da redaçaõ do Teatro Oficina por Cafira Zoé com colaboração de Camila Mota, Carila Matzenbacher e Marília Gallmeister
Na última sexta-feira (25), o IPHAN-SP, deu parecer favorável ao projeto de Edifício da RBV, Residencial Bela Vista Empr. Imob. Ltda., aprovando as últimas alterações feitas pela Sisan Empreendimentos - braço imobiliário do grupo Silvio Santos, para a construção de dois mastodontes de concreto de 100m de altura -além dos andares de estacionamento subterrâneo - no último chão livre do centro de São Paulo, entre as ruas Jaceguai, Abolição e Japurá, no Bixiga, onde vive e respira o Teatro Oficina.
O processo para a construção do empreendimento imobiliário, que havia sido encaminhado pelo IPHAN em Brasília, para análise e posterior decisão para a Superintendência do IPHAN em São Paulo, teve o parecer favorável do relator Marcos Carillho.
O Teatro Oficina foi tombado em 1983 pelo Condephaat, quando o órgão era presidido pelo geógrafo Aziz Ab´Saber. Depois vieram os tombamentos nas instâncias municipal, Conpresp, e federal, Iphan.
A aprovação pelo IPHAN segue a diretriz do "Cone de proteção"* estabelecido pelo Departamento do Patrimônio Material do IPHAN-DEPAM, por ocasião da notificação de "tombamento provisório" do Teatro Oficina, publicada no Diário Oficial da União de 15/06/2010. Por se tratar de uma diretriz abstrata, abre caminho para deliberações abusivas e igualmente arbitrárias que violam tanto o Teatro Oficina - considerado pelo jornal
The Guardian o mais bonito e intenso teatro do mundo, seguido por Epidaurus - quanto os demais bens tombados no bairro: Casa de Dona Yayá, TBC... O Cone de Proteção em verdade não protege o bem tombado, Teatro Oficina, essa obra de arte de Lina Bo Bardi e Edson Elito, mas trata de sacrificá-lo num encaixotamento entre torres, se assemelhando muito mais a um cone de perversão á serviço da política de abuso da vida empreendida pela especulação imobiliária em São Paulo.
O Teatro Oficina é uma espécie de Tekoha (em Guarani se diz: lugar onde se pratica um modo de existir que resiste), em ressonância com as Tekohas indígenas, caracterizada pela contracenação com o Janelão de 100 metros quadrados que ativa o espaço, o fora, o sol, o bairro, a cidade, ou seja, todo o entorno, em ligação profunda com as práticas artísticas da Cia.
Interpretações muito mais complexas sobre o valor material e imaterial do entorno de um bem tombado, já¡ foram discutidas e acordadas como a Declaração de Xi´an, sobre a conservação do entorno edificado, sítios e áreas do patrimônio cultural, onde
Compreender, documentar e interpretar os entornos é essencial para definir e avaliar a importância como patrimônio de qualquer edificação, sítio ou área. A definição do entorno requer compreender a história, a evolução e o caráter dos arredores do bem cultural. Trata-se de um processo que deve considerar múltiplos fatores, inclusive a experiência de aproximação ao sítio e ao próprio bem cultural.
Incluir o entorno nesta compreensão demanda uma abordagem multidisciplinar e a utilização de diversas fontes de informação. Tais fontes incluem acervos documentais e arquivos, descrições artísticas e científicas, histórias orais e conhecimentos tradicionais, as opiniões das comunidades locais e daquelas relacionadas ao bem, assim como uma análise das perspectivas visuais. As tradições culturais, os rituais, as práticas espirituais e os conceitos, assim como a história, a topografia, os valores do meio natural, os usos e outros fatores contribuem para criar o conjunto de valores e dimensões tangíveis e intangíveis do entorno. A definição do entorno deve conjugar harmoniosamente seu caráter, seus valores e sua relação com o bem cultural.
Os órgãos de defesa do patrimônio são instituições historicamente fundamentais para a proteção da cultura, da memória, do meio ambiente, da arte, e, no entanto, neste momento estamos diante de um aparelhamento sádico destas forças, submetidas ás práticas políticas da especulação imobiliária privatista.
No IPHAN, CONDEPHAAT e CONPRESP, durante muitos anos, operaram re-existências políticas concretas, de Flávio Império a Aziz Ab´saber, de Mário de Andrade à Jurema Machado. Hoje, uma série de práticas desprezíveis, de inversão de valores à inconsistência de laudos e aprovações (no que diz respeito a real defesa dos patrimônios tombados e seus entornos) tem operado politicamente contra os próprios princípios que caracterizam seus fundamentos. Vivemos um processo de desfiguração, e mesmo de deformação, das ações desses governos. Lutar pela preservação de bens tombados e seus entornos é também lutar pelo fortalecimento dessas instituições massacradas pelas leis de mercado.
