Ainda tenho muitos textos protagonizados por celebridades, mas a partir de amanhã vou intercalá-los com textos sem elas. Hoje posto este, em atenção a Gerónimo, que merece....
Fui ao Japão com João Gilberto por duas vezes. Na segunda chegamos em Osaka tarde, acho até que depois da meia-noite, e a estreia seria na noite seguinte há menos de 24 horas. João estava exausto.
Quando chegamos ao hotel havia dois senhores japoneses com cerca de 40 e poucos anos , bem vestidos , de paletó e gravata, e com um estojo de violão novíssimo. Queriam falar com João que , percebeu , deu um sorriso, fez algumas mesuras, e pedindo-me pra falar com eles entrou rapidamente no elevador. Era mesmo uma das minhas funções fazer coisas assim.
Eles eram do setor de violões da Yamaha, e estavam trazendo um violão especial para JG. Percebi logo a intenção de "artista Yamaha".
Mal sabiam eles que estavam lidando com um grande mestres dos dribles, como Garrincha. Fiquei conversando, um deles tocou magnificamente "Um Abraço no Bonfá", composição instrumental de JG. Bem mais tarde agradeci e, sob a promessa de levar o violão pra João, subi com ele pro meu quarto.Acordamos tarde.
João me chamou para ver alguma coisa , aproveitei e levei o violão, dizendo a ele o que achava que era. Ele não disse nada. Deixei o violão no canto junto com o seu favorito , o Di Giorgio escuro que apelidei de "café".Bem mais tarde começou a grande confusão, o nervosismo da estreia.
Que roupa? Que sapato? Que gravata? Todos nós da equipe, éramos 4, mobilizados para minimizar aquele impacto , que pra ele é mesmo muito grande.
Minha área era a propriamente musical. Repassei as afinações dos dois violões, embora ele nunca ficasse satisfeito.
Finalmente saímos.Eu levando os violões num carro com Otávio Terceiro (o inseparável escudeiro de João) e Nobu (um intérprete amigo)e no outro carro JG e Edinha, sua secretária naquele tempo. JG tinha sempre o privilégio de entrar até os bastidores dos teatros, de automóvel. Fez isto também aqui no TCA. Depois de muitas peripécias, finalmente ele entrou no palco por um dos bastidores mais ao fundo , com os dois violões. Fui para o nosso lugar regular , que era um bastidor mais à frente.
Chegando lá -surpresa- estavam os dois japoneses da Yamaha. Cumprimentei-os (naturalmente sempre falávamos em inglês) e sentei ao lado, numa das cadeiras que a produção colocava para nós.
JG sentou , deu boa noite em japonês - "Kombaiá"- e deixando o Di Giorgio no suporte, tocou a primeira música com o Yamaha. Os japoneses exultaram, sorriam o tempo todo. Quanto terminou a primeira música , JG , que com certeza sabia onde estavam os japoneses , virou-se para eles e sorriu , como que aprovando o Yamaha. Depois colocou o Yamaha no suporte , pegou o Di Giorgio e por todo o resto da viagem nunca mais pegou no Yamaha. Nem sequer o levava para os teatros. Os japoneses ficaram doidos e me perguntaram que violão era aquele.
Eu , com imenso orgulho, disse: " Di Giorgio , um violão brasileiro". Eles " Barazilian ô ô ô (aqueles sons de espanto japonês, iguais aos que vemos nos filmes)".
A Yamaha produz flautas, saxofones, pianos, cordas e instrumentos elétricos com custo-benefício excepcional. Não fizeram a melhor flauta do mundo, nem o melhor sax, nem o melhor piano ou violão, mas oferecem muita qualidade por relativamente pouco preço. Depois vieram os chineses. Todo mundo de emociona ao ver crianças da favela tocando numa orquestra sinfônica. Mas nessa hora ninguém se lembra que sem a expansão do capitalismo pela Ásia e uma certa liberdade de comércio, isso não seria possível. Queria ver se todo mundo tivesse que comprar violino italiano e flauta francesa.
ResponderExcluiro arnaldo bortolon não estava não?
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