Luiz Mott
Aleluia! Após 22 anos fechada, Salvador é agraciada com a re-abertura da belíssima igreja da Venerável Ordem Terceira de São Domingos de Gusmão, no Terreiro de Jesus. Construída a partir de 1731, tem fachada em estilo rococó, uma torre terminada em bulbo, ficando a outra inconclusa – estratégia marota dos antigos para continuar recebendo subsídios reais para sua postergada conclusão sine die. 
O maravilhoso forro da nave lembra o casco emborcado de uma caravela, seguindo o mesmo modismo setecentista de outras igrejas baianas, o chamado estilo ilusionista: mostra o encontro do ex-nobre espanhol São Domingos e do ex-burguês italiano São Francisco, patriarcas dos Frades Pregadores e Menores. Obra atribuída ao grande José Joaquim da Rocha, fundador da escola baiana de pintura, segundo parecer do saudoso Carlos Ott, ex-franciscano.
O templo e seus anexos estavam em petição de miséria, dominados pelo implacável cupim e dilapidado por larápios que surrupiaram diversas imagens, alfaias e até painéis de azulejos – alguns afortunadamente recuperados por Júlio Maia, o competente coordenador dos trabalhos, artista plástico especialista em restauração de bens móveis e conservação do patrimônio cultural.
Tudo foi cuidadosamente restaurado: da estrutura do teto aos mármores do chão, destacando-se a delicada encarnação das imagens barrocas dos principais santos e santas da Ordem Dominicana: diversas imagens de São Domingos, São Tomás de Aquino, São Luiz Beltrão, Santa Catarina de Sena, Santa Rosa de Lima, um beato dominicano negro mártir no Japão e as raras imagens de duas santas dominicanas crucificadas.
Em 1989 publiquei o artigo “Um dominicano feiticeiro na Bahia Colonial” onde revelo a presença em Salvador, em 1703, de Frei Alberto de Santo Tomás, denunciado à Inquisição por praticar exorcismos suspeitos de diabolismo. Confeccionava e benzia bolsinhas com mirra, ouro moído, sal, folhas de oliveira e arruda para serem usadas no pescoço ou costuradas no colchão.
Revela o dominicano que de tais práticas surtiram “admiráveis efeitos: pessoas lançavam do corpo alfinetes, penas, anzóis, bichos, cabelo de negro e outras muitas imundícies.” Acredite quem quiser!
Como não havia na América Portuguesa convento algum da Ordem de São Domingos, a presença desse auto-intitulado “Vigário Geral dos Dominicanos no Brasil” indica existência de irmãos leigos dominicanos já no início dos setecentos, datando, contudo de 1722, a fundação oficial da ordem terceira por Frei Gabriel Batista, uma década antes da construção dessa bela igreja (1731), que estará aberta ao público a partir do próximo 3 de dezembro, inclusive alugando belo salão de festas! Grande júbilo para mim, ex-dominicano...
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