domingo, 2 de junho de 2019

CONCHA BUIKA


Buika. Concha Buika. Um nome e uma artista que deve ser conhecida pelo povo brasileiro. Principalmente pelo povo baiano. Seus pais “saíram” da Guiné Equatorial e foram viver para uma das ilhas espanholas. Buika nasceu em Palma de Maiorca, em 1972. Seu pai teve vários filhos, de sua mãe e de outras mulheres. Quando ela tinha 9 anos, seu pai deixou sua mãe e irmãos. Esta menina a quem a família, por desconhecimento, só criticava, cresceu num meio pobre, aprendeu a cantar flamengo, no convívio com ciganos. Alguém uma vez lhe disse que tinha uma voz de cachorro – “de perro”. As pessoas com quem convivia incluindo a família falavam que não prestava, que não era ninguém, que só fazia coisas erradas. Algo que ela sabe que não foi com má intenção. Eles não sabiam o efeito que essas palavras negativas poderiam ter na cabeça de uma pessoa.
Buika diz que um dia percebeu que o que interessa é o que o povo acha dela e não o que as pessoas dizem. E quando cantou pela primeira vez para 500 pessoas e elas se levantaram para a aplaudir, teve a confirmação de que o que amava – cantar – sabia fazer bem. Conviveu com pessoas que cantavam, sua mãe lhe passou um gosto musical diversificado e rico. Sua música mistura flamenco - flamengo, copla – música de Andaluzia, jazz, rumba, soul.


Chegou a passar um tempo em Las Vegas e voltou para Espanha. Quando lhe perguntam por que voltou, diz que percebeu que nesse mundo de fama, as estrelas não tinham luz, não eram iluminadas. Hoje em dia vive em Miami porque as distâncias para viajar para todos os continentes é razoável.
Aconselho a ouvirem as suas entrevistas. Fala muitas coisas importantes. Deixo aqui algumas. Fala da importância das palavras e do quanto as palavras podem magoar e danificar o interior de uma criança. Fala que tem a função de soldado do mundo. Tem um filho biológico mas são 4 os filhos que cuidou desde nova. Não fala mas imaginamos que seja o filho mais 3 irmãos. O pai teve pelo menos 10 filhos, de várias mulheres. Fala de racismo, do lugar da mulher no mundo. Conheceu e conviveu com pessoas como Chavella Vargas. Canta com a mesma intensidade. Diz que um bom cantor não é o que sabe cantar bem mas o que se entrega totalmente na hora de cantar. E vê-la a cantar é um bom exemplo disso.
Salvador, quando podemos ter a honra de assistir a BUIKA, considerada uma das melhores cantoras da atualidade?
O Bug Latino teve essa honra, no Coliseu do Porto. Agradecemos a cortesia dos bilhetes, o profissionalismo e o carinho a UGURU Music. Muito gratas.
Ana Santos, professora, jornalista
O Brasil não conhece Buika, mas tem muito a compartilhar com ela, aprender com ela. A música com traços gitanos, absolutamente espanhola, de raíz, numa voz diferente – talvez, se é que se pode falar assim de uma voz – corajosa. Com a voz, Buika enfrentou injustiça social, preconceito (uma cigana negra chama muito a atenção), longas jornadas de trabalho, longas ausências de casa e também a não presença permanente dentro do quadro social em que a mulher/mãe é induzida a ocupar.
Buika simplesmente foi à frente, combateu suas batalhas e cantou, cantou e cantou...
É uma pena que o Brasil não a conheça ou pelo menos não a conheça como poderia. Uma pena que ela ainda não tenha sido convidada a fazer parte das ruas do Pelô, a dançar e misturar nossos ritmos, nossos sangues e nossas coragens. Sim, porque também faz parte dos baianos a ação de resistir cantando. Como Buika faz.
Um ritmo forte, uma voz forte, numa mulher forte. Experimentem Buika, no YouTube. Convidem Buika pra ocupar Salvador, soltar a voz por aqui. E percebam que a coragem de combater é e sempre será uma ação política porque somos seres políticos. Essa esquisitice “escolha seu lado” é pra quem ainda não se viu mudando o mundo com a voz. Buika já se viu.

ANA RIBEIRO
Diretora de teatro, cinema e TV

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