domingo, 27 de agosto de 2023

AS JOIAS DO PODER

 Joias do Estado: ex-premiê e ex-ditador do Paquistão foram condenados por levar Rolex e outros presentes

Por Luisa Belchior, g1

O ex-primeiro-ministro paquistanês, Imran Khan, em 2022.  — Foto: B.K. Bangash/AP

O ex-primeiro-ministro paquistanês, Imran Khan, em 2022. — Foto: B.K. Bangash/AP

suposto esquema de venda ilegal de joias e presentes oficiais concedidos ao Estado brasileiro durante o governo de Jair Bolsonaro não é um caso inédito no mundo.


No Paquistão, um ex-premiê foi condenado por vender joias do acervo oficial do país que ele ganhou. E, anos antes, um ex-ditador do Paquistão também foi acusado de levar um Rolex, joias e diamantes ao deixar o poder.


O ex-premiê Imran Khan, um ex-jogador de críquete que era ídolo no país antes de assumir o governo, foi condenado no início deste mês a três anos de prisão por ter vendido, sem declarar, joias que recebeu quando era líder do país.


Khan, que foi destituído do poder no fim de 2022 após perder uma moção de desconfiança no Congresso, levou do acervo do Estado itens como um anel, um par de abotoadoras e relógios Rolex, estimados, no total, em cerca de R$ 3 milhões.


O ex-premiê negou as acusações, mas áudios de sua mulher revelados pela imprensa registraram o casal falando sobre a venda de relógios retirados do acerto.Reproduzir vídeo

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Ex-primeiro-ministro do Paquistão é condenado por corrupção

O caso não é único no país. Pelo contrário: tem sido tão recorrente que, no fim do ano passado, uma alta Corte do país, o Tribunal Superior de Lahore (LHC), abriu uma série de audiências para tentar rastrear e encontrar joias levadas por ex-líderes do poder e que nunca foram encontradas.

Um dos mais marcantes é o do general Pevez Musharraf, ex-ditador que comandou o país entre 1999 e 2008. Naquele ano, Musharraf foi acusado por promotores de retirar ilegalmente uma série de joias dadas de presente ao Estado ao deixar o poder e se exilar em Londres.

O general, que chegou ao poder após um golpe de estado e era aliado do Ocidente, teve de pagar uma taxa imposta pelo governo por ter levado as joias, após o esquema ser revelado pela imprensa local.

Mas os relógios da marca Rolex e o restante do acervo, ainda segundo a imprensa paquistanesa, jamais foram devolvidos ao acervo oficial do país.

Segundo revelou uma reportagem do jornal "The Daily" da época, o general levou ilegalmente 168 itens do acervo de presentes dados por líderes de outros países ao Paquistão.

Este ano, o governo paquistanês divulgou um relatório no qual descreve os presentes que Musharraf nunca devolveu. Desde o ano passado, uma Corte do país tenta encontrar e resgatar os presentes.


O ex-premiê do Paquistão Pevez Musharraf cumprimenta o ex-presidente dos EUA George W. Bush, na Casa Branca, em 2006. Os dois eram aliados. — Foto: Gerald Herbert/ AP

Todos os itens levados pelo ex-ditador, segundo a publicação, eram joias como colares, brincos e pulseiras de pérola, ouro e diamante, dois Rolex e até dois revólveres dados pelos Estados Unidos — Musharraf, que chegou ao poder como um militar moderado, era aliado de Washington na luta contra grupos terroristas como a Al-Qaeda.

Na ocasião, a imprensa paquistanesa apontou que uma das caixas de joias que o ex-líder levou foi dada de presente pelo então presidente norte-americano George W. Bush.

De aliado do Ocidente a autocrata e repressor

O ex-presidente do Paquistão, o general Pervez Musharraf, chegou neste domingo ao aeroporto internacional de Karachi — Foto: AFP Photo/Aamir Qureshi

O ex-presidente do Paquistão, o general Pervez Musharraf, chegou neste domingo ao aeroporto internacional de Karachi — Foto: AFP Photo/Aamir Qureshi

A gestão do então líder foi elogiada e bem-vista por boa parte dos paquistaneses e de líderes do Ocidente. Ele prometia aumentar a democracia do país — que se tornou independente do Reino Unido em 1947, mas passou décadas sob comando direto e indireto das Forças Armadas.


No fim de seu governo, no entanto, Musharraf começou a tomar medidas de caráter autocrata e foi acusado de usar o Exército para massacres e repressão violenta a dissidentes em protestos e atos religiosos.


Em 2019, um tribunal do Paquistão chegou a condená-lo à morte por alta traição e por manter um estado de exceção prolongado no país, quando todas as liberdades civis, direitos humanos e processos democráticos foram suspensos.


A sentença foi anulada meses depois sob a alegação de inconstitucionalidade, mas, como Musharraf já estava exilado em Dubai, a condenação ocorreu à revelia, e ele nunca cumpriu pena. O ex-ditador morreu em fevereiro deste ano no exílio.


Mas Musharraf também foi apontado por promotores paquistaneses como um possível envolvido no assassinato da ex-primeira-ministra Benazir Bhutto, em 2007, em um atentado que chocou o país e o mundo, quando o ex-ditador comandava o país.


Uma investigação nos anos seguintes chegou a apontar que Musharraf ameaçou por telefone a ex-premiê quando ela estava no exílio, na tentativa de mantê-la fora do país — Benazir Bhutto foi morta após voltar ao Paquistão e anunciar que concorreria novamente ao cargo de premiê.


Musharraf negou em diversas entrevistas a acusação. Ele disse achar que, por Bhutto ser próxima ao Ocidente, políticos radicais contrários à interferência constante dos Estados Unidos no país podem ter planejado o atentado com membros dos Talibã.


Mas, até hoje, filhos de Benazir Bhutto dizem acreditar que o ex-premiê teve participação na morte da mãe e que sabotou a segurança dela no Paquistão para facilitar o atentado, o que ele também nega.Reproduzir vídeo

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Polícia Federal afirma que negociação de presentes e joias entregues a Jair Bolsonaro começou ainda em junho de 2022, nos Estados Unidos

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