Azulejos históricos se esfarelam em Salvador e igreja pede ajuda
JOÃO PEDRO PITOMBO
SALVADOR
O Arco do Triunfo da rua Augusta, que ergue-se imponente no centro de Lisboa, é um marco da grandiosidade de Portugal no século 18.
Assim como ele, havia outros 11 arcos semelhantes na capital portuguesa. Todos viraram história: foram destruídos por um terremoto que devastou Lisboa em 1755.
Essa Lisboa pré-terremoto, conhecida por poucos, pode ser vista no conjunto de painéis de azulejos portugueses do século 18 que ornam a igreja da Ordem Terceira de São Francisco, no Centro Histórico de Salvador. Mas esse pedaço da história, mais uma vez, começa a virar pó.
No mesmo estado de abandono está o conjunto vizinho da igreja e convento de São Francisco
As peças, que somam 85 m² de pinturas, estão esfarelando. Sem receber manutenção há mais de 15 anos, os azulejos estão descascados em diversos pontos por ação do sol, do salitre e de infiltrações nas paredes.
Responsável pela administração e conservação da igreja, tombada pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) desde 1939, a Ordem Terceira de São Francisco afirma não possuir recursos para o restauro. "É um tesouro secular que está se perdendo. Precisamos de ajuda", afirma Jayme Baleeiro Neto, diretor executivo da Ordem.
Ele diz que entrou em contato com o Iphan em 2015 para alertar sobre a situação, mas não obteve resposta. O órgão federal informa que nenhum pleito para recuperação foi feito. A igreja da Ordem Terceira também não consta em nenhum dos programas tocados pelo Iphan, como o PAC Cidades Históricas.
Trazidos de Lisboa, os painéis retratam, como em capítulos, a passagem pelas ruas da capital portuguesa em 1729 do cortejo do casamento de dom José 1º, futuro rei, com Mariana Vitória de Bourbon e Farnésio, selando uma aliança entre Portugal e Espanha.
Os azulejos chegaram a ser recuperados entre 1998 e 2000, com o apoio da Fundação Ricardo do Espírito Santo, de Portugal. As peças, contudo, voltaram a se desgastar, pois não foi feita a impermeabilização das paredes.
TESOUROS ESCONDIDOS
Inaugurada em 1703, a igreja da Terceira Ordem de São Francisco é uma das mais importantes do conjunto arquitetônico do Centro Histórico de Salvador, considerado Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco.
Foi erguida pelos franciscanos no Terreiro de Jesus, coração do Pelourinho. Junto com o Convento da Ordem Terceira de São Francisco, que fica ao lado, forma um dos conjuntos monumentais mais importantes do país.
Além das peças da igreja e do convento, outros prédios da Ordem precisam de reparos. O Lar Franciscano está com a fachada desgastada e carece de um novo telhado.
Com 382 anos de história e atualmente formada por cerca de 90 fiéis leigos franciscanos, a Ordem Terceira sobrevive do aluguel de 140 imóveis que possui em Salvador, da administração de um cemitério e do ingresso de R$ 5 que cobra para visitação da igreja e do museu anexo.
Com o dinheiro, paga os salários de 80 funcionários que emprega entre igreja, cemitério e o Lar Franciscano, que dá assistência a 90 idosos.
A prioridade da Ordem, contudo, é recuperar a igreja de São Francisco, sua joia da coroa. Além dos seus painéis em azulejo, o templo possui importância histórica e arquitetônica por sua fachada barroca com peças em alto-relevo que remetem ao estilo arquitetônico plateresco do renascentismo espanhol.
O prédio abriga ainda outras preciosidades, como uma pia usada pelos padres que foi trazida de Macau, então colônia portuguesa, em 1720. A peça, que quebrou durante a viagem de navio e levou dois anos para ser remontada na capital baiana, é decorada com temas da cultura chinesa, como dragões.
A igreja também possui um órgão de tubos de 1830 que está quebrado desde 1936. De acordo com um especialista, 350 peças precisam ser trocadas para que o órgão volte a funcionar. E o mais desolador: em 2017, não há franciscano da Ordem Terceira que se arrisque a tocá-lo.
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