Se Salvador perdeu parte significativa de seus moradores, isso significa que algo está errado na sua gestão. Um dos possíveis motivos sendo a agressiva desumanização de um planejamento incoerente e submisso a especulação imobiliária. Quantos jardins públicos foram criados nessas últimas décadas?
Em
contrapartida, o centro histórico está pegando fogo. Muito depois de pioneiros
como o Senac, o Hotel Villa-Bahia e o restaurante Cuco, o mineiro Antônio
Mazzafera, após alguns erros conceituais, e com certeza muitas dificuldades de
apoio, está ressuscitando a Rua Chile e adjacências. Em breve esta parte do
centro tornará a brilhar com toda a purpurina perdida.
Por
enquanto, o Pelourinho, com seu cenário para turismo de massa e suas ruinas, é
o patinho feio de nosso patrimônio. Sobrevive com overdose de atabaque.
Descendo e
subindo ladeiras até chegar ao Carmo, de repente, entramos em outra bolha. O
bairro de Santo Antônio está virando o xodó de artistas, jornalistas e boêmios.
Homens de barba e saia longa e lindas mulheres de cabeça raspada. Só faltam uma
farmácia e uma boa sorveteria artesanal. Visando a classe média e, quem sabe,
algum Elon Musk, Madonna ou Lewis Hamilton, abrem-se bares e restaurantes com
ambientação caprichada, feijoada nouvelle cuisine e preços para lá dos
Champs-élysées.
Mas ainda resiste,
em prazeroso paralelo, o velho bairro tradicional cujos moradores continuam
olhando o movimento pela janela ou fofocando sentados em cadeiras de plástico
na calçada, logo após o sol desaparecer.
Se você
ainda não se acostumou a passear pela Rua Direita, venha se deliciar com um
pastel de aratu do Edimilson ou, só em fins de semana, uma moqueca no D´Veneta.
Ademi e Dora não usam leite de coco em garrafa, mas extraído da própria fruta. Para
mim, isso já é gastronomia. E podem acreditar: a maniçoba é melhor que em
Cachoeira. O Cafelier continua com sua vista deslumbrante, o Paulo recebendo na
antessala e fotografando as celebridades. Se a padaria Flor de Santo Antônio -
que virou ponto de encontro do bairro - tem uma produção ás vezes irregular,
vale pelos preços acessíveis, a gentileza de patrões e funcionários. E o suco
de laranja é generoso.
Aproveito
para inserir um intervalo comercial: em março passado abri o atelier Kasbek, no
térreo da casa para expor minhas fotografias e um monte de objetos e obras de
arte de minha coleção. Marcelo Rezende, curador da última - última mesmo! –
Bienal da Bahia, tencionava organizar uma exposição de meu bazar sob o título
genérico de Gabinete de Curiosidades como existiam na Renascença.
Talvez a primeira
capital do Brasil esteja se esvaziando, mas no meu bairro - tem 48 anos que por
aqui moro – a vida continuará alegre ainda por muito tempo.
Dimitri Ganzelevitch
A Tarde, 6 de janeiro 2024
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