No dia 25 de maio, o negro americano George Floyd perdeu a vida nas mãos de um grupo de policiais da cidade de Minneapolis, apesar dele gritar “não consigo respirar”. O crime deslanchou nos Estados Unidos uma onda de protestos como não se tem visto há décadas, apesar dos riscos associados ao coronavírus e da repressão que o governo de Trump tentou montar para impedir as manifestações.
Essa semana, o enterro de Floyd aconteceu ao vivo nos canais de TV, em presença de políticos, artistas e multidões reunidas em vários pontos do país. Talvez a imagem mais simbólica foi a permissão dada pela prefeita de Washington de pintar na própria avenida em frente a Casa Branca as palavras Black Lives Matter (Vidas Negras Importam, em português).
Uma pesquisa do jornal The Washington Post revelou ainda que 69 % dos americanos hoje concordam que a morte do Floyd reflete um problema de comportamento da polícia enquanto em 2014, 51% da população achava que a morte de jovem negro Michael Brown e de outros eram “casos isolados”.
Nos Estados Unidos, no ano, são mais de mil homicídios decorrentes de intervenção policial. No Brasil, são mais de seis mil. A grande maioria das vítimas são os jovens negros das periferias das cidades. Lá como aqui, os policiais são raramente indiciados e condenados. Porém, desde o assassinato de Trayvon Martin, em 2012, e a criação do movimento Black Lives Matter, a onda não parou de crescer.Observando essa onda poderosa, é de se perguntar: por que já não aconteceu no Brasil depois dos casos de Amarildo, Ágata, João Paulo, Geovane, Davi Fiuza, dos jovens do bairro de Cabula e tantos outros exemplos de encontros fatais com a polícia?
Durante a presidência Obama, uma comissão foi criada para pensar a polícia do século 21, medidas foram tomadas em vários estados para obrigar os policiais a carregar câmera no corpo. Agora se debate a necessidade de redirecionar parte do orçamento da polícia para políticas sociais. Aqui, a quase totalidade dos governos estaduais continuam tratando as ocorrências de violência policial como casos isolados. O debate sobre como reformar a polícia quase não existe, além de uma conversa sem compromisso sobre a necessidade da desmilitarização.
São poucos os artistas e formadores de opinião que se mobilizam de verdade para além da sua rede social, contra essa tragédia em nossa sociedade. A imagem mais bonita das manifestações nos EUA foi sem dúvida ver as pessoas brancas desfilar com a comunidade negra e as vezes criar barreiras entre ela e os policiais.
Quando terminar a crise da pandemia, em vez de sonhar com a reabertura dos shoppings e das praias, nosso primeiro dever não seria sair às ruas com nossos irmãos negros para acabar com o genocídio de qual são vítimas há séculos?
Bernard Attal é cineasta, diretor, dentre outros filmes, do documentário Sem Descanso
De acordo.
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