Se havia
dúvida, a semana com recordes de mortes pela covid-19, restrições adotadas por
governantes e decisão do Ministério da Saúde de enfim adquirir imunizantes da
Pfizer e da Janssen deixa ainda mais claro: o governo federal está perdido em
meio à pandemia. Nesse contexto, a vacinação em massa é a única saída segura e
responsável dessa crise sanitária e institucional. A boa notícia, entretanto, é
que estudos científicos e dados recentes indicam que a adesão à imunização
aumenta à medida que mais indivíduos se vacinam, abrindo a porteira para um
verdadeiro “efeito manada”.
A pesquisa
do PoderData divulgada na última sexta-feira (5) já captou o crescimento da
aceitação das vacinas entre os brasileiros. Em 1 mês, o percentual de quem
pretende tomar alguma delas subiu de 71% para 85%, e o de quem não pretende
fazê-lo caiu de 21% para 10%. Felizmente, nesse aspecto os brasileiros seguem a
tendência mundial.
No Chile, onde
a 1ª dose começou a ser aplicada em 24 de dezembro, o interesse em se vacinar
assim que for possível saltou de 36%, em dezembro, para 60%, em fevereiro,
segundo o instituto Plaza Pública Cadem. Movimento semelhante foi detectado pelo
YouGov na Espanha (adesão de 53% em dezembro, contra 77% em fevereiro) e na
Finlândia (50% em dezembro e 70% em fevereiro). Na Itália e na Suécia, a
disposição em se vacinar contra a covid-19 cresceu em 20 pontos percentuais em
cerca de dois meses.
Na Grécia, o
instituto Pulse mostrou que o percentual de pessoas que com certeza se
vacinarão foi de 37%, em novembro, a 59%, em fevereiro. Vale a pena acompanhar
os dados da Austrália e da Tailândia, onde a vacinação só começou na última
semana de fevereiro. O percentual de hesitantes recrudesceu significativamente
ao longo dos meses nesses países. Entretanto, os últimos levantamentos
disponíveis são anteriores ao início da imunização.
Por aqui, a
confiança na vacina aparece relacionada a preferências políticas. O PoderData
mostra que 79% dos brasileiros que acham o governo federal bom ou ótimo estão
dispostos a tomar a vacina, contra 87% dos que o consideram regular ou
ruim/péssimo. A discrepância já foi maior, principalmente quando informado o
país de origem de cada imunizante. Foi o que mostraram duas rodadas de pesquisa
realizadas em outubro e dezembro de 2020 pelo Centro de Pesquisa em Comunicação
Política e Saúde Pública (CPS) da Universidade
de Brasília, com apoio do Instituto Brasileiro de Pesquisa e Análise de Dados (IBPAD).
Nesse sentido,
nossos números parecem ainda melhores que os dos EUA. Lá, o “efeito manada” tem
conseguido furar (um pouco) a exacerbada polarização entre democratas e republicanos,
que se estendeu à vacina. O monitor da KFF sobre vacinação contra a Covid-19,
que agrega diversas pesquisas sobre o assunto, apontou que, em dezembro, quando
a imunização começou, eram 34% os estadunidenses que já haviam tomado uma dose
ou estavam dispostos a se vacinar assim que possível. A proporção foi a 55% em
fevereiro. Entre os democratas, a adesão foi de 47% a 75% no mesmo período. Já
entre os republicanos, o salto foi menor, mas expressivo: 28% a 41%.
A lógica por
trás do “efeito manada” está em que pessoas indecisas em relação a determinados
assuntos costumam seguir o comportamento da maioria. Esse fenômeno já foi
amplamente estudado pela ciência política, por exemplo. Vários trabalhos
demonstraram a tendência dos eleitores de apoiar certos partidos políticos
simplesmente por estes terem maiores chances de vencer uma eleição, mesmo que estejam
distantes das preferências políticas do eleitor.
No caso da
vacina, um estudo de 2018 da Universidade de Munique mostrou que essas atitudes
também se aplicam à decisão sobre receber ou não um imunizante. Ou seja, muitas
pessoas “pegam carona” no comportamento de seus pares – familiares, amigos,
vizinhos – antes de se decidir sobre a vacinação. Os dados da pesquisa nos
Estados Unidos ajudam a ilustrar esse fenômeno: 70% dos que moram com alguém
que já foi vacinado e 50% de quem tem familiar ou amigo próximo que já se
vacinou pretendem se imunizar assim que for possível. Já entre os que não têm
relação estreita com pessoas que se vacinaram, apenas 30% pretendem fazê-lo.
O agravamento
da pandemia agora pode criar um estímulo adicional para que mais brasileiros
queiram vacinar-se. Apesar da velocidade paquidérmica de imunização coordenada
pelo governo federal, é esperável que, em meados do ano, esse “efeito manada”
leve aos postos de vacinação apoiadores e opositores do governo federal, em
proporções mais parecidas, e as desconfianças sobre a origem de cada imunizante
soem como uma “conversa para boi dormir”.
Dados para gráficos:
Instituto Plaza Pública Cadem. Chile. Começou a vacinação em 24/12.
·
18/12: 36%
·
24/12: 45%
·
15/1: 46%
·
22/1: 46%
·
29/1: 50%
·
5/2: 53%
·
12/2: 65% (+10% que já se vacinaram) = 75% apoio
·
19/2: 57% (+16% que já se vacinaram) = 73% apoio
·
26/2: 60% (+20% que já se vacinaram) = 80% apoio
KFF Covid-19 Vaccine Monitor. Estados Unidos. Começaram a vacinação em
14 de dezembro. Percentual que quer tomar a vacina assim que puder.
Para outros dados citados sobre
os EUA: https://www.kff.org/coronavirus-covid-19/poll-finding/kff-covid-19-vaccine-monitor-february-2021/
·
Dezembro: 34%
·
Janeiro: 41% (+6% vacinados) = 47% apoio
·
(15-23/2) Fevereiro: 37% (+18% vacinados) = 55% apoio
Instituto Pulse. Grécia. Vacinação
começou em 26 de dezembro.
·
Pessoas que afirmam que com certeza se
vacinarão. 37% em novembro; 40% em dezembro; 49% em janeiro; 59% em fevereiro
(26/2-28/2).
YouGov. Espanha. Começou a vacinar em 27/12. Pessoas que afirmam que já
se vacinaram ou que irão se vacinar.
·
14/12:
53%
·
18/12
52%
·
23/12:
55%
·
07/01:
66%
·
13/01
71%
·
20/01
66%
·
29/01:
74%
·
05/02:
73%
·
17/02:
77%
YouGov. Itália. Começou a vacinar em 27/12. Pessoas que afirmam que já
se vacinaram ou que irão se vacinar.
·
14/12: 52%
·
22/12: 55%
·
05/01: 64%
·
12/01: 71%
·
19/01: 70%
·
26/01: 70%
·
02/02: 74%
·
09/02: 74%
·
16/02: 72%
YouGov. Finlândia. Começou a vacinar em 27/12. Pessoas que afirmam que
já se vacinaram ou que irão se vacinar.
·
17/12:
50%
·
18/01:
69%
·
31/01:
69%
·
14/02:
70%
YouGov. Suécia. Começou a vacinar em 27/12. Pessoas que afirmam que já
se vacinaram ou que irão se vacinar.
·
18/11: 45%
·
14/12: 55%
·
15/01: 66%
·
01/02: 68%
·
12/02: 65%
Nenhum comentário:
Postar um comentário