domingo, 27 de outubro de 2024

O ESCÂNDALO DO PALÁCIO MONROE

 A história e a controvérsia da demolição do Palácio Monroe, ícone arquitetônico do Rio de Janeiro

O icônico edifício foi derrubado em 1976, sob polêmicas e interesses políticos, após campanhas e decisões do governo militar

Por Quintino Gomes Freire

 -Em uma manhã de 5 de janeiro de 1976, quinze operários da Aghil Comércio de Ferro Ltda chegaram ao centro do Rio de Janeiro para iniciar a demolição do Palácio Monroe, uma das construções mais emblemáticas da cidade. A empresa, sob a propriedade de Antônio Gonçalves da Silva, havia vencido a licitação para desmontar o edifício. Munidos de marretas e britadeiras, os trabalhadores aguardaram a licença oficial da prefeitura, mas começaram a remover objetos de valor, como vitrais e estátuas, entre elas os icônicos leões de mármore esculpidos pelo artista italiano Vaccari Sonino. Hoje, dois desses leões adornam a entrada da Fazenda São Geraldo, em Uberaba, Minas Gerais, enquanto os outros dois estão expostos no Instituto Ricardo Brennand em Recife. As informações são da BBC/Brasil.

 


Raízes históricas e simbolismo do Monroe

O Palácio Monroe teve sua história iniciada em 1903, quando o engenheiro Francisco Marcellino de Souza Aguiar recebeu do presidente Rodrigues Alves a missão de projetar um pavilhão que representasse o Brasil na Exposição Universal de Saint Louis de 1904. Concluído em sete meses, o pavilhão recebeu elogios da imprensa americana e conquistou a medalha de ouro em arquitetura na exposição. Após o evento, foi reconstruído na então Avenida Central (atual Avenida Rio Branco) e inaugurado em 1906, como um símbolo da modernização do Brasil.

Renomeado em homenagem ao presidente americano James Monroe por sugestão do diplomata Joaquim Nabuco, o Palácio foi a sede de grandes eventos, como a 3ª Conferência Pan-Americana. Em sua longa trajetória, abrigou o Senado Federal e foi palco de avanços como a aprovação do voto feminino e as primeiras

Controvérsia e o destino do Monroe 


Na década de 1960, o Palácio Monroe começou a sofrer ataques da imprensa brasileira. Enquanto o jornal O Globo o chamou de “monstrengo” em 1961, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) argumentou a favor da demolição, alegando que a edificação “perdeu significação” e “enfeiava o Rio”. A pressão culminou na ordem de demolição em 1975, pelo então presidente Ernesto Geisel. Um documento enviado por Golbery do Couto e Silva, chefe da Casa Civil, comunicou ao ministro da Fazenda, Mário Henrique Simonsen, a decisão de Geisel, que foi celebrada por O Globo“Por decisão do Presidente da República, o Patrimônio da União já está autorizado a providenciar a demolição do Palácio Monroe,” noticiou o jornal em tom de comemoração.

Conflitos entre preservação e modernidade

A demolição do Monroe dividiu opiniões. De um llado, Lúcio Costa, um dos arquitetos modernistas mais respeitados do Brasil, apoiou a decisão, declarando que a demolição beneficiaria o “desafogo urbano”. Do outro, o Clube de Engenharia, apoiado por personalidades como Roberto Burle Marx, lançou o Manifesto pela Preservação do Palácio Monroe, com adesão de 162 arquitetos e urbanistas. O engenheiro Durval Lobo, que liderou o movimento, enfatizou que o edifício não apresentava problemas estruturais e que sua destruição não beneficiaria o tráfego local. “Nos anos 1970, o Brasil vivia os horrores do golpe de 1964. O manifesto, mesmo sem conseguir manter o prédio de pé, foi um ato de coragem,” destaca o historiador Daniel Levy de Alvarenga.

 

Hipóteses e motivações para a demolição

 

 


A pergunta “Quem demoliu o Monroe?” tem gerado discussões por décadas. Algumas teorias sugerem que a decisão foi motivada por ressentimento pessoal do presidente Geisel, que teria sido preterido para um cargo de confiança durante o governo de Juscelino Kubitschek. Entretanto, Alvarenga considera essa hipótese improvável. “A versão mais aceita atribui a demolição à percepção de que o estilo eclético do palácio e as transformações feitas no projeto original justificavam sua destruição,” afirma.

Outra teoria, a de que o Monroe teria sido derrubado para dar lugar à estação de metrô da Cinelândia, é contestada pelo cineasta Ades Eduardo Ades“O metrô não foi a causa da demolição do Monroe. Sua rota desvia do palácio,” revela Ades, diretor do documentário Crônica da Demolição.

Um símbolo perdido e a visão de um futuro alternativo



A trajetória do Monroe representa as transformações culturais e políticas do Brasil, desde sua construção como símbolo da nova república até a sua demolição sob a égide do regime militar. Para muitos, sua destruição é vista como um símbolo de perda de memória e de valor histórico, uma lembrança de que a preservação cultural nem sempre foi priorizada no país.

Enquanto permanece a discussão sobre o futuro que o Monroe poderia ter tido, sua ausência é sentida tanto por historiadores quanto pela população, que perdeu não só um edifício monumental, mas também um ponto de encontro e um espaço de representação política e cultural. O Palácio Monroe, para seus defensores, foi mais que uma construção; foi uma peça fundamental na identidade histórica e cultural do Rio de Janeiro e do Brasil.

 

 

 

 

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