A jornada pela primeira vacina contra o coronavírus no Brasil
Entrevistamos a médica brasileira que trouxe os estudos com uma candidata à vacina para o país.
Entenda os bastidores e as expectativas em jogo
O Brasil está na rota daquela que pode ser a primeira vacina contra o novo coronavírus. E uma das responsáveis por isso é Sue Ann Costa Clemens, médica e pesquisadora especialista em doenças infecciosas e diretora do Instituto de Saúde Global da Universidade de Siena, na Itália.
Instalada no Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR), no Rio de Janeiro, ela coordena o braço brasileiro do estudo internacional que avaliará em 50 mil pessoas pelo mundo um dos imunizantes em estágio de desenvolvimento mais avançado para ajudar a deter a pandemia de Covid-19. A vacina, criada na Universidade de Oxford, na Inglaterra, será testada em 5 mil brasileiros e se espera que resultados preliminares possam vir a público em outubro.
Nesta conversa exclusiva com VEJA SAÚDE, Sue Ann relata a jornada para provar a segurança e a eficácia do produto e o papel do Brasil na história que está sendo escrita. “Tenho confiança nessa vacina”, diz. E reflete sobre outros aspectos cruciais para conter esta e uma eventual próxima pandemia. Segundo ela, também precisamos de uma “vacina mental”.
VEJA SAÚDE: Doutora, pode nos explicar a tecnologia por trás dessa vacina testada no Brasil?
Sue Ann Costa Clemens: Ela utiliza uma tecnologia em que um vírus que não é replicante nem infeccioso serve de carreador para o coronavírus modificado para não provocar doença, mais especificamente para a proteína S do coronavírus [proteína que permite ao patógeno se conectar a uma célula humana e infectá-la]. É uma plataforma conhecida como vetor viral recombinante e vem sendo usada por diversas farmacêuticas e por Oxford para combater surtos virais, como aconteceu com o ebola e a Mers [síndrome respiratória do Oriente Médio, causada por outro tipo de coronavírus]. Nessa nova vacina, empregamos um adenovírus [vírus que originalmente causa resfriado] como vetor para a proteína S do coronavírus.
Quer dizer que já havia uma experiência acumulada com esse modelo de vacina?
Isso foi um diferencial em relação a outras vacinas candidatas em desenvolvimento, porque permitiu que se chegasse a uma plataforma e a uma vacina para o novo coronavírus mais rápido. Com o estudo em epidemias como ebola e Mers, já tínhamos dados e experiência com a imunogenicidade [capacidade de a vacina gerar uma resposta do nosso sistema de defesa] e a reatogenicidade [potencial de gerar efeitos colaterais] de vacinas com a mesma tecnologia em mais de 7 mil voluntários.
Isso possibilitou um desenvolvimento mais rápido agora e a começar os estudos com mais segurança, embora a gente não tenha pulado nenhuma fase de pesquisa. Tivemos a etapa pré-clínica [experimentos com células e animais], as fases 1 e 2 do estudo clínico [em humanos] e entramos no Brasil com a fase 3 [etapa em que se avalia a eficácia em um grande número de voluntários].
Nenhum comentário:
Postar um comentário