Quantos anos minhas mal traçadas são publicadas n´A Tarde? Dez, quinze anos... Mais? Perdi a conta. Logo que acabar o tempo de roleta russa que estamos vivendo, minha preciosa Cecília, bibliotecária/arquivista, ao me conceder novamente – assim espero - três manhãs por semana, saberá consultar a pasta idônea para responder. Mas pelos meus palpites já deve andar na faixa das quinhentas ou mais crônicas. Muitas fracas, algumas melhores, mas nada que se possa comparar aos escritos de Katherine Mansfield ou William Saroyan, os modelos de meus vinte anos ou, mais recentemente, ao saborosíssimo Fernando Sabino.
Entre os incontornáveis do jornal, além dos hors-concours
Levi Vasconcelos e Armando Avena, sou freguês assíduo de boa meia dúzia de
vizinhos das páginas de “Opinião”. Não vou listar para não criar desconforto.
Já tenho dose suficiente de desafetos, não preciso de mais nenhum. Vez ou outra
permito-me escrever para algum colega cronista, sempre no elogio. Raramente
recebo resposta. Mas afinal quem sou eu, hein?
Em contrapartida, faço questão de responder aos eventuais
leitores que têm a pachorra de apoiar minhas divagações. Também não se trata do
correio da Madonna. Se receber duas ou três mensagens após cada publicação,
fico super-lisonjeado.
A exceção é com o secretário de Cultura e Esporte de Paulo
Afonso, Jânio Ferreira Soares, cujos textos já curtia muito antes de ser colega
de jornal. Não que tenhamos uma correspondência digna de ser eternizada como as
de Joaquim Nabuco e Machado de Assis ou Vincent Van Gogh e o irmão Theo. Poucas
palavras, bem no estilo internet, mas que, pelo menos para mim, são sempre um
sólido incentivo.
A gente se corresponde tem uns vinte anos, irregularmente,
mas como velhos amigos para quem distância e tempo não conseguem cavar fosso.
Deste senhor, de quem nunca vi nem carnes nem ossos, só sei que tem mais cabelo
que eu e menos anos. Imagino que deve morar num sítio nos aforas da cidade. Uma
casa térrea, grande e simples. Avarandada. Algumas galinhas, um cão, duas
redes, uma sala repleta de livros. Computador. Muitos CDs. Perfumes tentadores
escapando da cozinha. Crianças correndo, uma mangueira carregada e goiabeiras à
espera de alguma aparição divina. Não desanime, amigo Jânio. Apesar desta era
apocalíptica de ateísmo, um dia verás brilhar uma bela garrafa de Lácrima
Christi ou um pacotinho de barriguinhas das freiras de Santa Clara de Évora. Só
não posso prometer Jesus de cabelo lavado, sandálias de dedão e mortalha azul
de algodão egípcio 100%.
O maior milagre por enquanto é poder continuar a escrever,
ler e sonhar que as noites de obscurantismo que estamos atravessando desde
janeiro 2019 acabem muito antes do fim de 2022.
Suas crônicas são deliciosas Dimitri Ganzelevitch, houvesse mais cronistas parecidos teríamos certamente de comprar o jornal onde eles publicam para sentir o sabor de nossa língua ao seu natural; a flor do Lácio bem empregada, abraço,
ResponderExcluirmuito lindo seu texto. Abriu a janela do coração e fez o ar da tarde entrar com doçura, cheiro de terra e esperança de dias melhores. Obrigada! Lucia
ResponderExcluirParabéns pelo belo texto. E que bela amizade, que mesmo distante mostra que os novos tempos já não nos separam.
ResponderExcluirExcelente produtor de borrões [assim são todos os textos, ao final de tudo]. A sua vasta bagagem cultural conta nessas horas. Tomara que esteja escrevendo a sua biografia, certamente cheia de aventuras mundo a fora. Parabéns.
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