Um amigo do filho de uma amiga vai com a esposa a Marrocos e pede umas dicas a respeito do país que conheço quase como a palma de minha mão.
Ele
esclarece que pretendem ir a Chaouen, Fez, Marrakesh e o deserto do Saara. Em
onze dias. Tirando o dia da chegada e o da saída, sobrarão nove. Bem do tipo
que quer conhecer a França durante um feriadão ou o Brasil numa semana. Me
lembrou uma anedota de minha adolescência.
Duas
americanas estão olhando pela janela do ônibus. Uma pergunta que cidade estão
vendo. A outra responde: “É quinta-feira? Deve ser Bruxelas”.
Para ir a
Chaouen, tem que passar por Tânger. E não irão até o Socco chico visitar a
Legação Americana e o Hotel Continental? Tão pouco às grutas de Hércules
esperar o pôr-do-sol para ver o tão celebrado raio azul?
Só Fez e
Marrakesh merecem, pela riqueza de seu patrimônio, pelo menos uma semana cada. Não
conhecerão o fabuloso patrimônio Art Déco de Casablanca, prestes a ser tombado
pela Unesco, e a Grande Mosquée. Não almoçarão no pátio encantado do La Scala.
Não visitarão as fortificações portuguesas de El Djadida e de Essaouira onde
Orson Welles filmou Otelo. Perderão os jardins escondidos nas muralhas dos
Udaias e do Chellah em Rabat.
Confesso que
abomino este tipo de viagem vapt e vupt. Prefiro perder dois terços do país,
mas saborear devagar aquilo que tenho a sorte de poder visitar. Já fui quatro
vezes ao Peru, cinco ao México e só conheço, e mal, uma muito modesta parte destes
fabulosos países. Em Cusco, passei dez dias e em Ayacucho uma semana. E sei que
ainda me restaria descobrir um monte de segredos. Em Puebla, duas vezes
convidado e mais três por conta própria, teria que voltar uma sexta vez para
investigar melhor as redondezas. Em Petra, a maioria dos visitantes passa um dia.
Fiquei uma semana subindo morros íngremes e descendo encostas escorregadias. Já
tinha meus costumes no café junto ao Tesouro. Uma noite assisti a um concerto de
música árabe antiga com o monumento iluminado por mil velas.
Visito cada
museu, cada templo. Bato perna nas feiras, nos livreiros e nos antiquários.
Faço questão de ser comunicativo, qualquer que seja a língua. Converso com os
vizinhos do trem ou do ônibus. Vou experimentar a comida nos mercados e sento
durante horas nos bancos públicos a olhar o povo passar, sua forma de andar e
de vestir. Vou aos rituais, procissões, concertos e óperas.
Odeio
selfies, mas fotografo tudo aquilo que me parece significativo. Mantenho um
pequeno diário onde anoto informações essenciais e alguma reflexão. Muito me ajudarão
a lembrar até de detalhes que não registrei.
Se tivesse
que sugerir duas cidades no Brasil para conhecer em onze dias, seriam, pela
força de suas identidades, Salvador e Belém.
Nenhum comentário:
Postar um comentário