terça-feira, 23 de julho de 2019

SANTO ANTÔNIO, UM BAIRRO DA MODA...

... E DA ESPECULAÇÃO




Sete anos atrás, uma bela e espaçosa casa localizada à Rua Direita, com vista para a Baía de Todos os Santos, estava à venda por R$ 800 mil. O dono não encontrava comprador até que resolveu baixar o preço para poder fazer negócio. Ele realmente precisava vender e baixou o valor uma, duas, três vezes, baixou, baixou, baixou... levou quase três anos nesse processo até encontrar um comprador.
O novo proprietário não passou muito tempo e já colocou a casa à venda. Agora, com o país em recessão e a economia derretendo, a casa está sendo ofertada por R$ 1,6 milhões!!
É muito comum ver placas de “Vende-se” no Santo Antonio Além do Carmo, mas poucos negócios são realizados. Trata-se mais de especular que vender, propriamente.
A especulação imobiliária é um monstro que habita o Centro Histórico e o imobiliza, desde sempre. São milhares de casas e apartamentos fechados à espera de um “doido” para comprá-las. Algumas, estão abandonadas há décadas. Em conversa com muitos dos proprietários que mantém as casas fechadas, é notável a existência de um sonho de ver a vida “resolvida” após a venda concretizada.
Na belíssima Ladeira do Boqueirão há uma casa de três andares cujo proprietário a mantém fechada há mais de 20 anos. Trata-se de um espanhol, que segundo consta, não coloca os pés na terrinha tem é tempo. Um habitat fantástico para bichos e pragas diversos.
Não é preciso ressaltar o quanto é ruim para o bairro e para a cidade ter tantas casas sem moradores. O poder público nada faz.
Luciana Rique, cujo maior feito na vida até então foi ser “herdeira do Iguatemi”, desembarcou no início dos anos 2000 no Santo Antonio e surtou: o lindo bairro seria o espaço ideal para se montar um xóping center. Ela encomendou um projeto horrível e comprou 36 casas. E, depois, nada! Dezenas de casas fechadas significa dezenas de famílias a menos para comprar na padaria e andar pelas ruas. Processo de desertificação desastroso para o bairro.
Quatro anos atrás, pequeno grupo de moradores (eu, entre eles) carimbou as casas de Rique com a frase “Aqui podia morar gente”. Diante da imensa repercussão, Rique decidiu por os imóveis à venda pelo valor que comprou, ou seja, sem especular. Preços justos, compatíveis com a economia local. As casas logo foram vendidas e muitas delas estão em obra ou já com moradores. O bairro já sente o efeito positivo, tanto em termos da economia como da segurança. Nesse caso, a pressão popular organizada rendeu frutos, em pouco tempo!
Nas imediações da Praça Castro Alves, o monstro da especulação está radiante e mais vivo do que nunca com a chegada do Fera Palace e do Fasano. São muitos imóveis fechados, em ruínas. Em sua imensa maioria, os proprietários pedem valores irreais, que jamais serão absorvidos pelo mercado de uma sociedade em recessão.
Estamos vivenciando uma fase pré-capitalista na capital baiana. O dinheiro não circula e a terra (propriedade) conta como algo de vital importância para as famílias. Quase não se faz negócio.
Os governos estadual e municipal deveriam induzir o processo capitalista de compra e venda, impedir que os imóveis fiquem vazios e a economia estagnada. É dever dos gestores cobrar taxas elevadíssimas pelas casas e prédios vazios, sem utilidade. Deveriam estabelecer preços de aluguel, compra e venda na área do Centro Histórico. É assim que acontece em Genebra, Quebec, Viena ou Berlim.
A especulação imobiliária é um câncer, que corrói o Centro Histórico.

Cláudio Marques
Cineasta

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