ASSASSINATO de ÂNGELA DINIZ voltou à tona e sua amiga, Kiki Garavaglia, conta tudo à J.P: “Alguém me liga dizendo que o Doca tinha matado Ângela
Praia dos Ossos, faz uma investigação minuciosa do assassinato da socialite Ângela Diniz, morta a tiros pelo namorado, Doca Street, em Búzios, no verão de 1976.
Os episódios relembram personagens envolvidos nessa trama, detalhes que foram esquecidos e trazem depoimentos de quem viu a história de perto.
Amiga ,carioca , da Pantera de Minas, nossa colunista viveu pouco menos de um ano ao lado de Ângela, mas tempo suficiente para descobrir todas as suas facetas, como conta nas páginas a seguir
Por Kiki Garavaglia para revista JP
Em abril de 1976, estava indo para Paris com algumas amigas, entre elas Marialice Celidônio e, já no avião, vejo Ângela Diniz, a famosa Pantera de Minas, entrando… “Xiii, Marialice, olha quem entrou no avião!” “Caramba, é a Pantera de Minas.” “Bom, o importante é não darmos papo, chegando em Paris, não vamos mais encontrá-la.”
Paris na primavera, flores e alta estação, toda a mondanité chegando para os desfiles de alta-costura, festas todos os dias, exposições… Estava louca para ir almoçar no Bar du Théâtre, comer o famoso steak tartare com endívias fresquinhas, no fim do dia tomar um café no Flore olhando os parisienses ou ir ao bar do Plaza encontrar alguns amigos… Estava ansiosa para fazer tudo ao mesmo tempo!
No primeiro dia, demos umas voltas pela Rive Droite e retornamos para o hotel para encontrar Ionita Guinle, que viria nos visitar e contar as novidades. Qual não foi minha surpresa quando lá estava Ionita conversando com a Pantera! Tivemos que nos sentar na maior cerimônia, sem saber o que falar, o que fazer com aquela mulher “envolvida em assassinato” [na época, ela havia confessado um crime que não cometeu]. Fiquei fazendo sala e depois de certo tempo me levanto, pergunto a Marialice se estava de pé a nossa ida a Galeries Lafayette no dia seguinte. Ela disse que ainda estava cansada do voo, então, perguntei a Bia se queria ir. “Nem morta”, respondeu. Ionita logo disse: “Fala sério, Kiki, tá me vendo lá?”. Então, Ângela vira-se para mim e diz que adoraria ir comigo, estava louca por companhia.
Fim do primeiro ato.
No dia seguinte, entramos nós duas, às 11 da manhã, nas Galeries e, às 18h30 estávamos às gargalhadas, procurando um táxi, já que Ângela tinha comprado um enorme elefante de pano hindu e nenhum taxista queria nos levar para o hotel com aquele “trambolho” e, ainda por cima, a corrida seria curta! Naquela época, os taxistas parisienses eram famosos pelo mau humor… Desistimos depois de uma hora, e lá fomos nós tentando carregar o elefante da Ângela, quando para um carro grande, o motorista rindo, simpático e bonito, e oferece carona. Na mesma hora agradeci (imagina se iria pegar carona de um desconhecido!). “Tá louca, Kiki? Não vamos conseguir chegar ao hotel sem estragar meu elefante, sempre quis um”, respondeu Ângela, já tentando “enfiar” o elefante no banco de trás… Resumindo, foi o primeiro dia de uma curta, mas intensa amizade com uma pessoa maravilhosa, cheia de qualidades, amiga das amigas, excelente mãe, excelente filha, companheirona para todas as horas.
Voltamos ao Rio, depois das férias, cada uma retornou para sua vida cotidiana. Eu era mãe dedicada de duas filhas pequenas e Ângela fazia os programas dela com pessoas que eu não conhecia, mas nos falávamos sempre! Na verdade, nossa vida era bem diferente, ela conhecia muitos homens, era linda e cobiçada, nunca me interessei ou perguntei o que tinha feito e com quem. Ela chorava muito pela perda da guarda dos filhos após o escândalo do assassinato do caseiro/ jardineiro da casa dela. Ângela tinha confessado a autoria do crime, para não prejudicar a vida do amante… Assim era a Ângela! Morria de saudades da filha, Cristiana, com quem falava, escondida do ex-marido, várias vezes ao dia. Cristiana queria porque queria vir para o Rio e ficar com a mãe, por quem era apaixonada, até que um dia fugiu de casa e foi ao encontro dela. Ângela, em vez de informar ao pai, ex-marido, ou a mãe dela, dona Maria, não contou para ninguém… Logo, a polícia foi bater em sua porta e a filha foi devolvida. Era o segundo processo policial contra ela e Ângela começou a fumar maconha para ficar fora da realidade e não pensar nos filhos…
Quando estávamos juntas, era uma pessoa doce, meiga, engraçada, cheia de vida. Quando saía e encontrava “homens interessantes”, como dizia, ela se tornava realmente uma pantera, atacava a presa, usava e depois descartava. Ela vivia desafiando a sorte, queria deixar para trás a vida de debutante de sucesso mineira, de mãe dedicada, de filha obediente, e gostava de desafiar e chocar.
