Istambul se
parece com Nápoles que se parece com Salvador. Igrejas ou mesquitas mil. Ao
fundo de qualquer beco, sempre o mar. Ilhas. Do Príncipe, Capri ou Itaparica. Lixo,
trânsito caótico, gritos, pivetes, buzinas e muita, muita identidade.
Sai,
maravilhado, do malcuidado Museu da Caligrafia. Estou com fome e não pretendo
sentar em mais uma destas armadilhas para turistas. Lá
vou eu descendo a ladeira após ter-me perdido, mais uma vez, ao atravessar o
labirinto do Grande Bazar. É uma rua bem popular. Centenas de lojinhas vendendo
geladeiras, frutas, livros, torneiras, kebab e calçados. O preço vai depender
de seu aspecto e de sua lábia. Tem muita lanchonete, muito restaurante. Torço o
nariz: um é muito escuro, outro não aparenta muita higiene...
Finalmente
um estabelecimento cuja entrada ostenta um imenso balcão frigorifico com uma bela
variedade de pratos. Vou poder escolher sem precisar falar. Sento numa mesa de
fórmica para quatro. Um casal já está sentado e, na minha frente uma senhora. O
garçom vem e algo me diz. Pânico! E agora?
“Ele
pergunta o que você quer beber” informa minha vizinha em perfeito inglês. Após
os tradicionais inícios – De onde é? Já esteve na Turquia antes? Quantos
dias? - a conversação toma outros rumos.
Observo discretamente que ela deve passar dos sessenta. Turca com certeza, mas
pelas feições, vinda de muito ao leste do país. Maçãs do rosto bem acentuadas,
nariz pequeno e reto, cabelo entre louro e branco, mãos finas acostumadas a
usar talheres com natural educação, vestida de forma tão elegante quanto
discreta. Fala com calma, adivinha-se que fora muito bonita, sedutora, com
forte personalidade.
Não estranha
eu vir do Brasil. Já estivera no Rio com o marido, arquiteto americano. Moraram
três anos em Marrakesh, doze nos Estados Unidos. O marido faleceu, os dois
filhos ficaram em Nova-Iorque. “Sou costureira. Já tive três ateliers. Um aqui,
outro em Antália e o terceiro em Ankara. Mas agora aos oitenta e três, não
quero mais correr. Só fiquei com o de Taxim”.
“Nasci neste
bairro, mas imagine que só hoje descobri uma rua que ainda não conhecia! Todas
as lojas vendem unicamente objetos de madeira. De palitos a armários. Você tem
que ir. Aliás, vamos sair juntos, eu lhe indico o caminho. ” Pequena, de corpo
esbelto, andava de passo firme. Parou numa esquina e me indicou: Esta é a rua.
Bom passeio! Antes que pudesse me despedir, ela tinha desaparecido na multidão tal
um leve perfume de verão.
Fiquei como
desequilibrado, frustrado com a fugacidade deste encontro. Tínhamos tecido, numa
hora de conversa, fios invisíveis unindo experiências e emoções semelhantes. Nossos
barcos, âncoras de vidro, balançaram ao ritmo das mesmas ondas...
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