750 Kms de
estrada esburacada. Saindo de Salvador antes do sol nascer, a respirar a fumaça
dos caminhões e a comer churrasco ressecado em lanchonetes poeirentas para chegar,
exaustos, de noite fechada. Isso tudo a bem da cultura popular baiana. Filmando
o São João em Rio de Contas, pérola esquecida à beira da Chapada Diamantina. Carnaval
de Maragogipe. Desfile do 2 de julho na capital. Procissão marítima de
Nossa-Senhora dos Navegantes de Maragojipinho até Jacuípe. Quotidiano do
Maverick e seu fabuloso carro alegórico catando lixo reciclável na Vasco da
Gama. 3 de fevereiro em Itaparica...
Durante
vários anos, o amigo Martial Toussaint du Wast deixou o conforto de sua mansão
perto de Versailles, para, sob minhas sugestões, dormir em colchões duros e
tomar banho de águas tíbias, registrando momentos que o rolo compressor de
políticas imediatistas, atrelado a empresas despudoradas, está a eliminar da
memória coletiva. Mas o que levaria dois franceses a tão intensiva guerra aos
moinhos das agressões à cultura popular da Bahia?
Martial
serviu exército no Senegal. Entre suas atribuições, carregou a pesada câmera do
antropólogo/cineasta Jean Rouch, mergulhando na alma da África profunda. Não
seria, algumas décadas mais tarde e agora com câmera bem mais leve, difícil convencê-lo
a documentar expressões que sempre me interessaram.
Mais tarde,
no laboratório do Bernard Attal, tentamos uma primeira montagem que ficou muito
aquém daquilo que desejávamos. Escolher e cortar na carne viva de 26 horas de
filmagem não é tarefa fácil. O tempo passou. Algumas manifestações devem ter
mudado bastante. Como realizar o sonho de um amigo hoje debilitado? Pois não se
trata de mera leviandade de turista desocupado, mas sim de um registro que precisa
ser terminado, divulgado e cuidadosamente conservado.
Será sem dúvida um dos
pontos altos do Museu de Cultura Popular que ainda espero ver se concretizar
nesta Bahia tão ingrata com suas raízes...
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