Foto: Dimitri Ganzelevitch
Dez coisas que você talvez não saiba sobre moradores de rua:
1 - Muitos ligam para a família (mães, filhas e filhos, irmãos, sobrinhas) e desligam quando alguém atende porque têm vergonha. Outros mentem dizendo que está tudo bem, porque não querem que a mãe sofra. A maioria, quando a gente pergunta sobre sua família, responde: "É esta aqui", mostrando os moradores de rua ao seu redor.
2 - Em São Paulo, muitos se referem ao seu lugar (debaixo de um viaduto, colado ao muro, no meio de um canteiro) como "maloca" e se denominam "maloqueiros". Ficam muito irritados se chamados de "mendigos".
3 - Em várias ocasiões, pedem ajuda para parar de fumar, cheirar ou beber. "Me arruma uma internação?" é um pedido frequente. Muitos já passaram várias vezes por CAPS e internações. Muitos pararam de fumar e cheirar, mas não conseguem largar a pinga. Uma garrafa conhecida como "barrigudinha" ou "gorote" custa R$2,50.
4 - Por que não querem ir para albergues? Porque não podem levar a mulher, os amigos, as crianças e os cachorros - e é lógico que jamais os deixariam para trás. Porque não podem deixar a carrocinha na rua (pode ser levada pelo rapa ou roubada). Porque não querem dormir em um quarto com dezenas de conhecidos com quem não se dão ou desconhecidos. Porque não podem beber ou fumar enquanto estiverem lá (e ficam furiosos quando outros cheiram ou usam pedra nos banheiros). Porque as camas têm pulgas. Porque alguns albergues os obrigam a sair da cama antes das 6 da manhã. Porque alguns albergues são muito distantes de onde "moram", e tem kombi pra levar mas ninguém os traz de volta.
5 - Elas e eles adoram ganhar kits de higiene: sabonete, barbeador, desodorante, xampu, escova e pasta de dentes. E também gel (homens) e esmalte de unha.
6 - Muitos cobertores são abandonados durante o dia por motivos diversos, entre eles o fato de que moradoras e moradores de rua, por problemas fisiológicos, psicológicos etc, urinam enquanto dormem. E lavar a roupa, para quem mora na rua, é um luxo. Os que fazem questão procuram um chafariz ou a sarjeta mesmo.
7 - De um jeito ou de outro, assistem televisão. Ontem mesmo um garoto que dormia no meio da ciclovia da Auro Soares viu minha camisa de futebol e perguntou "E o Peru, hein?". Também comentam política e filmes. Outro dia o assunto de madrugada no ponto de ônibus do Pateo do Colégio era "A Lagoa Azul".
8 - Muitos tomam remédios controlados porque têm convulsões. Às vezes (toda hora) o rapa leva seus objetos - mochila com documentos, roupa, livros (sim, livros!), remédios - e eles não conseguem repor o que foi levado.
9 - Se morrerem sem terem nenhum documento com foto (acontece muito) e sem que se localize a família, um amigo que queira evitar que sejam enterrados como indigentes ("não reclamados", "não identificados") precisará ir duas vezes a uma delegacia tentar obter autorização para providenciar a "inumação". Às vezes não dá certo.
10 - É impressionante como gostam de comemorar seus aniversários. Experimente fazer festa para um deles (bolo, velinhas, refrigerante) - os outros todos vão ficar ansiosos na expectativa do seu dia e fazer contagem regressiva.
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