quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

COMPRARAM DEPUTADOS

Mineradoras bancaram 102 deputados eleitos por Minas Gerais em 2014


Dinheiro do setor irrigou campanha de oito em cada dez parlamentares


Assembleia Legislativa de Minas Gerais

O BEM EDUCADO E A MADRASTA

EL PAÍS

Receita vai fazer pente-fino em contas de Flávio Bolsonaro e da primeira-dama

Investigação se baseou em apuração no Rio de Janeiro, que vai analisar as declarações fiscais de outros 26 deputados estaduais


O deputado Flávio em outubro, no Rio.

Receita Federal vai se debruçar nas próximas semanas sobre as declarações de bens de 27 deputados estaduais e 75 funcionários e ex-servidores da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Entre os parlamentares investigado está o deputado Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), e senador eleito. A abertura de apuração ocorreu depois que Flávio, em entrevistas, passou a justificar que a sua atípica movimentação financeira aconteceu porque ele comprou e vendeu um imóvel. O parlamentar recebeu 96.000 reais em depósitos fracionados de 2.000 reais, além do pagamento de um título bancário da Caixa no valor de 1 milhão de reais. Uma reportagem da Folha de S. Paulo detalhou a movimentação patrimonial dele envolvendo a compra e venda de outros 18 apartamentos e salas comerciais entre os anos de 2005 e 2018.

Segundo reportagem do jornal Valor Econômico, a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, também terá suas contas averiguadas. A razão é que ela recebeu 24.000 reais em depósitos feitos por Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio

quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

A MORTE DOS IRMÃOS DE LULA



Lula ignorou enterros 

de irmãos enquanto 

esteve solto, até como 

presidente

Pedido para ir ao sepultamento de Vavá deve ser para dar um rolê
Ao contrário do que faz parecer em seu novo pedido à Justiça para ser autorizado 
a comparecer ao enterro do irmão Genivaldo Inácio da Silva, o Vavá, falecido de 
câncer nesta terça (29), o ex-presidente e presidiário Lula nunca foi a sepultamento 
de um irmão enquanto esteva solto e até mesmo no exercício da presidência da República.
Como lembrou o jornalista Cláudio Humberto, do Diário do Poder, em sua coluna 
de 27 de dezembro passado, Lula já era presidente quando, em 2004, nem sequer 
foi ao velório e tampouco ao sepultamento do irmão João Inácio, que faleceu vítima de câncer.
Em janeiro de 2005, Lula também não compareceu ao enterro de outro irmão, 
Odair Inácio de Góis, que morreu após um ataque cardíaco.
Essa discussão foi suscitada por ocasião do falecimento do advogado Luiz Carlos Sigmaringa Seixas, 
quando o presidiário pediu autorização pela primeira vez para ir ao sepultamento, em Brasília. 
Se não foi aos enterros dos próprios irmãos, Lula também nunca foi de confortar familiares 
de amigos falecidos. Quando em 2013 morreu o velho amigo Jorge Ferreira, dono de bares e 
restaurantes em Brasília e muito mais ligado a ele que Sigmaringa, Lula ignorou o enterro.
Como presidente, não gostava nem mesmo de sobrevoar áreas vitimadas por desastres naturais, 
como inundações e deslizamentos. Em 2010, com isopor na cabeça, Lula não saiu da praia 
da base naval de Aratu, na Bahia, para visitar ou ao menos sobrevoar área de deslizamento 
no Estado do Rio que matou dezenas de pessoas. 
Um avião da TAM caiu em Congonhas, matando 199, em 2007. Lula jamais visitou o local 
e só anos depois receberia familiares das vítimas.

CLAIR DE LUNE

OS SINAIS DA BARRAGEM

Barragem dá sinais antes de romper, diz presidente da Federação Brasileira de Geólogos


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Na imagem acima, vista aérea da região afetada pelo rompimento da barragem I da Mina do Café, em Brumadinho (MG), captada durante sobrevôo em helicóptero do presidente Jair Bolsonaro em 26 de janeiro. Foto: Isac Nóbrega/Presidência da República..



A alta mortandade do desastre em Brumadinho (MG) resultou de erros no monitoramento da Barragem I da mina do Córrego do Feijão, que rompeu na última sexta-feira (25), segundo Fábio Augusto Reis, professor do Departamento de Geologia Aplicada do câmpus de Rio Claro da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e Presidente da Federação Brasileira de Geólogos (Febrageo). 

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UMA GRANDE NOTÍCIA!

