segunda-feira, 31 de outubro de 2022

MINHA HOMENAGEM AO NORDESTE...

COMO DE GRINGO, VIREI PARAIBA

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Ainda hoje, quem me vê passar, me conheça ou não, pensa: “Lá vai o gringo”. Fazer o quê? Mudar minha silhueta, a cor de minha pele, a forma de andar, o sotaque franco-luso-baiano? Não vai dar nunca. Mesmo a caminho de meio século de coqueiros, abarás e andanças desde o Alto de Coutos até São Cristóvão, passando pelo Horto Florestal quando ainda tinha árvores e a Ilha de Maré. Se, nos primeiros tempos, procurava a companhia de meus conterrâneos na Aliança Francesa, aos poucos fui tecendo minha rede social entre os Pedro, Gel, Álvaro, Maria-Helena, Uelinton, Kate e outros Humberto.
Fui amigo de Ildásio Tavares e de Yumara Rodrigues. Apareceu a margarida. Carybé e Mãe Stella de Oxóssi honraram minha casa. Me lembro dos princípios da companhia Frutos Tropicais, pré-história do Balé Folclórico da Bahia. Em Conde, o Renato Ferraz, então diretor do MAM, me ofereceu jiboia frita. Organizei a última exposição de Hansen-Bahia sem vender a mínima gravura. Fui vergonhosamente roubado pelo cunhado de um governador e depois ministro íntegro, grande amigo da Olívia Soares.
Aprendi a gostar de licor de jenipapo e fui cliente do Diolino das batidas no Rio Vermelho. Me acostumei ao mormaço de fevereiro, aos dilúvios de abril, às noites frescas de agosto. Fui até a Chapada Diamantina antes da primeira pousada. Até hoje me empolgo com o desfile do Dois de Julho, quando o Caboclo e a Cabocla, empenados, passam debaixo de minha sacada. Fiquei vaidosíssimo quando, ao receber minha primeira crônica, em 1992, o chefe de redação da Gazeta Mercantil duvidou da autoria e acabou afirmando “Você escreve português melhor que meus jornalistas”, mas, curiosamente, fico quase decepcionado quando, vez ou outra, meu amigo Waldemar Silvestre me escreve: “Hoje não tem nada a corrigir” ao texto que acabei de lhe mandar antes de publicado n´A Tarde.
Gosto de viajar. De volta às minhas origens ou descobrindo outras terras, outras culturas. Mas passadas quatro ou cinco semanas, sinto comichões na poltrona, no banco de jardim e no colchão. Já está na hora de voltar para casa. E minha casa, minhas rotinas, minhas referências começam e terminam na Rua Direita de Santo Antônio.
Assim que quando ouço na televisão que o presidente de todos os brasileiros ousa desprezar os nordestinos, minha tensão sobe perigosamente, fico uma fera e lamento que ele não tenha explodido na operação Beco sem saída. Para me acalmar, nada como assistir ao maravilhoso, emocionante documentário “Estou me guardando para quando o carnaval chegar”. Quando termina, me sinto irmão, unha e carne com este povo batalhador, alegre e sonhador. Deixo a sala de cabeça erguida e me sinto, definitivamente, totalmente paraíba.

2 comentários:

  1. Dimitri, cronista, chef e antiquarista, é o último gringo que aqui se melou com o visco da Bahia e aqui ficou, como Hansen, Verger, Caribé e mais alguns. Onde estão todos eles? Dormindo profundamente (Bandeira) nesta véspera de finados. Mas Dimitri está muito vivo e produtivo, poetando e bradando contra a Conder, que para se vingar de suas críticas esburacou a sua rua penalizando toda a tribo de Santo Antônio Além do Carmo. Salve Demitri, o gringo mais afro-baiano.

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