Largo Santo Antônio. Centro histórico de Salvador.
Com fina ironia, o arquiteto Will Marx, especializado em
reformar casas no centro histórico, assim definiu a total falta de pesquisa
quando a prefeitura de Salvador ou o Estado da Bahia resolvem “recuperar”
espaços públicos para lazer e descanso de crianças,
Que a obra aconteça na Pituba, na Ribeira ou no Santo
Antônio, as soluções são idênticas. A preocupação em harmonizar o casario
existente à volta da praça, sua história e caraterísticas, o perfil dos
usuários, nunca são levados em conta. Existe um só modelo que será reduzido ou
ampliado conforme o espaço disponível.
Esta ausência de contextualização se estende a muitos
paisagistas que atendem a uma clientela classe média alta, para quem a
referência sempre será a banalidade divulgada pelos enlatados de Hollywood.
Como peça principal, um gramado rodeado de árvores escolhidas preferencialmente
entre as que perdem pouca folha. No ano passado, tive um caso curioso com um
conhecido meu a quem oferecera duas palmeiras imperiais para o fundo de seu
quintal. A madame paisagista opôs um não radical argumentando a altura das
palmeiras! Se fossem baobás, ainda daria para entender.... Também recusou os
pés de pitanga e acerola que eu pretendia doar ao novo morador. Árvores
frutíferas não devem ser consideradas chique.
Em 2016, com excesso de mudas no meu jardim, resolvi anunciar
no Facebook uma semana de doações. Poucas pessoas entenderam minha proposta.
Uma sofisticada senhora mandou seu motorista pegar mudas. Nem obrigado. Um
sujeito pediu para eu despachar para Belo-Horizonte. Não falou em gastos. Um
casal veio, mais motivado pela curiosidade em ver a casa que em levar
plantinhas. Que não levaram. Duas irmãs me trataram com uma inquietante e
descabida altivez.
Muitos consideram árvores e plantas como algo inútil que
incomoda e suja. Preferem uma bela chapa de concreto, bem limpa e impermeável,
fácil de varrer e com alto potencial para microclima/micro-ondas.
O centro histórico de Salvador chora por mais verde, aquilo
que é em grande parte o charme de Olinda. Recentemente, moradores do bairro de
Santo Antônio receberam uns potes de concreto, incentivando o plantio de flores
et trepadeiras nos passeios e fachadas. Iniciativa louvável, mas insuficiente.
Posso delirar por um instante? Vejo uma fila dupla de palmeiras imperiais na
ladeira do Boqueirão, um belo flamboyant no largo do Carmo, pelo menos mais uma
dúzia de árvores no largo de Santo Antônio, um paisagismo consciente na encosta
que divide cidade alta e cidade baixa com muitas árvores frutíferas para manter
a fauna ainda sobrevivendo nesta área declarada “non aedificandi” por decreto
municipal...
...Sonho meu.
Dimitri Ganzelevitch
A Tarde 29/06/19
Nenhum comentário:
Postar um comentário