terça-feira, 27 de abril de 2021

A PROMESSA

Michael (Oscar Isaac) é um jovem armênio que sonha em estudar medicina, mas não tem dinheiro para arcar com os estudos. Por isso, ele promete se casar com uma garota de seu vilarejo, na intenção de receber o dote. Com o dinheiro em mãos, Michael viaja à Turquia e faz seus estudos durante os meses finais do Império Otomano. Neste contexto, conhece a armênia Ana (Charlotte Le Bon) e se apaixona, embora a professora namore o fotógrafo americano Chris (Christian Bale), enviado à Turquia para registrar o genocídio dos turcos contra a minoria armênia. Um triângulo amoroso se instaura em meio à guerra.



Em 1915, o Império Otomano (atual território da Turquia) deu início ao segundo maior genocídio de todos os tempos: o massacre de mais de um milhão de armênios. O crime foi motivado por questões étnicas, territoriais e religiosas, intensificando-se com a decisão dos otomanos em forçar as suas minorias étnicas a lutarem na Primeira Guerra Mundial, e em perseguir centenas de intelectuais armênios. Mas você não descobrirá nenhum destes complexos eventos históricos em A Promessa, épico romântico dedicado ao período.

O diretor Terry George preferiu simplificar os fatos através de duas ferramentas de apelo universal: o triângulo amoroso entre pessoas de bom coração e o maniqueísmo extremo. Na versão hollywoodiana deste holocausto, os turcos atacam porque são tiranos sanguinários, enquanto os armênios se sacrificam por serem realmente puros, e até certo ponto ingênuos. A visão do bem contra o mal soa equivocada para representar uma das maiores tragédias do século XX, especialmente quanto os armênios são vividos pelo guatemalteca Oscar Isaac, pela canadense Charlotte Le Bon e pela iraniana Shohreh Aghdashloo.

 

De modo geral, o filme troca as especifidades do evento por um pastiche indistinto da luta pela sobrevivência. O imaginário da vítima contra o algoz gera fácil identificação, mas poderia ser aplicado a milhares de outras tramas. O resultado, ironicamente, deve incomodar os dois lados da questão: os turcos vão detestar se ver como vilões impiedosos, enquanto os armênios podem protestar contra o retrato paternalista desenvolvido por não-armênios. Se a intenção é dar voz aos protagonistas do genocídio, não seria fundamental fazer apelo à tudo que aquela cultura possui de mais único? Ao seu povo? Temos um elenco comprometido e imagens luxuosas, mas era esta a prioridade correta?


O cineasta prefere apelar ao heroísmo: para disputar o coração da mocinha - uma mulher que cuida dos homens quando estão feridos e carrega órfãos em seus braços - entram em cena um armênio (Isaac) e um americano (o britânico Christian Bale), representando a valentia de seus respectivos povos. Isaac tem direito a meia dúzia de cenas de coragem, incluindo resgates em alto mar, libertação de prisioneiros num trem em movimento e defesa de um colega ferido, explorado pelos turcos na guerra. Bale desafia os generais, os pequenos líderes locais e aproxima-se das cidades mais perigosas para registrar os crimes para a posteridade. Ambos são ótimos profissionais, munidos pelo amor à mesma mulher e à libertação dos oprimidos.

 

Para vender sua mensagem tão importante quanto genérica (“A guerra é ruim, a paz é boa”) o projeto apela ao gigantismo kitsch. São centenas de cenas, de acessórios, de figurinos, de figurantes e de cenários paradisíacos (alguns deles em tela verde) filmados em câmera aérea e gruas. A trilha sonora insiste no melodrama e na vilania, na luz e nas trevas. A iluminação busca o pôr do sol e as noites estreladas, além da textura excessivamente nítida. Todas as grandes virtudes humanas (amor, coragem, piedade, compaixão, perseverança, humildade etc.) são retratadas com tamanha autoimportância que beiram a paródia. A Promessa parte de um tema importantíssimo, merecedor de um posicionamento claro, para oferecer um filme inchado, longo, antiquado em sua forma e perigosamente genérico.

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