Record é condenada a exibir 16 programas de religiões de matriz africana em horário nobre

Depois de 14 anos de batalha judicial, a Rede Record de Televisão perdeu um recurso na Justiça Federal de São Paulo e será obrigada a exibir 16 programas na TV em horário nobre feitos por entidade ligada a religiões de matriz africana. A emissora ainda tem direito de recorrer em tribunais superiores. Consultada, a Record, por intermédio da assessoria de imprensa, informou que não comentaria o resultado judicial.
A decisão veio por unanimidade na 9º Turma Recursal do Tribunal Regional Federal de São Paulo, na última quinta (5 de abril). O processo movido pelo Ministério Público Federal atendeu a uma ação de 2004 da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão em São Paulo, juntamente com o Centro de Estudos das Relações de Trabalho e da Desigualdade (CEERT) e pelo Instituto Nacional de Tradição e Cultura Afro Brasileira (Intercab).
Os autores alegaram na ação que as religiões afro-brasileiras “vêm sofrendo constantes agressões” em programas veiculados na Record. A Constituição Federal proíbe a demonização de religiões por adeptos de outras crenças. Os autores citaram ofensas veiculadas no programa “Mistérios”, no quadro “Sessão de descarrego” e ainda no livro “Orixás, Caboclos e Guias, Deuses ou Demônios”, de Edir Macedo.
Na prática, foi mantida a decisão de primeira instância, que já havia determinado a transmissão de programas de uma hora e que devem ser gravados dentro do estúdio da própria emissora. O juiz determinou que serão 16 programas vinculados durante 16 dias seguidos no horário nobre com três chamadas diárias. E com a gravação dos programas nos estúdios na própria emissora em São Paulo.

A MILÍCIA É O ESTADO!

“No Rio de Janeiro a milícia não é um poder paralelo. É o Estado”

Sociólogo que estuda as milícias há 26 anos explica as relações entre legisladores e milicianos

Boxes de camelódromo que seriam de milícia foram fechados por ação da Prefeitura do Rio em abril de 2018.
Boxes de camelódromo que seriam de milícia foram fechados por ação da Prefeitura do Rio em abril de 2018.  AGÊNCIA BRASIL


Na semana passada, a operação “Os Intocáveis” prendeu integrantes da milícia que opera em Rio das Pedras, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Um dos alvos da operação foi o ex-capitão da PM Adriano Magalhães da Nóbrega, acusado de chefiar a milícia de Rio das Pedras e integrar o grupo de extermínio Escritório do Crime — atualmente investigado pela morte de Marielle Franco. Sua mãe e sua esposa já trabalharam no gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Flávio também havia homenageado Adriano com a Medalha Tiradentes, a maior honraria concedida pela Alerj.
Mas a notícia não surpreendeu o autor do livro Dos Barões ao extermínio: a história da violência na Baixada Fluminense, José Cláudio Souza Alves. Sociólogo e ex-pró-reitor de Extensão da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), José Cláudio estuda as milícias há 26 anos. Em entrevista à Pública, ele resume, com veemência: “A milícia é o Estado.”
“São formadas pelos próprios agentes do Estado. É um matador, é um miliciano que é deputado, que é vereador. É um miliciano que é Secretário de Meio Ambiente. Sem essa conexão direta com a estrutura do Estado não haveria milícia na atuação que ela tem hoje,” acrescenta.
Segundo José Cláudio, é comum familiares de milicianos serem empregados em gabinetes de deputados e vereadores. “Isso é muito comum. Esse vínculo lhe dá poder naquela comunidade. Ele vai ser chamado agora na comunidade: ‘Olha é o cara que tem um poder junto lá ao deputado, qualquer coisa a gente resolve, fala com ele, que ele fala com a mãe e com a esposa e elas falam diretamente com o Flávio e isso é resolvido’”.
Nessa entrevista, ele explica a origem desses grupos e suas ligações com a política: “Cinco décadas de grupo de extermínio resultaram em 70% de votação em Bolsonaro na Baixada”.
Leia os principais trechos.
Pergunta. Como nasceram as milícias do Rio de Janeiro?
Resposta. Isso estourou na época da ditadura militar com muita força. Em 1967 surge a Polícia Militar nos moldes atuais, de força ostensiva e auxiliar aos militares naquela época. E a partir daí há o surgimento dos esquadrões da morte. No final dos anos 1960, as milícias surgiram como grupos de extermínio compostos por Policiais Militares e outros agentes de segurança que atuavam como matadores de aluguel.
Esses esquadrões da morte vão estar funcionando a pleno vapor nos anos 1970. Depois começa a surgir a atuação de civis como lideranças de grupos de extermínio, mas sempre em uma relação com os agentes do Estado. Isso ao longo dos anos 1980. Com a democracia, esses mesmos matadores dos anos 1980 começam a se eleger nos anos 1990. Se elegem prefeitos, vereadores, deputados.
Segundo José Cláudio, sociólogo e ex-pró-reitor de Extensão da UFRRJ, é comum familiares de milicianos serem empregados em gabinetes de deputados e vereadoresDe 1995 até 2000, você tem o protótipo do que seriam as milícias na Baixada, Zona Oeste e no Rio de Janeiro. Elas estão associadas a ocupações urbanas de terras. São lideranças que estão emergindo dessas ocupações e estão ligadas diretamente à questão das terras na Baixada Fluminense. A partir dos anos 2000, esses milicianos já estão se constituindo como são hoje. São Policiais Militares, Policiais Civis, bombeiros, agentes de segurança, e atuam em áreas onde antes tinha a presença do tráfico, em uma relação de confronto com o tráfico. Mas ao mesmo tempo estabelecem uma estrutura de poder calcado na cobrança de taxas, na venda de serviços e bens urbanos como água, aterro, terrenos.

