A Espanha
deixou de herança para a América Hispânica a cultura da praça municipal
chamada, conforme o país, Plaza Maior, Zócalo ou Plaza de Armas. Um grande
retângulo formado por edifícios elegantes encabeçados pela igreja ou
governadoria. Ou ambos. No meio, árvores sombreiam bancos públicos e o
incontornável coreto que nenhuma administração ousaria derrubar sob pretexto de
modernização.
É justamente
num daqueles bancos de ferro fundido, ostentando as armas da cidade que sentei
para observar o povo passeando numa manhã de domingo no zócalo de Mérida.
Cheguei no México no último dia de outubro para mergulhar no Dia dos Finados em
Cuernavaca, hospedado por Maurício Maillé, hoje responsável pela prestigiosa coleção
de arte contemporânea da Televisa. Entre outras recomendações, nunca-jamais
comer na rua. Males terríveis me aguardam, podendo até virar jacaré. Durante
quase um mês andei um pouco ao acaso, sem agenda nem pressa. No Yucatan ziguezagueei
de Campeche a Chichen Itza e de Valladolid a reserva de Celestun com seus
pelicanos, fragatas, íbis, garças, alcatrazes e os famosos, magníficos
flamengos rosa, aos milhares.
Hoje deve
ser dia de festa. Gente entrando e saindo da catedral. Crianças correndo, mães
caprichosamente vestidas com seu mais belo huipil branco bordado de flores,
longa e pesada trança nas costas. Estou em terra maia. Povo baixo e forte, de
traços generosos. Durante a noite, barracas foram montadas à volta da praça. Um
grupo de mariachi, camisa branca e calça preta costurada a ouro, afina seus
instrumentos. Chegou a hora do rango e eu com fome começando a rondar as
barracas. Afinal, sempre gostei de comida de rua, seja em Damasco, Salvador, ou
Bogota e nunca fiquei doente. Porque resistiria a tão convidativo perfume? Sento
no banco de uma longa mesa ocupada por alegres nativos. Peço um tamal. Mas
minha presença logo foi criando um silêncio. Não passo de gringo turista. Fazer
o quê? O tamal vem quentinho na sua folha de bananeira, primo direto de nosso
abará, só que de milho em vez de feijão. É uma viagem ao mundo encantado da
gula. Impossível resistir a um segundo. De repente a mesa inteira, até então
emudecida, se anima, sorri. Uma vizinha me pergunta: “Le gustó nuestro tamal? ”.
Pronto! Fui adotado. Gostam de saber que não sou ianque. Agora o diálogo irá
correndo fácil. As trombetas do mariachi tocam Amor Eterno.
Dimitri Ganzelevitch
A Tarde, sábado 16 de outubro 2021
Comi muchos tamales en el Peru, en donde vivi seis meses. Hay tamales dulces y salados y la hoja del platano tiene un olor y sabor inolvidable. Gracias por me recordar el sabor de los tamales.
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