
Pouco antes do Natal, um grupo de amigos de minha mãe,
recém-separada, foi convidado a almoçar num quartel americano perto de Meknés.
Toda a comida vinha por avião dos EUA. Naqueles tempos de penosa restrição
alimentar, ver chegar à longa mesa do refeitório perus inteiros deixou sem voz
os convidados.

Depois da lauda refeição, fomos até as ruínas romanas de
Volubilis. Mas eu tinha só seis anos e aquilo não podia me seduzir. Reclamava
do longo passeio sem graça debaixo do sol forte. A certa altura, cutucando o
terreno arenoso com a ponta de meu sapato, avistei e peguei algo redondo e escuro.
Minha mãe me disse que era uma moeda romana, uma peça de museu!
Foi assim que a museologia entrou na minha vida. Regressando
à casa, levei a moeda até uma pequena sala vazia e, recolhendo alguns objetos
velhos e quebrados, cacos de espelho, brinquedos, arrumei tudo no chão à volta
do quarto e fui falar para minha mãe que tinha feito um museu. Não demorou em
vir com os amigos conhecer este importante novo marco da memória romano/magrebina.
Só que, na hora de entrarem, exigi pagamento. Todos, com muita risada, deram
algum trocado.
Cresci, fui morar em várias capitais de três continentes. A
moeda sempre me acompanhou e hoje está numa vitrina da biblioteca, junto a um
monte de pequenos objetos com e sem valor.

Queira ou não, você sempre terá algum preconceito.
Dimitri Ganzelevitch
Jornal A Tarde
Sábado 11/07/20
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