Segundo José Cláudio, sociólogo e ex-pró-reitor de Extensão da UFRRJ, é comum familiares de milicianos serem empregados em gabinetes de deputados e vereadores
 P. Há apoio da população às milícias?
R. A milícia surge com o discurso que veio para se contrapor ao tráfico. E esse discurso ainda cola. Só que com o tempo a população vai vendo que quem se contrapõe a eles, eles matam. E eles passam a controlar os vários comércios. Então a população já começa a ficar assustada e já não apoia tanto. É sempre assim a história das milícias.
P. Qual a história de Rio das Pedras?
R. Rio das Pedras é uma comunidade em expansão onde vivem nordestinos muito pobres. Existem terrenos lá que você não pode construir porque são inadequados, são muito movediços. Então só tem uma faixa específica de terra onde você pode construir. São terras irregulares, devolutas da União, ou terras de particulares que não conseguiram se manter naquele espaço. Então a milícia passa a controlar, toma e legaliza — às vezes até via Prefeitura mesmo, pagando IPTU desses imóveis. Como o sistema fundiário não é regulado, facilmente os milicianos têm acesso a informações e vão tomar essas áreas. E passam a vendê-las.
P. Rio das Pedras foi a primeira milícia do Rio?
R. Não é bem assim. Ao meu ver a milícia surgiu em diferentes lugares ao mesmo tempo, simultaneamente. Então tem Rio das Pedras, mas tem Zona Oeste do Rio e tem, por exemplo, Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.
Eu percebo dos anos 1995 a 2000, grosso modo, um período de emergência dessas ocupações urbanas de terras, ainda não no protótipo de milícias, mas com lideranças comunitárias próximas ao que seria um controle pela violência, um controle político mais autoritário.
Só que Rio das Pedras ela emerge mais rapidamente. Então ali começa esse vínculo da cobrança de taxa, que nas outras ainda não tinha. E são os comerciantes que pagam a eles.
É uma comunidade miserável, empobrecida, que está se constituindo a partir de uma rede migratória de nordestinos. E ela fica diante de um grupo de milicianos que estão sendo chamados para dar proteção, impedir que o tráfico entre. Mas na verdade é para proteger os interesses comerciais desses lojistas que estão se instalado lá em Rio das Pedras e estão financiando esses caras.
P. Hoje são quantas as milícias do Rio de Janeiro?
R. Eu tenho noção de que são muitas. Por exemplo, são várias que atuam em São Bento e no Pilar, que é o segundo maior distrito de Duque de Caxias. Tem em Nova Iguaçu, tem em Queimada. Praticamente cada município da Baixada Fluminense você tem a presença de milícias. Seropédica, por exemplo, hoje é uma cidade dominada por milicianos. Eles controlam taxas de segurança que cobram do comércio. Aqui tem os areais, de onde se extrai muita areia — e muitos são clandestinos. Então eles também cobram dali. Moto-táxi tem que pagar 80 reais por semana para funcionar. Pipoqueiro paga 50 reais por semana. É uma loucura.
Dizem que é para a segurança, proteção, eles estão supostamente protegendo esse comércio. Mas depois controlam a distribuição de água, de gás, de cigarro, de bebida. E há histórias de assassinato de gente que não aceitou, por exemplo.
Além disso, eles são pagos para fazer execuções sumárias. Então há um mercado que movimenta milhões já há algum tempo.
Eles também lidam com tráfico de drogas, com algumas facções especificas. O Terceiro Comando Puro funciona aqui em algumas cidades da baixada a partir de acordos com milicianos. Eles fazem acordo com o tráfico e vão ganhar dinheiro também disso. Cobram aluguel de áreas. É a mesma relação que a polícia tem com o tráfico: só funciona ali se você pagar suborno.
P. Na cobertura feita pelos jornais sobre a operação “Os Intocáveis”, eles citam o Escritório da Morte, um grupo de extermínio que é contratado para matar. Isso é comum?
R. Sim. Nunca ouvi falar de milícia que não tivesse a prática de execução sumária. Normalmente a milícia tem uma equipe ou um grupo responsável por execuções sumárias. O comerciante que não quiser pagar, o morador que não se sujeitar a pagamento do imóvel que ele comprou, qualquer negócio e discordância com os interesses da milícia, esse braço armado é acionado e vai matar.
A novidade da milícia é o leque de serviços que eles abrem além da execução sumária e da segurança. Aí é tudo: água, botijão de gás, “gatonet”, transporte clandestino de pessoas, terra, terrenos, imóveis. A milícia não fica agora fixa em grandes comerciantes ou grandes empresários. Ela pulveriza isso. Eles vão sofisticando também na administração do gerenciamento.
