quarta-feira, 30 de abril de 2025

A TRAGÉDIA DO ABANDONO

 Escola de Teatro da UFBA- a tragédia do abandono

O problema da nossa Escola é que não somos prioridade porque educação e cultura parecem não ser prioridade.




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  • Gil Vicente Tavares

Publi.cado em 25 de abril de 2025 É atribuída uma frase a Nelson de Araújo, falecido professor, dramaturgo e pesquisador, figura importante da Escola de Teatro da UFBA (ETUFBA), que dizia algo como: o problema da nossa Escola é que ela não sai do Canela.

Conheci a frase já com uma análise subsequente, criticando um problema que acomete diversos setores da província. A falta de diálogo com a criação e o pensamento ao redor da cidade, do Estado, do país e mesmo do mundo, bem como um excesso de autorreferencialidade vesga são também problemas recorrentes que sim, aqui e ali, poderiam historicamente serem relacionados à instituição à qual pertenço, desde 2015 como professor efetivo, e desde 1995 como aluno.

Mas me parece claro que a crítica do saudoso professor é mais uma provocação do que uma constatação absoluta. Pelo contrário, desde sua fundação, em 1956, até hoje, podemos ver a ETUFBA como centro nevrálgico da criação artística da cidade, do Estado, do país e mesmo do mundo.

Alguns dos nomes mais expressivos do teatro, do cinema e até da música passaram pela nossa Escola e a projetaram e se projetaram nacionalmente e até internacionalmente. A Cia de Teatro da UFBA sempre marcou presença expressiva nas premiações locais, marcou história no Festival Universitário de Teatro de Blumenau, e concorreu, recentemente, com 90 espetáculos do Brasil inteiro, sendo finalista do Prêmio Shell de Teatro na categoria destaque nacional.

A produção de estudantes vem se destacando na cena local, através de temporadas, carreira profissional e premiações, também, reforçando a expressividade e contundência da nossa criação acadêmica que, além de tudo, vem sendo referência na pós-graduação em artes cênicas do país. Temos nota máxima na CAPES e relevante produção nas áreas de pesquisa, extensão e publicação, além de teses premiadas nacionalmente. Pois é, a ETUFBA é referência em diversos segmentos artísticos e acadêmicos, é uma unidade de produtividade e relevância incontestáveis.

Incontestáveis?

Acabou de sair aqui no Correio uma reportagem sobre 9 obras abandonadas da UFBA. São casos dos mais absurdos e revoltantes. Curiosamente, e tristemente, não consta uma décima obra abandonada.

Nosso tão necessário anexo da ETUFBA, com salas de aula e laboratórios de pesquisa e criação, salas de professores, uma sala preta multiuso para apresentações da produção discente e docente, dentre outros, segue como ruína, no Canela, ao lado do histórico casarão em que a escola foi fundada, onde encontra-se nosso Teatro Martim Gonçalves. Claro que há um problema da iniciativa privada, pois a obra foi interrompida por falência da empresa que ganhou a licitação. Mas e aí? Isso faz anos, muitos anos, e nada foi feito desde então.

Ficar de fora da lista da reportagem, que me foi alertada por uma colega de departamento, talvez traduza uma contradição que vem prejudicando o bom funcionamento da instituição há décadas. Estamos fora da lista dos recursos para o término da obra, entra ano e sai ano. Entra ano e sai ano e novas promessas de que seremos prioridade no próximo orçamento surgem. Nossa situação parece aquela da criança que sempre pede algo no mercado e a mãe ou o pai diz: na volta a gente compra.

A frase de Nelson de Araújo ganhou uma versão nova: o problema da nossa Escola é que ela não volta para o Canela.

Estamos há anos em condições precárias pulando de pavilhão em pavilhão, em salas inadequadas, com um espaço improvisado para apresentações, também precário; e isso quando temos sala para nossas aulas, e quando conseguimos conciliar demandas e ofertas para apresentações e ensaios.

Não temos uma cantina. O que parece bobo, não é. Dispersos, não nos encontramos para as conversas do dia-a-dia, e projetos, resoluções, ideias e problemas acabam reprimidos, represados, ocupando espaços de reuniões e gerando uma tensão interna desnecessária.

Eu e colegas por vezes nem conhecemos estudantes que passam pela ETUFBA, a dispersão e desestímulo impactam diretamente, e gerações e gerações seguem se graduando em condições precárias, o que claramente prejudica suas formações e compromete nossas condições de trabalho.

