Florisvaldo Mattos
INTRODUÇÃO
O estudo do banditismo social do Nordeste, de uma perspectiva histórica antropológica foi enormemente prejudicado por uma série de juizos preconcebidos que se formaram em torno do tema, inspirados geralmente na ação predatória praticada por bandoleiros, que os tornava antes de tudo uma ameaça para a sociedade.
Preconceitos vigentes na maioria dos analistas dificultaram o conhecimento do problema em muitos de seus aspectos. Pode-se dizer mesmo que toda uma geração de intelectuais nordestinos esteve sob a influência da atividade nociva do banditismo, e toda uma literatura se produziu sobrecarregada de conotações emocionais, em que não raro o bandido, seja ele Antônio Silvino, Lampião ou Corisco, é visto como um caso de patente vocação para a delinquência, um caso de loucura moral ou até mesmo de inferioridade racial; quando muito, como produto de um meio atrasado, sem que para isso se proceda à análise das causas mais profundas que estão na raiz desse fenômeno.
Um exemplo disso é a tendência para responsabilizar o Estado, os poderes públicos, pela existência do banditismo. E há mesmo autores que chegam a apontar figuras isoladas - caso do coronel - como propiciadores dessa chaga social. Quase nunca os autores se voltam para a questão global em que estão presentes muitos aspectos da própria sociedade que gera o bandido. Talvez pelo distanciamento que o tempo proporciona já hoje é possível compreender melhor a natureza das épocas de banditismo, sem que seja preciso chegar ao extremo oposto à condenação pura e simples, com a transformação do bandido em exemplo de herói. Hoje já é possível ver o banditismo como o protótipo de uma rebelião de nível social primário e estudar o fenômeno em muitos aspectos, livre de preconceitos.
A maioria dos autores, por exemplo, não parece capacitada a responder à seguinte pergunta: por que a maioria das populações rurais tende a proteger os bandidos? Ou a esta: a ação dos bandidos sociais pode ser encarada como um protesto? Que tipo de protesto?
Há sempre duas visões em relação à figura do bandido social: a do poder repressor, que o encara geralmente como um facínora, homem violento e cruel, que precisa ser extirpado da sociedade a qualquer custo, e a dos pobres, semi-servos como ele na sua origem, que normalmente o veem como o realizador daquilo que de certo modo desejariam fazer, mas não podem porque são fracos.
O interesse do presente trabalho orientou-se para a tentativa de estudar um aspecto do bandoleirismo: o carisma de que parece estar possuído o bandido social típico. Não há como negar a grandeza e os riscos de uma abordagem não profissional do tema; mas vale a tentativa. Por isso, em razão de tratamento estritamente teórico, pareceu aconselhável ao autor a adoção de uma metodologia que incluísse, primeiramente, uma caracterização do fenômeno do banditismo social; em seguida, uma configuração teórica do problema do carisma para, finalmente, traçar-se o perfil da personalidade carismática de um bandido social brasileiro, no caso a de Lampião, escolhido por ser, dentre outros motivos, o mais representativo bandido social de uma época, o mais famoso, e aquele cuja atividade foi mais duradoura, além de ser o bandoleiro do Brasil sobre quem mais se escreveu, registrando-se hoje acentuada tendência para uma revisão de muito do que em tempos passados sobre ele foi dito.
Foi bandido e tornou-se símbolo por causa do carisma que possuía. Eis uma prova de sua importância: recentemente uma revista nacional publicou um suplemento em série com biografias de celebridades e pôs Lampião em destaque, entre os homens que fizeram o século XX. Por isso, nunca será em vão estudá-lo. (Revista Manchete, no. 972, Suplemento).
Banditismo, um fenômeno social
MAIS:
Interessante estas fotos PB de época colorizadas.
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