Todas as figuras históricas têm os seus mistérios. Mas no caso de Sebastião José de Carvalho e Melo, um dos mais importantes governantes portugueses de sempre, há zonas de sombra que persistem, e que nos fazem perguntar: não terá o próprio pretendido manter esses mistérios?
1. A vida oculta
Um Secretário de Estado que veio do nada… Não há documentos que dêem conta do que fez Sebastião José antes de 1723, quando raptou D. Teresa de Noronha, com quem se casou, fugindo para Pombal. Um documento ligeiramente posterior dá conta de um pedido de promoção a oficial de cavalaria, o que comprova que esteve no exército. Alguns biógrafos do século XIX falavam de que se envolvia em pancadarias. Certo é que deixou Lisboa, em tensão com a família, e se refugiou primeiro em Soure e depois em Pombal.
O que levaria a um rapaz da cidade, crescido ao pé do Bairro Alto, a deixar tudo e a encafuar-se no campo? Em que histórias se terá envolvido? O próprio Sebastião José, tendo escrito mais tarde sobre tantos momentos da sua vida, ignora este. Não há – que tenhamos encontrado – testemunhos escritos sobre este período. Terá o Terramoto arrasado provas e histórias? Ou teria o próprio, mais tarde ministro omnipotente, destruído documentos?
2. As estranhas doenças
Era habitual na época, com a distância e a comunicação via cartas, que cada pessoa desse detalhadamente conta por escrito sobre o seu estado de saúde. Contudo, no caso de Sebastião José, as descrições e a gravidade das doenças são crescentes. Ocorrem sempre depois de períodos de intenso trabalho, envolvidas num imenso receio de falhar nas tarefas que lhe foram confiadas; crescem no largo isolamento, desdobram-se em sofrimento psicológico.
Longas e frequentes sangrias foram-lhe feitas várias vezes, devido a frequentes «defluxos» (como o próprio descrevia os corrimentos), febres, dores de garganta. Esteve à morte em Londres, em 1743-44, em Viena em 1748-49, em Lisboa em 1765-66. Mesmo assim sobreviveu aos seus irmãos, morrendo com 82 anos, provecta idade para o século XVIII.
Teria o Marquês de Pombal alguma secreta doença que no seu tempo não pôde ser diagnosticada? Ou seria apenas hipocondria? Uma outra hipótese: tratar-se-ia apenas das consequências de extremo trabalho? O mistério persiste.
3. Mulheres
Depois de raptar a primeira mulher, D. Teresa, doze anos mais velha, e de com ela viver aparentemente em harmonia, Sebastião José fica viúvo em Londres, em 1739. Apenas voltou a casar em 1745.
Entre as suas amizades londrinas, contava-se o escritor pornográfico William Cleland. E em Londres, e mesmo em Viena, enviava todos os meses uma ajuda a uma certa “Madame Bachelier”. Teria este homem alto, louro, bem-falante, embaixador de um rei prestigiado e rico, ficado solteiro durante tantos anos? Ter-se-ia envolvido com outras mulheres? Era sensível à beleza feminina, como atestam as suas cartas para Lisboa, admirando intensamente a rainha da Hungria, Maria-Theresa. Se o Marquês de Pombal era dado a aventuras, apagou-as o segredo.
4. Inimigos
Já no governo, foi vítima de três atentados contra a sua vida, e de uma orquestrada e crepitante campanha de difamação. Depois de chegar a Secretário de Estado do Reino (1756-1777) perseguiu os seus inimigos: o embaixador Encerrabodes por pouco escapou entre as suas mãos. Terminou com a Companhia de Jesus, e testemunhou pessoalmente junto da Inquisição para que fosse preso e condenado o jesuíta Malagrida.
Porém, durante mais de duas décadas de poder, afastou quem lhe fazia frente ou até sombra. Muitos foram presos, desterrados, muitas vezes sem conhecermos os verdadeiros motivos: o ex-colaborador Seabra da Silva, o Visconde de Vila Nova da Cerveira, ou até o Bispo de Coimbra. Já sem falar de milhares de jesuítas presos. O seu rancor, poderoso motor, tudo fez desaparecer.
5. A sua mãe
Que relação teve o Marquês de Pombal com a sua mãe? Sabemos que se opôs ao segundo casamento da mãe, e segundo alguns testemunhos chegou a vestir-se de preto e a dizer que a mãe tinha morrido. Não mais falou sobre ela. Entre ambos sobra apenas o fim de uma carta, em que a mãe lhe manda secos cumprimentos para Londres.
Como esta ferida fulcral foi um fantasma na vida de Sebastião José? Talvez cortando para sempre qualquer laço entre si e os outros, entre si e o mundo?
Há mistérios que até uma biografia da vida de um governante não consegue responder.
Há, contudo, outros que, soterrados nos arquivos, apenas aguardam para ser descobertos. Como outros que resolvemos nesta biografia, De Quase Nada a Quase Rei: como o Marquês foi o autor secreto de obras contra os Jesuítas, ou cartas de louvor a si mesmo; ou como beneficiou no cargo a seu favor.
Os Jardins e o Palácio do Marquês de Pombal, classificado como monumento nacional, é um exemplo do valioso património do século XVIII, cujo projeto é de autoria de Carlos Mardel, famoso arquiteto húngaro que teve papel privilegiado na reconstrução pombalina de Lisboa, aquando do terramoto de 1755.
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