segunda-feira, 3 de abril de 2017

RELACIONAMENTO ABUSIVO

Flávia Azevedo: 'eu sou sobrevivente de um relacionamento abusivo', ela diz

Resultado de imagem para FOTOS DA LEI MARIA DA PENHA

“Eu sou sobrevivente de um relacionamento abusivo”, ela disse, num post, comemorando vida nova. Agora é a liberdade desaforada de quem venceu o algoz. Acabou! Era obrigada a dizer? Não, mas é bom que diga. É bom que não segure para sempre o pacote de merda entregue pelo homem com quem pensou viver um amor. A vergonha é dele e é assim que deve ser.
Eles não gostam disso e perguntam “pra que se expor”? Uma inversão proposital porque a pergunta dele é: “pra que me expor”? Não, você não se expõe quando entrega o seu agressor. É ele quem está exposto, é ele quem deve se envergonhar. Mesmo que a sua família não entenda, mesmo que amigos não entendam, mesmo que algumas amigas achem que seria melhor ficar calada.
É um trabalho longo esse de colocar cada coisa em seu devido lugar: vítimas denunciam, abusadores são punidos. Ainda que, por enquanto, apenas pela exposição. Cada mulher que perde a vergonha de dizer, é uma pedra a menos do castelo de silêncio onde vivem protegidos abusadores disfarçados de namorados e maridos amáveis. Eles sabem que estão por um fio.
A minha amiga assinou, junto com o divórcio, um documento em que se compromete a não publicar nada que possa ferir a imagem do ex. Ele morria de medo e achou um jeito de se “proteger”. Pois, se eu casar de novo, quero que ele assine documento estando ciente de que, se passar do ponto, perde a privacidade. Que estou liberada para publicar conversas íntimas, e-mails, bilhetes, o que for. Até o que, em condições normais, não seria legal.
Porque é assim que a gente se protege, é assim que mulheres reconhecem que, dentro daquela casa lá do outro lado do mundo, aconteceu o mesmo que acontece agora na casa dela e isso fortalece, dá coragem pra sair. É também assim que a gente se ajuda: dizendo que sobreviveu. É bom, é terapêutico, é libertador. Pode dizer, deve dizer. Em cima do lance ou anos depois.
Tem gente precisando ouvir o tempo todo. Tem menina começando a viver e ela precisa saber que namorado não decide a roupa que ela deve usar, a cor do batom nem aonde ela pode ir. Que ela não é obrigada a transar nem a deixar de transar. Que ele não pode levantar a voz, ”proibir” amizades. Que, se ele não gostar do jeito dela, pode apenas ir embora. Que ela é dela mesma e de mais ninguém.
Só mulheres podem ajudar nisso. Só eu. Só a moça que publicou no Facebook. Só a senhorinha que conta pra todo mundo que começou a cantar depois dos 60 anos porque viveu anos com um abusador que a queria em silêncio. Só nós todas juntas.
“Eu sou sobrevivente de um relacionamento abusivo”, ela diz, mas é mais do que dizer. É anunciar que ninguém tente outra vez, é medalha no peito, é orgulho, condecoração, é subir no palco e a multidão aplaudindo. A gente não quer viver morrendo e, se ainda vive, é por causa desse silêncio que é quebrado cada vez que uma mulher diz “eu sou sobrevivente de um relacionamento abusivo”. Obrigada, moça, por dizer.
Flavia Azevedo é produtora e mãe de Leo

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