Uma empresária acaba de descobrir o bairro de Santo Antônio. Existe há alguns séculos, mas virou moda nestes dez últimos anos. No embalo, ela imaginou trocar o nome da Rua dos Perdões para Beco do Santo Antônio, demostrando pouco entender de nomenclatura histórica.
Na primeira
metade do século passado, os governos encontraram na mudança das apelações de ruas,
praças e até cidades, uma forma de homenagear figuras, a maioria hoje
esquecidas. O Largo do Pelourinho virou José de Alencar, que era a favor da
escravidão. De Dois de julho o aeroporto mudou para o nome do filho de um
governador e até hoje governo nenhum – nem da oposição - ousou devolver o
título original. Em contrapartida o bom senso trocou a avenida “Rouba, mas faz’
para o mais nobre Milton Santos.
Nos anos 90,
o município decidiu reabilitar o nome original dos logradouros, as antigas
apelações sendo parte indissociável do patrimônio histórico. Quem ousaria
trocar a “Rua do Tira-Chapéu”, “...dos Carvões”; “...dos Ossos”, “... das
Laranjeiras”, a ”Ladeira do Baluarte”, “... da Poeira”, “... da Preguiça”, “...da
Água Brusca”? E “Lagoa do Abaeté” substituído por “Monte Santo”?!!
Infelizmente,
a burocracia não resolveu o mais incômodo: eliminar de vez os rebarbativos
nomes oportunistas para tornar a usar os tradicionais. A Rua Direita de Santo
Antônio continua, em muita papelada oficial, sendo Joaquim Távora. Como se não
bastasse, cada casa ostenta dois números: o antigo e o novo. Podem adivinhar as
cartas e cobranças que são extraviadas, as encomendas que nunca chegam, os
convidados que ficam zanzando durante horas e os táxis que abandonam a corrida.
Até em Paris
tentou-se a esperteza: reverenciar o general De Gaulle na Place que era de
l´Étoile, onde se encontra o Arco do Triunfo. Não vingou. Continua sendo
Étoile, a não ser no metrô onde se pode ler “Étoile-Charles De Gaulle”.
Existe uma
poesia pujante nas antigas apelações. Em janeiro fui passear durante uns dias
por Sergipe e Alagoas. Além do imenso prazer de descobrir pequenas joias bem
escondidas, olhando os mapas, me deixei seduzir por um rosário de títulos.
Citarei somente alguns: Ilha do Ferro, Pão de Açúcar, Olho D´Água Grande, Coité
do Noia, Porto Real do Colégio, Lagoa da Canoa, Olho D´Água das Flores, Ouro
Branco, Maravilha, Girau do Ponciano, Ilha das Flores, Areia Branca, Riachão do
Dantas, Itaperanga d´Ajuda, Lagarto... Augusto dos Anjos e João Cabral de Mello
Neto que se cuidem!
Assim que
vamos pedir a dinâmica senhora para deixar em paz os nomes do centro histórico.
Terá com certeza assuntos muito mais prementes a resolver, como, por exemplo, o
estacionamento das limusines dos fregueses e a segurança nesta muito estreita rua
que não é nenhuma Champs-Élysées.
Dimitri Ganzelevitch A Tarde, sábado 2 de abril 2022
E tem os nomes de ilustres desconhecidos, muito provavelmente familiares de quem já esteve nos governos locais ou nos legislativos. Milton Santos foi um movimento iniciado por um aluno da UFBA anos atrás e que sensibilizou milhares pessoas reunidas no Facebook para divulgar a causa. Recentemente a oportunidade foi capitalizada por um vereador. Ele levou os louros, mas tudo bem. Tem seu mérito.
ResponderExcluir