Não faz muito tempo, reitores se posicionaram sobre o orçamento insuficiente destinado a suas universidades. Entra greve, sai greve, e enquanto judiciário, legislativo e executivo, que já ganham muito bem, seguem aumentando seus salários, temos que acatar propostas e reajustes fora da realidade e distantes das reais necessidades do ensino superior público. Vivemos, hoje em dia, entre a cruz e a espada. De um lado, a direita, que foi empurrada à extrema direita e segue confortável, não só se lixando para nosso problema mais grave, a desigualdade social, como sempre tentando destruir com nossas instituições públicas que ainda tentam, aos trancos e barrancos, diminuir as injustiças de um país tão desigual. E cuja raiz está numa concentração de renda e num sequestro privado da verba pública que faz com que políticos sigam usando o erário em benefício próprio, para seus interesses e das classes dominantes que se julgam donas do país.

Mas do outro lado temos a dita esquerda. A cada nova eleição, setores como os da cultura e da educação seguem renovando seus votos de que governos mais à esquerda irão dar maior atenção a essas áreas, e as decepções se renovam seguidamente.

Imprensada entre a educação e a cultura, a ETUFBA segue sem poder executar seu projeto pedagógico em condições satisfatórias, e sem uma perspectiva profissional para seus egressos, frente ao desastre das políticas públicas para as artes.

O problema da nossa Escola é que não somos prioridade porque educação e cultura parecem não ser prioridade. Uma instituição com quase 70 anos de contribuição relevante e significativa para a educação e a cultura do país, parece não ter relevância e nem significância suficientes para que tenhamos condições decentes de seguir produzindo ensino, extensão e pesquisa de qualidade.

Cansa. Entristece. Decepciona. Vemos isso na cara do corpo docente e discente. Vemos isso refletido nos escombros de um futuro em ruínas. Nelson Rodrigues dizia que o teatro era o cadáver mais saudável que ele conhecia. Nós não vamos parar, como nossa construção, que se deteriora mais a cada ano. Seguiremos com brilho nos olhos, apesar das trevas.

Mas não podemos nos calar, também.

Atualmente, o maior problema da nossa Escola é que ela não volta para o Canela.

E, de promessa em promessa, seguimos sorrindo para nossa sociedade com a máscara da comédia, enquanto por baixo nossos rostos seguem remoendo nossa tragédia sem fim.

 











CONVITE


 

No dia 6 de maio de 2025, próxima terça-feira, às 19h, a unidade Barra da Aliança Francesa de Salvador acolhe a Exposição: “Emma Valle na coleção de Dimitri Ganzelevitch” (06/05), com a curadoria do próprio colecionador Dimitri Ganzelevitch


Sobre Emma Valle|

A artista soteropolitana Emma Valle construiu seu trabalho fora dos meios tradicionais da arte e através de imagens e pinturas que transformam a vida cotidiana em uma narrativa de proporções lúdicas e grandiosas. Sendo para Dimitri, sem contestação possível, a maior expoente baiana daquilo que Nise da Silveira chamou de Arte do inconsciente, e no mercado de arte, Arte fora das normas ou Outsiders.


Serviço |

O que: Exposição “Emma Valle na coleção de Dimitri Ganzelevitch”, curadoria do próprio colecionador

Abertura: 6 de maio de 2025 (terça-feira) às 19h

Período: 6 de maio a 1 de junho de 2025

Onde: Galeria da Aliança Francesa Salvador – Bahia (Av. Sete de Setembro, 401 / 2726 – Ladeira da Barra)

Horário de visitação: Segunda a sábado das 9h às 20h e aos domingos das 12h às 19h

Entrada: Gratuita

terça-feira, 29 de abril de 2025

UMA JUDIA

 

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A atriz Natalie Portman rejeita o Prêmio Gênesis de Israel, dotado de um milhão de dólares, pelo massacre de palestinos desarmados. A organização do Prêmio anunciou que cancelaria sua cerimônia de entrega planejada para junho por esse motivo. Em resposta à recusa, desde o Knesset (congresso israelense) pedem a revogação da cidadania (nasceu em Israel e saiu quando criança).
"Não assisto ao Prêmio Gênesis porque não quero aparecer como apoio a Benjamin Netanyahu. Israel foi criado há 70 anos como refúgio para as vítimas do Holocausto, mas os maus tratos contra aqueles que sofrem as atrocidades de hoje não casa com meus valores judeus... ".
Aplaudimos a sua decisão Natalie!