domingo, 3 de setembro de 2017

A BANALIZAÇÃO DO HOLOCAUSTO

Carta aberta de Marcio Pitiukl a Fernanda Torres e Folha de São Paulo

Resultado de imagem para FOTOS DE CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO

A “banalidade do mal” foi uma expressão criada por Hannah Arendt para descrever o absurdo que foi o Holocausto.
E é contra a banalização do maior crime já cometido na História da humanidade que o Holocausto é recordado. O que não significa que deve ser usado para comparações com outros crimes.
Desde 2009 me dedico a divulgar o que foi o Holocausto escrevendo livros, produzindo filmes e realizando palestras em escola particulares, escolas públicas, Universidades, associações de classes, empresas, e a todos os lugares onde recebo convites. As vezes vou sozinho, outras vezes com um sobrevivente, testemunha ocular da História que conta sua experiencia, o que sofreu na pele.
Depois de mais de uma centena de palestras, posso afirmar que as pessoas sabem muito pouco sobre o Holocausto. Sabem que milhões foram mortas, na sua grande maioria judeus, mas não tem muita informação de como foram assassinados, por que, nem que existiam campos de concentração, campos de transito, de trabalhos forçados e de extermínio. Nem mesmo entendem como eram os campos. Confundem com prisões. E é para esclarecer essas dúvidas que realizo o meu trabalho.
Essa falta de conhecimento leva muita gente a usar o Holocausto como exemplo quando querem falar de violência contra criminosos ou oponentes políticos.
Nada mais longe da realidade.
O uso errado do Holocausto leva a banalidade do mal. Transforma o pior momento do ser humano em algo comum, como se não fosse único.
A unicidade do Holocausto é que foi um assassinato em massa praticado em escala gigantesca, de forma industrial, por um país inteiro, que era nada mais nada menos que uma das principais culturas em meados do Século XX. Teve o apoio de toda a sociedade alemã, civil e militar. Envolveu banqueiros, industriais, intelectuais, universitários, enfim, a elite alemã. Só para dar um exemplo, o gás Ziklon B, usado para o extermínio, não foi desenvolvido por um psicopata ou um maníaco, e sim por uma equipe de engenheiros químicos que sabiam muito bem o que estavam fazendo.
Esta semana, no jornal Folha de São Paulo, a atriz Fernanda Torres usou o Holocausto para comparar com a situação dos presídios do Rio de Janeiro. Esse erro se deve ao desconhecimento do que foi esse acontecimento histórico. Nas prisões do Rio de Janeiro estão criminosos condenados. Nos campos nazistas estavam homens, mulheres e crianças que ali estavam apenas por serem judeus. Eram inocentes, não haviam cometido nenhum crime.
A atriz, para dramatizar seu texto, comparou as celas das prisões cariocas com a celas de Aushwitz e Treblinka. Ela escreve: "Mas bastaram 50 metros de caminhada naquela cela para experimentar a rotina de um barracão de Auschwitz, Treblinka, ou coisa que o valha."
Aushwitz não tinha barracões. Eram construções de alvenaria, sem água, sem aquecimento (no inverno polonês de 20 graus negativos), onde os judeus dormiam em beliches de três andares, com sete pessoas por “cama”. Talvez ela queria se referir a Birkenau ou Maydanek, onde haviam os barracões, mas que nem de longe poderiam ser comparados com as celas de um presidio da Cidade Maravilhosa. Treblinka nem tinha barracão, pois era um campo de extermínio onde 850.000 judeus, homens, mulheres e crianças, foram assassinados logo no desembarque dos trens.
Também não se pode comparar a “rotina de um barracão de Aushwitz ou Treblinka” com a de um presidio brasileiro. A rotina dos inocentes nos campos era aguardar a morte por inanição ou exaustão realizando trabalho escravo 12 horas por dia, praticamente sem comida. Nem a rotina de três refeições diárias, por pior que seja nos presídios nacionais, se compara a ração diária de Aushwitz, que era uma fatia de pão e uma cumbuca de água suja chamada de sopa.
Não acho que os criminosos que cumprem pena nos presídios do Rio de Janeiro mereçam viver naquelas condições, mas comparar a situação deles com a de inocentes durante o nazismo é de um tremendo mau gosto e imensa desinformação.
Acaba por macular a imagem dos seis milhões que morreram apenas por serem judeus e dos milhares que sobreviveram desses campos de trabalhos forçados e extermínio.
Vamos deixar as vítimas em paz.
Vamos deixar o assunto Holocausto para quem entende do tema.
Não vamos banalizar o mal.
P.S.: A Folha não quis publicar este comentário. Alegou falta de espaço.

4 comentários:

  1. O Holocaustro foi um horror, uma monstruosidade e crueldade sem limites, porém o maior crime cometido contra um POVO foi a escravidão e extermínio dos negros africanos por mais de 250 anos. Incomparavelmente a maior dívida da humanidade com um POVO.

    ResponderExcluir
  2. Desculpa, é Dimitri. Eu escrevi no facebook da Angela, pois foi lá que encontrei este blog. Perdão.

    ResponderExcluir
  3. Sabe, Dimitri, o holocausto foi o horror dos horrores, basta ler os experimentos de médicos pesquisadores nazistas, as atrocidades que faziam: testes em gêmeos, experimentos com venenos, agua do mar, água gelada, com regeneração, eugenia, fome, sede, dissecação de vivos. Quando eu li sobre estes experimentos chorei muito, pois sentia a dor profunda das cobaias vivas. Nunca li nada mais cruel. Como o ser humano atinge um nível tão alto de crueldade. Se não leu, leia... Vai chorar!

    ResponderExcluir