Paulo Ormindo de Azevedo
Assim entrava Noel Rosa cantando nos botequins. Uma das funções mais importantes dos bares é sociabilizar os espaços públicos, com suas mesas nas calçadas. Estive, na semana passada, no Rio de Janeiro e pude mais uma vez curtir essa sensação com amigos, na orla de Copacabana, cantada por Braguinha e Caymmi.
Salvador não tem calçadas. São mesquinhos e esburacados os passeios da nossa cidade, mas as pistas dos carros são impecáveis, frequentemente recapeadas. Nos bairros populares de casas, onde ainda existem relações de vizinhança, como Saúde, Ribeira e Liberdade, muitos bares colocam mesas e cadeiras na pista, à noite, que não prejudicam em nada a mobilidade veicular nesses bairros.
É muito diferente dos bairros da classe média alta verticalizados em que o espaço público é a terra de ninguém e seus moradores entram e saem de carro apressadamente dos prédios. Não temos também redes de vias exclusivas para bicicletas e patinetes elétricas numerosas em outras cidades, só pistas engarrafadas de carros e passarelas quilométricas para os pedestres. Os viadutos, que dominam a cidade, não têm passeios, são vias socialmente asséptica. As ruas perderam a função de convivência social.
Nem na Orla da Av. Otávio Mangabeira se pode caminhar à noite.
Que diferença das orlas de Santos, de Ponta Verde em Alagoas e Tambaú em João Pessoa. O planejamento na Bahia se resume ao orçamento, para aumentar a arrecadação e pagar as empreiteiras e aos funcionários públicos em dia. Planejamento territorial, urbano e parques são considerado desperdícios, só o que interessa é fazer obras para assegurar o financiamento da próxima campanha eleitoral.
Outro meio de sociabilidade urbana são as feiras. Na cidade de São Paulo, a Prefeitura fecha ruas para a realização de feiras semanais em todos os bairros, onde os moradores se encontram para comprar verduras e frutas ou simplesmente para jogarem conversa fora sentados em bancos saboreando pastéis e suco de cana. Salvador acabou com as feiras nos bairros e a tradição das festas religiosas das paróquias com barracas e mesas alegando que atrapalhavam o trânsito.
A Prefeitura com seu culto ultrapassado ao carro, na contramão de todo o mundo, está transformando Salvador em um complexo rodoviário, sem vida social e cultura urbana. Os bares de calçada humanizam as ruas e promovem a vigilância social. O que dá vida e segurança às ruas e praças do primeiro mundo são esses bares.
A mentalidade rodoviária está tão impregnada na Bahia, que o Ministério Público, MP-BA, deu 60 dias à Prefeitura de Salvador para apresentar um plano contínuo de fiscalização do uso de calçadas por bares e restaurante diante de “graves problemas de mobilidade urbana que são verificadas em diversos bairros de Salvador” (A Tarde, de 07/11/24). Lastimável!
PS - Melhor que prefeitura fiscalizasse os carros com caixas de som enormes nas conveniências dos postos de gasolina e circulando pela cidade.
SSA: A Tarde, 24/11/2024
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