P. Em que outros negócios ilegais os milicianos atuam?
R. Lá em Duque de Caxias eles roubam petróleo dos oleodutos da Petrobras e fazem mini destilarias nas casas das pessoas. Tudo ilegal, com um risco imenso. Aí vendem combustível adulterado. Eles fazem aterros clandestinos no meio daquela região com dragas e tratores e vão enterrando o lixo de quem pagar. É 1.000 reais por caminhão. Não importa a origem. Pode ser lixo contaminante, lixo industrial, lixo hospitalar. Eles fazem aterros clandestinos nesta região.
P. A milícia tem controle também sobre bens públicos, como aterros, e eles se apropriam desses espaços para fazer atividades ilegais…
R. A base de uma milícia é o controle militarizado de áreas geográficas. Então o espaço urbano, em si se transforma em uma fonte de ganho. Se você controla militarmente, com armas por meio da violência esse espaço urbano, você vai então ganhar dinheiro com esse espaço urbano. De que maneira? Você vende imóveis. Por exemplo, você tem um programa do governo federal chamado Minha Casa Minha Vida. Você constrói habitações. Aí a milícia vai e controla militarmente aquela área e vai determinar quem é que vai ocupar a casa. E inclusive vai cobrar taxa desses moradores.
Em outra área eles estão vendendo imóveis e estão ganhando dinheiro com essa terra, que é terra da União ou terra de particulares. Então esse controle militarizado desses espaços, é a base da milícia. Aí como eles sabem dessas informações? Eles sabem dentro da estrutura do Estado.
Você pode ter um respaldo político para fazer isso. Vou dar um exemplo para você. Em Duque de Caxias, um número razoável de escolas públicas não é abastecido pelo sistema de água da CEDAE. A água não chega lá. Como que essas escolas funcionam? Elas compram caminhões pipa de água. Quem é o vendedor? Quem é que ganhou a licitação para distribuição de água em um preço absurdo por meio desses caminhões pipa? Gente ligado aos milicianos. Então aí você tem um vínculo com os serviços públicos — e é uma grana pesada — a que passa pelo interesse político daquele grupo dentro daquela prefeitura que vai se beneficiar de uma informação e vai ganhar dinheiro com isso.
A Baixada e o Rio de Janeiro são grandes laboratórios de ilicitudes e de ilegalidades que se associam para fortalecer uma estrutura de poder político, econômico, cultural, geograficamente estabelecido e calcado na violência, no controle armado.
P. A milícia surgiu no Rio de Janeiro pela ausência do Estado?
R. Há uma continuidade do Estado. O matador se elege, o miliciano se elege. Ele tem relações diretas com o Estado. Ele é o agente do Estado. Ele é o Estado. Então não me venha falar que existe uma ausência de Estado. É o Estado que determina quem vai operar o controle militarizado e a segurança daquela área. Porque são os próprios agentes do Estado. É um matador, é um miliciano que é deputado, que é vereador, é um miliciano que é Secretário de Meio Ambiente.
Eu sempre digo: não use isso porque não é poder paralelo. É o poder do próprio Estado.
Eu estou falando de um Estado que avança em operações ilegais e se torna mais poderoso do que ele é na esfera legal. Porque ele vai agora determinar sobre a sua vida de uma forma totalitária. E você não consegue se contrapor a ela.
P. Mas, por outro lado, quem elege os políticos milicianos é a população….
R. Não venha dizer que o morador é conivente, é cúmplice do crime. Esse pessoal elegeu o Flávio Bolsonaro, que agora se descobriu que ele tem possivelmente vínculos com esses grupos? Elegeu. Mas que condições que essas pessoas vivem para chegar nisso? Essas populações são submetidas a condições de miséria, de pobreza e de violência que se impõem sobre elas.
Cinco décadas de grupo de extermínio resultaram em 70% de votação em Bolsonaro na Baixada.
Três gestões do PT no governo federal, 14 anos no poder, não arranharam essa estrutura. Deram Bolsa Família, vários grupos políticos se vincularam ao PT e se beneficiaram, mas o PT não alterou em nada essa estrutura. O PT fez aliança eleitoral, buscou apoio desses grupos.
P. Como você mencionou a história do Flávio Bolsonaro: o que liga o gabinete de um político a um miliciano, como foi no caso dele com a mãe e a esposa do Adriano Magalhães da Nóbrega?
