A história e a controvérsia da demolição do Palácio Monroe, ícone arquitetônico do Rio de Janeiro
O icônico edifício foi derrubado em 1976, sob polêmicas e interesses
políticos, após campanhas e decisões do governo militar
-Em uma manhã de 5 de janeiro de 1976, quinze operários da Aghil Comércio de Ferro Ltda chegaram ao centro do Rio de Janeiro para iniciar a demolição do Palácio Monroe, uma das construções mais emblemáticas da cidade. A empresa, sob a propriedade de Antônio Gonçalves da Silva, havia vencido a licitação para desmontar o edifício. Munidos de marretas e britadeiras, os trabalhadores aguardaram a licença oficial da prefeitura, mas começaram a remover objetos de valor, como vitrais e estátuas, entre elas os icônicos leões de mármore esculpidos pelo artista italiano Vaccari Sonino. Hoje, dois desses leões adornam a entrada da Fazenda São Geraldo, em Uberaba, Minas Gerais, enquanto os outros dois estão expostos no Instituto Ricardo Brennand em Recife. As informações são da BBC/Brasil.
Raízes históricas e
simbolismo do Monroe
O Palácio Monroe teve sua
história iniciada em 1903, quando o engenheiro Francisco Marcellino de Souza
Aguiar recebeu do presidente Rodrigues Alves a missão de projetar um pavilhão que representasse o
Brasil na Exposição Universal de Saint
Louis de 1904. Concluído em sete meses, o pavilhão
recebeu elogios da imprensa americana e conquistou a medalha de ouro em
arquitetura na exposição. Após o evento, foi reconstruído na então Avenida
Central (atual Avenida Rio Branco) e inaugurado em 1906, como um símbolo da
modernização do Brasil.
Renomeado em homenagem ao presidente americano James
Monroe por sugestão do diplomata Joaquim
Nabuco, o Palácio foi a sede de grandes eventos, como a 3ª
Conferência Pan-Americana. Em sua longa trajetória, abrigou o Senado
Federal e foi palco de avanços como a aprovação do voto
feminino e as primeiras
Controvérsia e o destino do Monroe
Na década de 1960, o Palácio Monroe começou a sofrer ataques da
imprensa brasileira. Enquanto o jornal O Globo o chamou
de “monstrengo” em 1961, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (IPHAN) argumentou a favor da demolição, alegando que a edificação
“perdeu significação” e “enfeiava o Rio”. A pressão culminou na ordem de
demolição em 1975, pelo então presidente Ernesto Geisel. Um
documento enviado por Golbery do Couto e Silva,
chefe da Casa Civil, comunicou ao ministro da Fazenda, Mário
Henrique Simonsen, a decisão de Geisel, que foi celebrada por O
Globo. “Por decisão do Presidente da
República, o Patrimônio da União já está autorizado a providenciar a demolição
do Palácio Monroe,” noticiou o jornal em tom de comemoração.
Conflitos entre preservação e modernidade
A demolição do Monroe
dividiu opiniões. De um llado, Lúcio Costa, um dos arquitetos modernistas mais respeitados do Brasil,
apoiou a decisão, declarando que a demolição beneficiaria o “desafogo urbano”.
Do outro, o Clube de Engenharia, apoiado por personalidades como Roberto Burle Marx, lançou o Manifesto pela Preservação do Palácio Monroe, com adesão de 162 arquitetos e urbanistas. O engenheiro Durval Lobo, que liderou o movimento, enfatizou que o edifício não
apresentava problemas estruturais e que sua destruição não beneficiaria o
tráfego local. “Nos anos 1970, o Brasil
vivia os horrores do golpe de 1964. O manifesto, mesmo sem conseguir manter o
prédio de pé, foi um ato de coragem,” destaca o historiador Daniel Levy de Alvarenga.
Hipóteses e motivações para a demolição
A pergunta “Quem demoliu o Monroe?” tem gerado discussões por
décadas. Algumas teorias sugerem que a decisão foi motivada por ressentimento
pessoal do presidente Geisel, que teria sido preterido para um cargo de
confiança durante o governo de Juscelino Kubitschek.
Entretanto, Alvarenga considera essa hipótese improvável. “A
versão mais aceita atribui a demolição à percepção de que o estilo eclético do
palácio e as transformações feitas no projeto original justificavam sua
destruição,” afirma.
Outra
teoria, a de que o Monroe teria sido derrubado para dar lugar à estação de
metrô da Cinelândia, é contestada pelo cineasta Ades. Eduardo Ades. “O
metrô não foi a causa da demolição do Monroe. Sua rota desvia do palácio,” revela
Ades, diretor do documentário Crônica da Demolição.
Um símbolo perdido e a
visão de um futuro alternativo
A trajetória do Monroe representa as transformações culturais e
políticas do Brasil, desde sua construção como símbolo da nova república até a
sua demolição sob a égide do regime militar. Para muitos, sua destruição é
vista como um símbolo de perda de memória e de valor histórico, uma lembrança
de que a preservação cultural nem sempre foi priorizada no país.
Enquanto
permanece a discussão sobre o futuro que o Monroe poderia ter tido, sua
ausência é sentida tanto por historiadores quanto pela população, que perdeu
não só um edifício monumental, mas também um ponto de encontro e um espaço de
representação política e cultural. O Palácio Monroe, para seus defensores, foi
mais que uma construção; foi uma peça fundamental na identidade histórica e
cultural do Rio de Janeiro e do Brasil.
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