Sérgio Cabral e a farsa que destruiu o Maracanã: nunca houve a exigência da Fifa usada como justificativa
Com a cara mais lavada do mundo, o ex-governador Sérgio Cabral virou-se para o juiz Marcelo Bretas e afirmou desafiadoramente:
“Nunca houve propina. Nunca houve 5%. Que 5% é esse? Que história é essa de que esses 5% era algo que vigia no governo? Que maluquice é essa?
Foi no dia 10 de julho de 2017, na audiência da Operação Mascate.
Nem o maior ator de todos os tempos seria capaz de tamanha eloquência, veemência e capacidade de expressão impassível ao expressar algo que sabe ser uma imensa farsa com tamanha desfaçatez. Algo muito próximo a uma psicopatia, uma mitomania.
Pois foi assim, com essa mesma ausência de emoções e verdade, somadas a cumplicidade da imensa maioria de uma quase totalidade do conjunto amorfo e cúmplice da imprensa, que durante anos Cabral repetiu a mais cara mentira da história do Rio de Janeiro, a que custou a destruição de tão caro e querido monumento do carioca e do mundo.
Foram esses mesmos 5% que o ser capaz da psicopatia de mentir diante de milhões sem mudar a expressão cobrou para que o Maracanã fosse destruído.
Cinco por cento e um anel. Numa história tão surreal que nem na ficção passaria. Um monumento mundial foi destruído por 5% de propina, suborno e um anel. O anel que um empreiteiro deu para a primeira-dama para entrar no butim do saque do Maracanã.
E durante anos, sem maiores questionamentos e com a mesma expressão da audiência já nos anais, Cabral repatia: “É exigência da Fifa”.
Como se, mesmo que fosse, se tornasse razoável destruir o patrimônio de um povo para atender a outros ladravazes tal e qual o ex-governador.
Mas não era.
Nunca foi exigência da Fifa. Como não tinha sido em uma Alemanha que não se curvou em 2006 e não destruiu seu estádio de Berlim para atender caprichos. Como não seria em qualquer lugar onde o império da lei funcionasse. Ou onde existisse uma imprensa no mínimo digna. E não a indecência que, salvo as exceções de sempre, foi se tornando quem deveria ser fiscalizadora.
Há um achado na internet no endereço abaixo:
https://arcoweb.com.br/projetodesign/entrevista/carlos-de-la-corte-o-arquiteto-18-12-2009
Um achado que dá bem a dimensão da farsa que embasou a destruição do Maracanã.
Carlos de La Corte é arquiteto. Foi contratado pela Fifa para ser consultor técnico para acompanhamento das obras dos estádios da Copa no Brasil.
E muito antes das máquinas começarem a destruir o Maracanã, deu uma entrevista ao site especializado Projeto Design falando sobre as exigências da Fifa. Ou o que não era exigência. Mostrando a farsa de Cabral. Que para justificar obras e amealhar os 5%, repetia seguidamente: “É exigência da Fifa”. Não era.
Questionado sobre eventuais exigências, o consultor técnico da Fifa deixa bem claro que não existiam dessa forma. Nem os bandidos da Fifa foram tão longe em exigir que o Maracanã fosse destruído. Mas Cabral foi. E contou uma mentira para todo mundo que justificou a destruição do Maracanã. Está lá na entrevista:
Pergunta: “Ainda falando do legado, em que aspectos podemos observar a preocupação da Fifa”?
Resposta: “Em algumas flexibilizações, por exemplo, de elementos como camarotes, área vip e setor de imprensa. A Fifa não engessa o caderno de encargos nem afirma “tem de ser assim”. Existem recomendações e algumas restrições, mas trabalhamos com flexibilidade, com argumentação e contra-argumentação no diálogo com os arquitetos e a entidade.
Há uma preocupação com a viabilidade financeira. Por exemplo: às vezes, o número de camarotes que a Fifa solicita não é o mesmo que a cidade propõe, e isso é discutível. Se, do ponto de vista financeiro, se justificar uma quantidade menor de camarotes, a cidade pode pleitear”.
Há uma preocupação com a viabilidade financeira. Por exemplo: às vezes, o número de camarotes que a Fifa solicita não é o mesmo que a cidade propõe, e isso é discutível. Se, do ponto de vista financeiro, se justificar uma quantidade menor de camarotes, a cidade pode pleitear”.
Não bastasse a farsa de inventar que era “exigência da Fifa” pelo presidiário, não precisaria grande exercício de raciocínio: ainda que fosse exigência, será que se tivéssemos um homem honesto e honrado no poder e não um cleptomaníaco, e esse mesmo batesse o pé e fincasse questão de que não iria mudar o Maracanã, será que a Fifa ousaria fazer uma Copa no Brasil sem o Maracanã? É claro que não. Mas Cabral ansiava por 5% e pelo anel. E assim destruiu o Maracanã.
A entrevista de Carlos de La Corte segue. E outra farsa é desmascarada. A cobertura do Maracanã, o círculo mais lindo e perfeito jamais ousado, o traço de compasso que Niemeyer invejou e, em um óbvio exercício de modéstia à altura do gênio que foi, afirmou que não seria capaz de fazer, e que aquilo, solto no espaço, sem sustentação aparente, era de beleza única, pois sim, Cabral e sua quadrilha forjaram fatos para que fosse destruída. Não havia exigência sequer de cobertura:
Pergunta: “A cobertura é sempre um dos itens mais caros nos projetos. Ela é necessária num país tropical”?