R. O discurso da família Bolsonaro, a começar pelo pai já há algum tempo, e posteriormente o pai projetando nos filhos politicamente. Eles são os herdeiros do discurso de um delegado Sivuca [José Guilherme Godinho Sivuca Ferreira, eleito deputado federal pelo PFL em 1990], que é o cara que cunhou a expressão “Bandido bom é bandido morto”, de um Emir Larangeira [eleito deputado estadual em 1990], do pessoal da velha guarda, do braço político dos grupos de extermínio.
Esse discurso se perpetuou e se consolidou. É claro que os milicianos vão respaldar esse discurso e vão se fortalecer a partir dele. É o plano de segurança pública defendida na campanha eleitoral do Bolsonaro. Ele diz o seguinte: Policiais Militares são os heróis da nação. Policial Militar tem que ser apoiado, respaldado, vai ganhar placa de herói.
E será respaldado pela lei, através do excludente de ilicitude. Está lá no programa do Bolsonaro. Então você tem setores que desde a ditadura militar sempre operaram na ilegalidade, na execução sumária, vão escutar esse discurso. É música para o ouvido deles.
Não é à toa que o Flávio Bolsonaro fez menções na Assembleia legislativa, deu honrarias para dois desses milicianos presos.
P. Para além desse discurso simbólico, você vê também uma ligação financeira dos milicianos com os políticos?
R. Você tem uma operação por dentro da estrutura oficial política. Por exemplo, em Duque de Caxias você tem registro geral de imóveis de terra que são da União. Tem milicianos que vão levantar no cadastro geral de imóveis da prefeitura, os imóveis que estão irregulares, sem pagamento há muito tempo de IPTU. Esse miliciano começa a pagar o IPTU, parcela a dívida, quita e pede para transferir para o nome dele aquele imóvel. A prefeitura transfere. É um processo simples isso. Aí depois aquele proprietário não vai ter nunca coragem de exigir aquele imóvel de volta, porque está controlado militarmente.
Sem esses elementos, sem esses indivíduos, sem essa conexão direta com a estrutura do Estado, não haveria milícia na atuação que ela tem hoje. É determinante. Por isso que eu digo, que não é paralelo, é o Estado.
E tem políticos que estão sendo eleitos com essa grana. A grana da milícia vai financiar o poder de um político como Flávio Bolsonaro e o poder político de um Flávio Bolsonaro vai favorecer o ganho de dinheiro do miliciano. Isso roda em duas mãos. É determinante então que essa estrutura seja assim. Ela só se perpetua porque é assim.
P. É comum casos como a mãe e a esposa de Adriano Magalhães de Nóbrega, que foram contratadas como assessoras no gabinete de Flávio Bolsonaro?
R. Sim. Isso é muito comum. Você cria um vínculo de poder e de grana com essas pessoas. Esse cara, a partir de sua esposa e de sua mãe, cria um vínculo imediato com o Flávio Bolsonaro e isso lhe dá força. Essas duas pessoas estão fazendo um elo imediato, pessoal, familiar do Adriano com Flávio Bolsonaro. Esse vínculo lhe dá poder naquela comunidade. Ele vai ser chamado agora na comunidade “Olha é o cara que tem um poder junto lá ao deputado, qualquer coisa a gente resolve, fala com ele, que ele fala com a mãe e com a esposa e eles falam diretamente com o Flávio e isso é resolvido”.
Assim você está criando uma estrutura de poder, que é familiar. Veja bem: é o que eles defendem. Eles [os Bolsonaro] defendem a estrutura familiar. E se você investigar um pouco mais vai ser religioso também. São igrejas evangélicas, eles têm vínculo com essa estrutura. Então é uma estrutura perfeita, ela é tradicional, conservadora, ela tem a linguagem religiosa, que é linguagem de grande credibilidade.
Isso também demonstra uma forma de atuar dessas pessoas. Eles não atuam pelo ocultamento. O Adriano, Flávio Bolsonaro, o próprio Bolsonaro, os matadores da Baixada. Todos esses grupos que lidam com a violência, com a execução sumária, com o crime organizado, eles não atuam com baixo perfil.
No Brasil o que você tem é a superexposição. Eu chego e já digo. “Eu sou o cara, eu sou o matador, eu tenho vínculos com fulano, beltrano e sicrano. Eu ocupo este cargo”. Que é pra deixar bem claro se você for tentar alguma coisa é isso que você vai enfrentar.
É a base total do medo. E não é só do medo: é real.
P. Sobre esse capital político, eles têm o poder inclusive de manipular o voto da população durante o período das eleições? Existe uma rede organizada para isso?
R. Na verdade, as milícias vendem votações inteiras de comunidade. Aqui na Baixada como um todo, Zona Oeste. Fecham pacote. Eles têm controle. Eles têm controle preciso de título de eleitor, local de votação de cada título de eleitor, quantos votos vai ter ali. Eles são capazes de identificar quem não votou neles.