Um dia, alguém no prédio dela denunciou que Ângela usava “tóxicos”. Novamente, bateram na porta perguntando pela Ângela à empregada. Qualquer outra pessoa, em sã consciência, já toda enrolada com a Justiça, iria pegar a “trouxinha” de maconha (ela só fumava maconha, tinha horror a cocaína…) e jogaria fora. Sem discutir, pegou a maconha e simplesmente entregou ao policial. Claro, pediram para ela acompanhá-los à delegacia e mais um processo foi aberto. Perguntaram por que ela usava tóxico e Ângela respondeu que tinha perdido a guarda dos filhos, vivia deprimida e, em vez de tomar remédios, fumava para não pensar na saudade das crianças.
Ela tinha um lado bem “deslumbrada” e se encantou quando conheceu o famoso colunista social Ibrahim Sued, que, por sua vez, ficou encantado por ela. Mas, como bom árabe, o “turco”, como o chamava, era ciumentíssimo e Ângela adorava provocar. As brigas começaram, ela desprezava os ciúmes dele, o “ turco” ficava louco de raiva e várias vezes dizia que ia matá-la e sacava o revólver a ameaçando… Uma vez, numa festa, começaram a brigar, ele bateu nela, disse que a mataria e ela simplesmente se levantou, foi até a sacada do apartamento no décimo andar, botou as pernas para fora e disse: “Quer me matar, mata, mas não vai me machucar e marcar”. Acabou a festa, todos os convidados foram embora, apavorados.
Ângela era muito generosa, protegia as amigas, dava dinheiro, pagava matrículas dos filhos dos outros, sempre ajudando quem podia. Tínhamos uma amiga, muito doce e meiga, super careta, mãe de um casal e muito apaixonada pelo marido. Quando esse se apaixonou por outra mulher e foi embora, ela ficou desesperada, começou a beber, a cheirar cocaína, perdeu a guarda dos filhos e, para bancar o vício, foi vendendo tudo que tinha em casa: tapetes, pratas, objetos de valor, joias etc… Ângela pediu para Ibrahim descobrir quem era o traficante, foi na casa dele e comprou de volta todas as peças que sabia que a amiga gostava, pagando o dobro, o triplo, o que o traficante pedia. Internou nossa amiga na melhor clínica de desintoxicação, ela ficou bem e Ângela devolveu seus pertences. Assim era a Ângela Diniz, a famosa Pantera de Minas.
Em dezembro de 1976, alugou uma casa em Búzios e nos convidou para passar o Réveillon; estávamos meio reticentes pois sabíamos que ela e o Doca, por quem estivera perdidamente apaixonada, brigavam muito por ciúmes. Búzios no verão já estava cheio e todos os dias iam à praia e começavam a beber e cheirar com amigos aproveitadores… Ela me ligou dizendo que eu não precisava levar roupa para a festa do Réveillon pois tinha comprado um lindo vestido com uma fenda nas pernas e o Doca a tinha proibido de usar! Avisei que eu e meu marido, Renato, só iríamos na véspera, tinha surgido um problema… “Vem logo, estou com muitas saudades e o Renato vai distrair o Doca.”
No dia seguinte, estou num jantar delicioso, já tinha bebido de tudo, quando alguém me liga de Búzios dizendo que o Doca tinha matado Ângela, ela estava toda ensanguentada, meio nua e me diziam que eu deveria ir até lá para vesti-la e organizar o translado do corpo. Avisei que não estava em condições e pediria a uma outra amiga para ir. Fui para casa, fiquei catatônica, sem conseguir falar, sem conseguir chorar, em total estado de choque. Só pensava que nunca mais iria ver minha nova e querida amiga, que finalmente tinha encontrado a paz.
Angela Diniz || Créditos: Acervo Pessoal Kiki Garavaglia
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