sábado, 20 de maio de 2017

VINTE ANOS DEPOIS E O NARIZ DA CLEÓPATRA



Em novembro de 1997, então presidente da Amabasa, associação dos moradores do bairro de Santo Antônio, centro histórico de Salvador, publiquei no boletim “O Boqueirão” (N°6) uma nota com fotografias sobre os transtornos que a obra da Coelba estava causando a nosso quotidiano. 

A pretexto de enterrar a fiação elétrica, toda a Rua Direita, desde a Cruz do Pascoal até o Largo de Santo Antônio, se encontrava esburacada, em estado de guerra. Carro nenhum podia mais transitar na área. Após longos meses de lamaçal, a vala foi finalmente fechada. Mas, cúmulo do absurdo, toda a fiação continuou “enfeitando” a rua, para alegria da passarada.

Em 2010, mandei ofício ao Ministério Público Estadual questionando a instalação de transformadores de energia no mesmo bairro. A resposta chegou no princípio deste mês de maio - depois de sete anos de total mutismo! - escrita naquele linguajar que obriga o profano a várias leituras antes de aproximada compreensão. 

Entre cem argumentos dispensáveis, sou informado que, 

Em 2011, o Estado previa para a rede subterrânea do bairro, a importância de R$1.514.600,00.

 Em 2012, o mítico Escritório de Referência assegura que esta mesma implantação é “meta prioritária do Governo da Bahia”. 

Mas em 2015, o IPHAN(*) revela “a inexistência de Projeto Básico (...)” e a SUCOM (**) informa que “não foi verificado licenciamentos para implantação da vala única (...)”. 

Em setembro de 2016 “o parecer favorável da AGU contrasta com a assessoria do Ministério do Planejamento, e prevalece o parecer deste último (...) quando há conflitos entre pareceres (...)”.


Não pretendendo entupir esta modesta coluna com mais citações, não resisto, porém, a reproduzir este último trecho: 

“ Dessa forma, o prosseguimento das tratativas para implantação da vala única depende de tramitação de processo administrativo entre diversos órgãos da Administração Pública, envolvendo o Ministério do Planejamento, a SPU, o IPHAN, a FMLF e a SUCOM, e a natural burocracia existente advoga contra o prosseguimento do presente procedimento investigatório, notadamente em razão da incerteza na divergência de entendimento entre a AGU e o Ministério do Planejamento.” 

Em vinte anos, estes funcionários, que pagamos regiamente, não encontraram um patamar de entendimento.

Muitos já se escreveu sobre o País do Futuro. Mas pouco se assimilou tamanha burocracia ao Teatro do Absurdo. De Ionesco e Beckett a Albee e Pinter, os mais afamados autores encontrariam nos corredores e gabinetes das três instâncias tupiniquins a gigantesca barata kafkiana que já devorou boa parte das repartições mofadas do impotente Poder.


O nariz da Cleópatra tivesse sido mais curto, a face do mundo teria mudado...

(*) O mesmo IPHAN que não encontrou empecilho nenhum para a construção do edifício La Vue!

(**) A mesma SUCOM que, no centro histórico,  ignora os puxadinhos e até os imóveis de até cinco andares construídos na maior impunidade.

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