P. Mas não está havendo ações de desmontagem dessa estrutura, como se viu em Rio das Pedras?
R. Assim, a Operação Intocáveis pode estar dentro de um perfil mais de uma operação mais histórica. Mas eu tenho sido muito crítico a esse tipo de operação. Como a milícia é uma rede, uma rede muito grande, para cada um preso você tem 100 para entrar no lugar. Porque se você mantém a estrutura funcionando, economicamente, politicamente ela vai se perpetuar.
Ninguém toca nesses caras. Em geral, só estão tocando no tráfico. E tráfico não é o mais poderoso. Milícia é mais poderosa do que o tráfico. Milícia se elege, tráfico não se elege. A base econômica da milícia está em expansão, não é tocada, não é arranhada. Traficante não, vive morrendo e sendo morto e matando. Milícia é o Estado.
Inclusive, tem isso. Você olha para a cara dos milicianos presos, há uma tendência a serem brancos. Não há uma tendência a serem negros. Vai aparecer um ou outro no meio, um moreno, pardo. E não são magros, são bem alimentados. Eu tenho certeza de que a classe da qual pertencem os milicianos é uma classe diferenciada da classe do tráfico. Não são tão pobres assim. Não são tão negros assim. Não são tão periféricos assim.
P. Para além desse vínculo político de poder existe também algum elo financeiro? Como que os milicianos movimentam dinheiro através dessas conexões com políticos? Qual era, por exemplo, o papel do Queiroz ali no Gabinete do Flávio Bolsonaro?
R. Ah, sim, você viu que ele tem uma movimentação suspeita alta. Tem 7 milhões [de reais]. Aí você vai por dedução. Pode ser que esse cara fazia uma ponte. Ele era um assessor, mas ao mesmo tempo ele cumpria duas funções. Ele ganha um respaldo político do Flávio Bolsonaro. Ele faz o elo direto da milícia com esse gabinete. Dos interesses dessa milícia e dos que são servidos por essa milícia direito com esse gabinete. Ao mesmo tempo ele cresce na estrutura da milícia.
Não sei qual é o histórico dele. Mas de repente ele já estava na estrutura da milícia e já movimentando dinheiro. Então, por exemplo, se ele for uma frente, um cara que está na organização, por exemplo, de cobrança de taxa de segurança, ele está movimentando dinheiro. Muito dinheiro. Aí de repente ele vai movimentar parte desse dinheiro dentro da sua conta pessoal. É uma estrutura de organização que ele criou. Então esses 7 milhões [de reais] pode ser isso.
P. Isso também pode ser apenas uma transação entre várias?
R. Isso é uma ponta. Isso é uma ponta de um iceberg. O que eu gostaria muito é que se investigasse isso. Você chegaria em algo muito maior.
Sobre o caso da Marielle. O caso voltou aos holofotes essa semana porque os milicianos, que foram presos na operação “Os Intocáveis” integravam o Escritório do Crime, grupo suspeito de envolvimento na morte da Marielle. No final do ano passado, o secretário de Segurança Pública do Rio, Richard Nunes, afirmou que o assassinato teria relação com grilagem de terras. Você acha que a morte dela se deu porque ela atrapalhava os negócios dos milicianos?
Tem dois vínculos. Há esse vínculo de incomodar e prejudicar o interesse deles. Ela tinha poder para prejudicar, puxar uma CPI, exigir uma investigação para obrigar o Estado e a mídia como um todo a se voltar para isso. Se ela reproduzisse o que o Marcelo Freixo fez em 2008, dentro da Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, ela daria essa expressão. Ela tinha o respaldo do Marcelo, então há uma base política que sustenta Marielle, uma base não comprometida, não vendida. Então ela é uma figura que ameaça.
E o outro elemento é ela ser mulher. E ela ser uma mulher de uma atuação bastante intensa, verdadeira e não amedrontável. Ela encarava, enfrentava. Ela nunca se subordinou. E eles não suportam mulheres com esse perfil, essa é a verdade.
Marielle Franco, Patrícia Acioli, que foi assassinada também, e Tânia Maria Sales Moreira que foi promotora aqui em Duque de Caxias que era jurada de morte, mas morreu de câncer. Essas três, elas têm esse perfil. São mulheres com muita coragem, muita determinação, muita verdade do lado delas, elas não se subordinam, não se submetem. Esse tipo de mulher esses caras não suportam. Eles vão eliminar. Há uma misoginia total aí que eles não aceitam que qualquer mulher os trate assim.
Desde o início eu cantei a pedra: quem matou são grupos de extermínio e estão muito associados a milicianos. É a prática desses grupos.

