A frase atribuída a Picasso deu o que falar! Como negar a influência da Arte Negra em sua invenção, o Cubismo, já que o artista visitou na primavera de 1907 o museu de etnografia do Trocadero, em Paris, famoso por sua coleção de Arte Tribal? Poucos meses depois, no verão do mesmo ano, Picasso apresentou ao mundo a tela, “Les demoiselles d´Avignon”. A obra se tornou um marco. Rompeu com as tradições da arte ocidental. Foi aclamada pela vanguarda. Chocou a burguesia e promoveu calorosos debates na academia. Foi essa polêmica pintura, baseada nos conceitos da Arte Negra, que traçou os rumos da Arte Moderna, conforme explica o especialista Christian Heymès.

Com a polêmica tela de Picasso, a simplificação das formas e as “deformações” anatômicas na pintura passaram a expressar a atitude que regia o novo espírito do tempo, o de mudança, na passagem dos séculos 19 para o 20. A descoberta da Arte Tribal africana, também chamada de Arte Negra, veio consubstanciar, ou melhor, “apoiar” e estimular uma orientação já manifesta no segmento da pintura ocidental embrionário da modernidade. Muitos jovens artistas europeus daquela época já reconheciam a necessidade de se renovar, se reinventar, se libertar do rígido e sufocante academicismo em que as manifestações da arte ocidental se encontravam estagnadas. Foi graças ao mercantilismo europeu com as colônias africanas que a Europa passou a receber objetos e esculturas produzidos no continente, logo denominados Art Nègre, Arte Negra. É evidente que os artistas de vanguarda foram os primeiros a se sensibilizar com o novo olhar apresentado na estatuária africana: o da desproporção e de uma nova perspectiva.

O que aconteceu a seguir foi um embate do Neoclassicismo X Arte Negra.

Neoclassicismo, a arte acadêmica

Nos novos rumos da arte, o essencial para esse grupo de artistas era negar a harmonia Greco-romana vigente no neoclassicismo e por abaixo os ensinamentos acadêmicos que estagnavam a criatividade e o desenvolvimento da expressão artística individual. É preciso entender que a visão plástica dos gregos e dos africanos era diametralmente oposta. Nas representações humanas, a cultura grega buscava o equilíbrio dos membros do corpo à semelhança de um naturalismo idealizado, belo, perfeito, ao contrário da cultura africana em que expressão do corpo é minimizada em benefício da exaltação da cabeça.

Arte Negra, o conceito revolucionário

Na cultura africana a cabeça é o centro de toda sabedoria humana e possui valor altamente simbólico. É também o lugar do espírito e das divindades. Esse conceito em oposição aos valores da arte ocidental chocou o olhar ocidental por não ser naturalista. A nova estética, em que o desequilíbrio da forma é visto como um valor fundamental, foi considerada uma provocação pela burguesia e suas instituições, em particular, a Igreja, que viram na arte africana o bárbaro, o feio, o grotesco, o menos “artístico”. No meio artístico e entre os intelectuais da vanguarda, a arte africana foi aclamada, passando a reger a nova ordem plástica.

Na virada dos séculos 19 para 20, a influência da estatuária e das máscaras africanas na base da formação dos conceitos da arte moderna confirma a legitimidade do desejo da vanguarda de romper com as tradições da arte ocidental. Afinal, a Europa não é o único titular da evolução artística mundial.

Por Christian Heymès

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TASTE Curiosidades:

– “Les demoiselles d´Avignon” de Pablo Picasso, 1907

O título original da pintura dado por Picasso (1881-1973) era “Le bordel philosophique”, o bordel filosófico. Ele a pintou aos 26 anos. Trata-se de uma alegoria à sexualidade em que a cena se passa em um bordel da rua Avignon, em Barcelona, na Espanha, de sua fase proto-cubista, antes do Cubismo.

Mas o título foi mudado e Picasso nunca aprovou o nome imposto à uma de suas maiores obras, junto com a tela “Guernica”, 1937. Gozador, irônico, irreverente, ele se sempre se referiu a ela como “Le bordel d´Avignon” ou “Las chicas de Avignon”. Foi o crítico André Salmon que a rebatizou com o nome menos escandaloso para os padrões da época. “Les demoiselles d´Avignon” é considerada por muitos críticos a obra mais influente nos rumos da arte dos últimos cem anos. A tela pertence ao acervo do MoMA (Museum of Modern Art, Nova York).

Vídeo do MoMA (Museum of Modern Art, de Nova York) com explicações interessantes do expert Joachim Pissarro sobre a famosa e revolucionária tela de Picasso:

– Musée de l’Homme, Paris

Musée Ethnografique du Trocadero foi aberto em Paris, em 1878. Com as teorias sobre a evolução do inglês Charles Darwin (1809-1882), essa instituição se encontrava no centro dos debates da época. Foi em suas galerias que Picasso foi seduzido e pesquisou a Arte Negra. Por ocasião da grande feira internacional, “Exposition Internationale des Arts et Techniques dans la Vie Moderne”, em 1937, em Paris, o diretor do museu, o historiador Paul Rivet, converteu-o no Musée de l’Homme, no Palais de Chaillot, o maior acervo antropológico do mundo. Em seu acervo está a famosa estatueta do Paleolítico, “Vênus de Lespugue”, cerca 25 mil anos, de 15 cm de altura, em marfim, que representa uma figura feminina, a mais antiga descoberta em solo europeu, no sul da França, nos anos 1920.

O museu faz parte de um dos sete departamentos do Museu Nacional de História Nacional. Desde 2009, o Musée de l’Homme está fechado, passando por uma reforma de 52 milhões de euros. Na reinauguração prevista para 2014, ele se transformará na mais moderna plataforma sobre a Evolução do Homem.

Vale a pena entrar no site do museu. É interessante, incomum e explicativo:

www.museedelhomme.fr

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