quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

O FUNDO DO POÇO

 2024, o ano em que a segurança pública perfurou o fundo do poço

Nunca estivemos tão perto do tal processo de "mexicanização", que significa, grosso modo, a tomada de setores estratégicos do Estado do tal processo de "mexicanização", que significa, grosso modo, a tomada de setores estratégicos do Estado pela criminalidade

Por Jorge Pontes 


2024 chega ao final talvez como um dos anos mais críticos para a segurança pública no país. Nunca estivemos tão perto do tal processo de “mexicanização”, que significa, grosso modo, a tomada de estratégicos do Estado pela criminalidade organizada – incluindo-se aí quadrantes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, nos três níveis da administração pública – municipal, estadual e  e federal.

E jamais se falou tanto na suspeita de que diversos candidatos a prefeituras e a cadeiras do legislativo municipal tivessem tido suas campanhas financiadas por grupos criminosos… 

Não querendo ser pessimista, mas já sendo, acreditamos que nada – absolutamente nada – poderá ser iniciado e ir adiante no enfrentamento à epidemia de criminalidade que assola o Brasil, por dois simples e claros motivos: ( 1 ) o atual estágio de degradação das polícias; e ( 2 ) o descompromisso das nossas elites políticas com causas relevantes que necessitam de ações de longo prazo – e certamente a segurança pública é uma dessas áreas.

Não precisamos nos esforçar muito para percebermos que as nossas polícias – militares e civis, com poucas exceções, estão sendo tomadas e carcomidas pela delinquência, ao ponto de, em alguns estados, já serem consideradas um braço fardado das facções criminosas. Recentemente, a grande imprensa divulgou que somente no ano de 2024 o Ministério  Público de São Paulo (MPSP) abriu 2.308 inquéritos – média de 7 por dia – para apurar (com indícios concretos de participação) crimes de policiais militares daquele estado. São números impressionantes.
Segundo investigações do MPSP, os “serviços prestados” por policiais ao Primeiro Comando da Capital (PCC) vão desde transporte das drogas, passando por atividades de inteligência, até a própria lavagem de dinheiro.
Desta forma, qualquer pacote de medidas de combate à alta criminalidade deverá ser precedido de um sério e profundo serviço de “internal affairs”, com muita inteligência e repressão, que, por sua vez, , deverá ter como alvo prioritário os próprios quadros das polícias.

Enfim, deverá ser posto em prática, pelos ministérios públicos e pelas corregedorias policiais, algo como um grande mutirão para  para investigar, amealhar evidências, processar e expulsar os agentes comprometidos com os criminosos. E isso deverá ocorrer como “condição de procedibilidade” para ulteriores projetos de de enfrentamento à delinquência.

Não podemos nos iludir que com policias comprometidas nesse nível poderemos ter algum sucesso no combate à criminalidade. 

Por um outro lado, surpreendentemente, a única iniciativa projetada em reação a essa crise – que merece especial destaque – é a chamada PEC (proposta de emenda à Constituição) da Segurança Pública, , titularizada pelo Ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski.

A medida obviamente é relevante e necessita de apoio, até porque alguma coisa precisa ser feita, e com a máxima das urgências.  Entretanto, o que observamos em relação a essa PEC, foi um número expressivo de governadores de estado refratário à iniciativa, muitos deles por questões meramente ideológicas e eleitoreiras.  O resultado foi que o projeto segue patinando e nada efetivamente foi implementado.

Por outro turno, quanto ao Congresso Nacional e os políticos de uma forma geral, temos a impressão de que a grande maioria dos nossos parlamentares encontra-se preocupada tão somente com as emendas do orçamento e o cabo de guerra travado para sua liberação, que está em curso entre o Ministro Flávio Dino do Supremo  Tribunal Federal e a Câmara dos Deputados. Aliás, diga-se de passagem, trata-se de uma atuação heroica do Ministro Dino. 

E pobre da nossa sociedade, que necessita de lideranças políticas e projetos eficazes para a contenção da criminalidade, e assiste desolada a ganância de centenas de parlamentares, atrás dos bilhões  de Reais que escoam via emendas secretas. Para quem assistiu, em sequência, Mensalão e Petrolão, não fica difícil imaginar onde tudo isso vai parar. E Flávio Dino, que foi um bom Ministro da Justiça,  já entendeu bem a situação.

A propósito, a Polícia Federal já deflagrou algumas ações repressivas em relação a desvios de recursos de emendas parlamentares, num montante que pode vir a totalizar 1,4 bilhões de Reais. A Operação Overclean (já com duas fases realizadas) teve prisões, apreensão de milhões em cash, e malas de dinheiro sendo jogadas pela janela. O caso envolve, para variar,  corrupção de agentes da lei e dezenas de políticos, todos da Bahia.

Estamos vivenciando no Brasil um grande “vale tudo”, onde o campo da direita finge não ver que a violência policial anda de mãos dadas com a corrupção policial, assim como a esquerda fecha os olhos para a corrupção sistêmica que promove desvios na política, e acaba inviabilizando o sucesso no enfrentamento à criminalidade violenta dos andares de baixo. 

Não é a toa que parlamentares rejeitam transparência e rastreabilidade nos processos de liberação das emendas, assim como policiais militares rejeitam a instalação de câmeras em seus uniformes. Os motivos se assemelham…

Enfim, qualquer projeto de enfrentamento à criminalidade que se preze deve ser iniciado de cima para baixo e de dentro para fora. Qualquer coisa diferente disso será empulhação ou medida para “inglês ver”. 

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