UM TENOR CHINÊS CANTA GLUCK

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

DE PENITENCIÁRIA PARA REPÚBLICA



Estabelecimento Prisional de Lisboa vai ser uma residência para estudantes

ACTUALIDADE
Kátia Catulo
Texto
Fotografia de abertura

URBANISMO

Campolide
29 Janeiro, 2019

Os detalhes do projecto ainda estão por apurar, mas já se sabe que planos tem a Câmara Municipal de Lisboa (CML) para o edifício central do Estabelecimento Prisional de Lisboa (EPL), quando o receber da administração central: será uma residência de estudantes. Isso mesmo é confirmado pelo Departamento de Planeamento Urbano da autarquia, numa informação escrita enviada, na semana passada, por Manuel Salgado, vereador do Urbanismo, à Assembleia Municipal de Lisboa (AML), em resposta a um conjunto de questões, levantado pelo Bloco de Esquerda (BE), sobre o futuro dos terrenos. A câmara aguarda, no entanto, o desfecho das negociações entre o Ministério da Justiça (MJ) e a empresa pública Estamo, proprietária do histórico imóvel carcerário. Delas resultará a decisão sobre a dimensão da fatia dos restantes terrenos pertencentes ao EPL necessária à construção de novos edifícios para acolher os tribunais hoje localizados no Campus da Justiça, no Parque das Nações – e que a tutela quer para ali transferir. O que obrigará ao redesenho do Plano de Pormenor da área, aprovado em 2014.

Num requerimento enviado à Câmara de Lisboa, em meados de Novembro passado, os deputados municipais bloquistas interrogavam a edilidade liderada por Fernando Medina (PS) sobre o conhecimento que teria dos planos do MJ para fechar o Campus da Justiça e transferi-lo para o Alto do Parque Eduardo VII – na Rua Marquês de Fronteira, junto ao Palácio da Justiça -, mas também como irá decorrer a “articulação” entre a autarquia e a tutela neste processo. Lembrando o apetite imobiliário que os terrenos adjacentes ao EPL têm despertado, desde que se ficou a saber que viriam a ser desocupados, o Bloco perguntava ainda quais os planos da autarquia para que os mesmos “possam estar ao serviço da população”. Algo que já estaria garantido para o edifício central da prisão, uma vez que o mesmo, indica o Plano de Pormenor de Reabilitação Urbana do Campus de Campolide, aprovado em Julho de 2014 pela Assembleia Municipal de Lisboa, deverá ser cedido à câmara para a “instalação de equipamentos de utilização pública”.
É à luz dessa prerrogativa, sabe-se agora, que se pretende instalar uma residência para estudantes no edifício classificado, em 2012, como Monumento de Interesse Púbico – razão pela qual não pode ser demolido. O prédio em forma de estrela, que alberga pouco menos de nove centenas de reclusos – parte dos quais, em Dezembro passado, protagonizaram um conjunto de incidentes sérios, embora a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, tenha depois desvalorizado a sua gravidade, considerando não poder ser classificado como motim -, encontra-se muito degradado. Inaugurado em 1885, para aplicar as medidas da Reforma Penal e de Prisões de 1867, o edifício seguia o modelo penitenciário então instituído pelo Sistema de Pensilvânia, criado em 1829, pelo arquitecto inglês John Haviland, que, ao conceber o novo estabelecimento prisional de Filadélfia, desenhou um edifício com diversas alas que partem de um ponto central único, permitindo assim um melhor controlo dos reclusos por parte dos guardas. A Penitenciária de Lisboa, como foi conhecida durante décadas, encontra-se há muito obsoleta e as última obras de vulto que conheceu foram realizadas há um quarto de século.
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O estabelecimento prisional foi inaugurado em 1885 (foto: Harvey Barrison)