A liberação do projeto da RBV pelo IPHAN representa mais um avanço violento da especulação imobiliária no último terreno livre, um respiro, no centro de SP. Em outubro de 2017 o CONDEPHAAT reverteu uma decisão histórica de seu conselho, que em 2016 negou a construção de torres pelo Grupo SS, aprovando, de maneira tacanha, o recurso do grupo, com parecer favorável à construção das torres. Um grande movimento em defesa do local, pedindo que a área em questão se transformasse em um parque público - um território cosmopolítico, de gestão participativa entre sociedade civil e poder público, suspendeu a votação no órgão municipal, o CONPRESP, que decidiu colocar em pauta apenas após a deliberação do IPHAN. Portanto a decisão da última sexta-feira é crucial para que se fortaleça a luta pelo Parque do Bixiga - que já tem um projeto de Lei (805/2017) em curso na câmara municipal, como uma re-existência real e possÃvel ao avanço violento da especulação imobiliária na cidade. Trata-se de uma luta de modos de existir que resistem ás forças de opressão da vida, da terra, tanto no bairro do Bixiga, quanto em toda a cidade de São Paulo.
Mesmo com a decisão do IPHAN favorável ás torres, é fundamental entender a diferença dos objetos sobre os quais decidem cada órgão de preservação como um
alerta sobre o entreguismo a que estão submetidos nossos órgãos públicos de preservação do patrimônio. O Iphan delibera apenas sobre o Teatro Oficina, tombado por ele, e a deliberação leva em consideração apenas o Cone de Proteção do janelão do Teatro. O CONPRESP, no entanto, é responsável pelo tombamento do Teatro Oficina, de diversos outros imóveis e do bairro do Bixiga como um todo (resolução n°22/2002), em uma resolução muito completa que protege por lei o valor material e imaterial do bairro, incluindo não apenas seu valor arquitetônico, mas sua topografia, traçado urbano, seu valor ambiental e seus usos, portanto, é urgente exigir desse órgão de proteção municipal que não siga simplesmente a decisão do IPHAN, mas que delibere a partir dos demais bens tombados no entorno do terreno em disputa, já que os objetos de suas proteção são múltiplos e se relacionam numa proteção ampla e cuidadosa de um bairro inteiro.
*o Cone de Preservação é a regulamentação da área envoltória do Teatro Oficina, sugerido pelo IPHAN na ocasião do tombamento provisório. De acordo com a restrição, o entorno do Teatro Oficina protegido de edificação se restringe á uma faixa de 20 metros á partir da fachada oeste do edifício, que abriga o janelão do prédio. Dentro deste recuo de 20 metros se inscreve o Cone de Preservação, um cone com abertura de 45° á partir do perímetro do janelão.
POR ISSO,
CONVOCAMOS SOCIEDADE CIVIL, MORADORES, INTERESSADOS, ARTISTAS, INTELECTUAIS, PROFESSORES, PESQUISADORES, ARQUEÓLOGOS, GEÓGRAFOS, BIÓLOGOS, ENGENHEIROS, POETAS, MÉDICOS, URBANISTAS, TODOS OS POVOS, PÃSSAROS, PLANTAS, RIOS, ÃTOMOS, PARA SE ALIAREM NA LUTA POR UMA SÃO PAULO COSMOPOLÍTICA
com força e fogo pra frear o avanço da especulação imobiliária sobre as nossas vidas.
TEATRO OFICINA | AGENDA DE LUTA
MARATONA 2018 AQUIAGORA
RODA VIVA
PRA VIRAR
PARQUE DO BIXIGA
4 DE JUNHO - QUENTA PRO PARQUE DO BIXIGA
19h COMEMORAÇÃDO PRÊMO APCA (arquitetura) 2018
Em frente ao Teatro Sérgio Cardoso - Bixiga
Prêmio Resistência Urbana: Bixiga. Vai-Vai; Festa de Nossa Senhora Achiropita; Teatro Oficina; União de Mulheres de São Paulo; Casa de Dona Yayá¡ / Centro de Preservação Cultural da Universidade de São Paulo (CPC USP).
16 e 17 JUNHO MARATONA 2018 AQUIAGORA
QUANDO QUEBRA QUEIMA
secundaristas no Teatro Oficina
19h
17 JUNHO - ARRAIÃ DE LUTA
2º GRANDE ATO PELA CRIAÇÃO DO PARQUE DO BIXIGA
(mais informações em breve)
23 e 24 JUNHO - MARATONA 2018 AQUIAGORA
QUANDO QUEBRA QUEIMA
secundaristas no Teatro Oficina
19h
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