Ao contrário da calçada fieta de pedra, aquela feita com pneus tem um sistema de amortecimento
Provavelmente é daquelas pessoas que só se lembra de que os pneus existem quando o do carro fura. E é bastante provável também que nem sequer nunca tenha pensado no que acontece ao tal pneu que, depois de furado, o deixou à espera de reboque na autoestrada.
A verdade é que se forem deixados expostos à luz solar e às chuvas, os pneus começam a desfazer-se tanto em líquidos como em gases, contaminando ecossistemas inteiros e a atmosfera. E é por isso que os agentes económicos que vendem pneus novos são legalmente obrigados a encaminhar esses pneus usados para um centro da Valorpneu, que se encarrega de os transformar novamente em matéria-prima.
Esta entidade, que é a gestora do Sistema Integrado de Gestão de Pneus Usados, explica à MAGG que, só em 2018, foram recicladas mais de 50 mil toneladas, o que corresponde a 66,3% dos pneus gerados no ano. E se estes números são difíceis de imaginar, nada como uma comparação mais palpável. Em dez anos de reciclagem de pneus, evitou-se o equivalente à emissão de 26 mil carros ou de 70 mil viagens a Nova Iorque.
E a parte mais divertida desta transformação vê-se quando de pneus velhos são feitas coisas tão inusitadas como solas de sapato, travões nas estradas ou calçada portuguesa.
Estes foram alguns dos projetos candidatos ao Prémio Inovação Valorpneu, que todos os anos destaca a originalidade na hora de aproveitar os pneus como matéria-prima.Pedro Gonçalves, por exemplo, criou a Ubber Foot e faz calçado com solas feitas de pneus antigos. Já Francisco Duarte criou uma alternativa às lombas redutoras de velocidade, com a aplicação de um equipamento nas estradas que reduz a velocidade, sem ação do condutor, e sem que sejam necessárias travagens bruscas.
A Ecokalçada utiliza como matéria-prima o granulado produzido a partir de pneus velhos
E calçada portuguesa? Também há, até porque os pneus são mais versáteis do que à partida possam parecer. Climénia Silva, diretora-geral da Valorpneu, explica à MAGG as potencialidades do pneu enquanto matéria-prima. “O têxtil dos pneus é um excelente combustível, sendo utilizado essencialmente na indústria cimenteira. O aço é encaminhado para as siderurgias para nova produção de aço e o granulado e pó de borracha de pneu é utilizado sobretudo nos pavimentos de parques infantis e desportivos, no enchimento dos relvados sintéticos, na indústria de isolamentos e da borracha, bem como nas misturas betuminosas com borracha utilizadas nas vias rodoviárias”.
Perante esta versatilidade já não é tão difícil imaginar como é que de pneus se faz calçada. Começou com a proposta de Bruno Pinelas e concretizou-se com a intervenção de Pedro Marques, atual responsável pela
Ecokalçada, um projeto feito de borrachas recicladas, transformadas em “pedras” pretas e brancas que, apesar da semelhança com a calçada tradicional, têm capacidade de amortecimento.
E já é possível ver esta calçada instalada um pouco por todo o País, garante Pedro Marques. Já criaram passadiços de creches e lares de idosos, fizeram o chão de quiosques de venda de produtos portugueses e revestiram o pavimento dos ecopontos espalhados por Lisboa, Oeiras e Tavira.
Este ano, e pela primeira vez, vai circular pelo País até junho um projeto de sensibilização para a importância da reciclagem dos pneus, o Circuito de Portugal. Quando dizemos circular, é circular mesmo. Trata-se de um pneu telecomandado e interativo que percorre Portugal e que propõe uma viagem pelo sistema de transformação do pneu, desde o carro até, quem sabe, calçada portuguesa.
É espantosa a capacidade de utilizar pneus que já não são utilizáveis para tantos fins diferentes.
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