Os planos de encerramento do estabelecimento prisional já são antigos. Mas apenas passaram a constituir-se como cenário bastante plausível a partir de meados do ano passado, quando Francisca Van Dunem tornou público o desejo de transferir para os terrenos em redor do edifício central do EPL os tribunais concentrados no Campus da Justiça – inaugurado em 2009, pelo governo de José Sócrates, e alvo de críticas dos agentes judiciários desde então, por considerarem não terem ali as condições adequadas. A mudança, para além de agradar a quem trabalha nos tribunais da capital, representará sobretudo uma significativa medida de poupança ao erário público, que gasta cerca de nove milhões de euros por ano com o arrendamento dos edifícios do Parque das Nações. Revelado em Maio de 2018, o Plano Estratégico Plurianual de Requalificação e Modernização da Rede de Tribunais 2018-2028 prevê, no que se refere a Lisboa, a “construção de edifícios em terrenos da Estamo, inseridos no Plano de Pormenor de Campolide”.


Tal projecto está previsto custar cerca de 44 milhões de euros. Uma ambição da tutela que começou a ter tradução prática na lei do Orçamento de Estado (OE) para este ano. O diploma expressa a vontade de, durante 2019, o Governo tomar “as medidas necessárias para a execução do plano que visa o encerramento gradual dos estabelecimentos prisionais de Lisboa e de Setúbal, bem como a reinstalação dos serviços centrais do Ministério da Justiça e dos tribunais de Lisboa”. Existe a intenção, se tudo correr como planeia a tutela – a transferência faseada dos prisioneiros para outras unidades penitenciárias -, de encerrar “até 2020” o Estabelecimento Prisional de Lisboa ao uso para que foi concebido. Para além disso, subiste o processo negocial entre o Ministério da Justiça e a Estamo. O EPL foi vendido, em 2006, pelo Ministério da Justiça à empresa pública Estamo, dependente do Ministério das Finanças, por 62 milhões de euros. Uma operação contabilística então justificada com a necessidade de financiar a redução do défice. Como, desde então, não desocupou o imóvel, o MJ paga uma penalização anual de 2,8 milhões de euros à empresa pública.
Quando, em Outubro passado, se tomou conhecimento  da referida medida constante do OE 2019, confirmando assim a decisão de encerramento do estabelecimento prisional, foram tornadas públicas alegadas divergências sobre o que fazer com os terrenos em redor do edifício central do EPL. Avaliados em cerca de 200 milhões de euros, são considerados altamente apetecíveis pelo seu potencial imobiliário e o tal Plano de Pormenor de Reabilitação Urbana do Campus de Campolide prevê que possam ser vendidos a privados – e demolidos os desqualificados edifícios ali existentes – para ali construir imóveis de habitação, hotelaria e comércio. Se à televisão SIC, o MJ assegurava que “está definido que a cidade judiciária de Lisboa se localizará na Rua Marquês da Fronteira, em Campolide”, já a Câmara de Lisboa dizia ao mesmo órgão de comunicação social não poder pronunciar-se sobre o assunto, alegando desconhecer formalmente as áreas a desactivar do uso público. Também a Estamo dizia na altura ser ainda cedo para se pronunciar sobre a matéria, por a mesma estar ainda a ser discutida.

Passados três meses, o dossiê estará bem mais adiantado e tudo indica que a vontade de Van Dunem prevalecerá. Aqueles terrenos deverão mesmo ser destinados à construção de uma nova “cidade judiciária”, mantendo-se assim na esfera pública. Tanto que os responsáveis pelo Urbanismo da Câmara de Lisboa participaram numa reunião no MJ, onde tal assunto foi discutido. Na resposta da autarquia agora dada ao requerimento dos deputados municipais do BE, é referido que o assunto aguarda apenas a conclusão de um entendimento entre MJ e Estamo para avançar. Definidas entre ambas as partes as áreas a reconverter para uso do ministério, a CML dará então início ao processo de referido Plano de Pormenor de Reabilitação Urbana do Campus de Campolide – que terá de voltar a ser ratificado tanto pela câmara como pela assembleia municipal. Na mencionada informação, lembra-se que “o plano em vigor contempla uma área significativa à expansão de equipamentos universitários do Campus da Universidade Nova de Lisboa, que abrangem parte dos terrenos actualmente afectos ao EPL”.