Reposta: “A cobertura é uma recomendação, mas não uma exigência. A não ser nas áreas de imprensa, hospitalidade, vip e very vip. A análise em relação à cobertura é semelhante àquela que é feita para o setor destinado à imprensa: afinal de contas, qual será o destino dado ao estádio depois da Copa? Ele poderá cobrar um ingresso mais caro ou não”?
Se a resposta mostra que nem a cobertura era uma exigência, uma visita ao processo de como se deu a destruição piora as coisas.
O processo pelo qual foi destruída a cobertura que pairava acima do mundo é uma farsa de dar engulho. De dar nojo, em bom português.
Que não me falem mais em loucura ao propor e dizer que a única coisa civilizada a se fazer é destruir esse monumento à pilhagem. Dar cabo efetivo e finalmente a um crime continuado. Loucura é sermos cúmplices diários do delírio de um bandido, que, num domingo qualquer desses, estará livre em uma canetada do Boca Mole.
Em 21/5/2013, em parceria com a repórter Gabriela Moreira, realizamos o “Dossiê Maracanã”, que investigava parte da farsa, mostrava as entranhas de como se construiu parte dessa farsa. A outra parece demonstrada na entrevista do consultor da Fifa acima reproduzida.
Através da Lei de Acesso à Informação, a reportagem ganhou o direito de ver os documentos da obra do Maracanã. Milhares de documentos examinados in loco, na sede do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), no centro do Rio, encontramos a Ata da 68ª Reunião do Conselho Consultivo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional(IPHAN), realizada em 30 de agosto de 2011. Alguns dos maiores engenheiros, arquitetos e urbanistas do Brasil e do mundo se reuniram para debater a destruição então em curso. E as falas são devastadoras. Além disso, constatou-se que o superintendente do IPHAN que assinou a autorização era funcionário do governo Sérgio Cabral. No entender do conselheiro Ulpiano Bezerra de Menzes, sobre a atuação do superintendente Carlos Fernando de Souza Leão Andrade, “escandalosamente inaceitável”:
E o conselheiro Nestor Goulart Reis falou sobre a obra do Maracanã: “Não conheço obra de demolição em edifício tombado; nunca vi. Só conheço obra de restauração e conservação, aqui e no mundo inteiro. Destruir obras tombadas é crime e todos aqueles que participam disso são responsáveis criminalmente. Pode haver processo, pode não haver processo; mas é crime.
Farsa comprovada, construído em cima de um mar de mentiras e propinas, o novo Maracanã nada mais é do que a expressão de um crime continuado. Enquanto estiver ali, será apenas isso: o símbolo de um crime continuado. O símbolo de uma era, de um estado governado por um cleptomaníaco psicopata, capaz de não demonstrar expressão qualquer ao mentir. Nunca será um estádio. E a cidade e o estado que abrigam um monumento a um crime, nunca poderão ter sua história passada a limpo. Um monumento à barbárie. A ausência do estado de direito.
Que não me falem mais em loucura ao propor e dizer que a única coisa civilizada a se fazer é destruir esse monumento à pilhagem. Dar cabo efetivo e finalmente a um crime continuado. Loucura é sermos cúmplices diários do delírio de um bandido, que, num domingo qualquer desses, estará livre em uma canetada do Boca Mole.
Sem custo de dinheiro público, antes que os profetas do óbvio falem em “mais gasto público”. Ora, quem pagou anel e 5% para destruir, deve ser responsabilizado e pagar pela reconstrução do Maracanã de todos.
Uma farsa destruiu o maior e melhor estádio do mundo. Pedaço melhor de uma cidade que, apesar de todos esses escroques, apesar de uma imprensa subserviente que aplaudiu a destruição do Maracanã, que faz editorial para apontar vândalos que invadem o estádio do qual foram expulsos mas não fez para apontar o vandalismo da destruição do estádio, enfim, de uma cidade que, apesar de tudo, segue e seguirá maravilhosa.
E que só será assim em plenitude com o fim de um crime continuado. Se o Cristo é o monumento maior, o Maracanã de todos era o monumento mais querido. De todos. E que assim volte a ser através dos tempos.
Louco é quem é cúmplice de um crime continuado. De uma farsa.
Observação 1:
Observação:
Carlos de La Corte trabalhou no Comitê Organizador Local (COL) da Copa do Mundo de 2014 e teve a atuação questionada pelo MPF em virtude de contratos assinados. Depois, em 2016, teve dois contratos com o Comitê Rio 2016.
Observação 2:
Como a galera que acompanha esta Agência Sportlight sabe, existem dois espaços de publicação: “Reportagem” e “Opinião”, este último destinado a crônicas, etc. No caso da publicação acima, existiam elementos suficientes para que viesse a ser uma reportagem, pelo fato de mostrar novos aspectos da farsa que destruiu o Maracanã, etc. No entanto, como o espaço de “Reportagem” não deve conter adjetivações, etc, e carece de rigor na apuração e forma também, julgou-se que o tema pedia indignação suficiente e que não comportava ser só “reportagem”. Por isso, optou-se por publicar como “opinião”.
COMENTÁRIO DO BLOGUEIRO: E a farsa da Fonte Nova, em Salvador?
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