Nunca vi esta problemática tão bem explanada desde a monumental obra “A era do vazio” do Gilles Lipovetsky (Manuel Tavares).
“O QI médio da população mundial, que sempre aumentou desde o pós-guerra até o final dos anos 90, diminuiu nos últimos vinte anos …É a inversão do efeito Flynn.
Parece que o nível de inteligência medido pelos testes diminui nos países mais desenvolvidos.Pode haver muitas causas para esse fenômeno.
Um deles pode ser o empobrecimento da linguagem. Na verdade, vários estudos mostram a diminuição do conhecimento lexical e o empobrecimento da linguagem: não é apenas a redução do vocabulário utilizado, mas também as sutilezas linguísticas que permitem elaborar e formular pensamentos complexos. O desaparecimento gradual dos tempos (subjuntivo, imperfeito, formas compostas do futuro, particípio passado) dá origem a um pensamento quase sempre no presente, limitado ao momento: incapaz de projeções no tempo.
A simplificação dos tutoriais, o desaparecimento das letras maiúsculas e da pontuação são exemplos de “golpes mortais” na precisão e variedade de expressão. Apenas um exemplo: eliminar a palavra “signorina” (agora obsoleta) não significa apenas abrir mão da estética de uma palavra, mas também promover involuntariamente a ideia de que entre uma menina e uma mulher não existem fases intermediárias. Menos palavras e menos verbos conjugados significam menos capacidade de expressar emoções e menos capacidade de processar um pensamento.
Estudos têm mostrado que parte da violência nas esferas pública e privada decorre diretamente da incapacidade de descrever as emoções em palavras. Sem palavras para construir um argumento, o pensamento complexo torna-se impossível. Quanto mais pobre a linguagem, mais o pensamento desaparece. A história está cheia de exemplos e muitos livros (Georges Orwell – “1984”; Ray Bradbury – “Fahrenheit 451”) contam como todos os regimes totalitários sempre atrapalharam o pensamento, reduzindo o número e o significado das palavras.
Se não houver pensamentos, não há pensamentos críticos. E não há pensamento sem palavras. Como construir um pensamento hipotético-dedutivo sem o condicional? Como pensar o futuro sem uma conjugação com o futuro? Como é possível captar uma temporalidade, uma sucessão de elementos no tempo, passado ou futuro, e sua duração relativa, sem uma linguagem que distinga entre o que poderia ter sido, o que foi, o que é, o que poderia ser, e o que será depois do que pode ter acontecido, realmente aconteceu?
Caros pais e professores: Façamos (“fazemos” na tradução brasileira) com que nossos filhos, nossos alunos falem, leiam e escrevam. Ensinar e praticar o idioma em suas mais diversas formas. Mesmo que pareça complicado. Principalmente se for complicado. Porque nesse esforço existe liberdade. Aqueles que afirmam a necessidade de simplificar a grafia, descartar a linguagem de seus “defeitos”, abolir gêneros, tempos, nuances, tudo que cria complexidade, são os verdadeiros arquitetos do empobrecimento da mente humana.
Não há liberdade sem necessidade. Não há beleza sem o pensamento da beleza.
Christophe Clavé
Perfeita abordagem, meu amigo! Escrevi uma monografia em Ciências Criminais, titulada "Poderes da Linguagem: um Instrumento de Política Criminal" (2006), que toca em alguns pontos deste texto, relacionando a dificuldade de comunicação com a marginalização, o conflito e a violência, ao tempo em que demonstra a necessidade do Estado investir no desenvolvimento da sua própria comunicação com a sociedade e da capacidade comunicativa dos indivíduos de integrarem a dinâmica da sociedade através da linguagem como um precioso recurso de política criminal, pacificação e inclusão social.
ResponderExcluirSoube que nos dias atuais não se estuda mais os tempos verbais, tampouco as 6 pessoas, dizem que não há necessidade, se não se fala mais daquele jeito!!! Os jovens são incapazes de recitar as tábuas verbais. Eu tinha sabatinas em classe! Ai de quem não soubesse!!!
ResponderExcluirCada vez se escreve menos no WhatsApp e usa-se mais a mensagem de voz. Nos e-mails já vêm as resposta bastando clicar: "Recebido", "Obrigado", "Não obrigado" etc O Tweeter tem número de palavras limitadas e presidentes, como Trump e Bolsonaro, governam por esta mídia.
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