terça-feira, 11 de fevereiro de 2025

O TETO CAIU OU A PONTA DO ICEBERG

O desabamento do teto da igreja de São Francisco, seguido de morte e feridos, veio evidenciar, definir e catalisar uma situação de desastre há muito anunciado para todo o patrimônio da Bahia. Em matéria de conservação, a situação é catastrófica. Nada ou muito pouco se restaura, e quando se restaura, o resultado pode ser pífio.

Alguns devem se lembrar de meus protestos acerca da Rua Direita de Santo Antônio, quando a Conder terceirizou a requalificação para uma empresa sem qualquer experiência para tamanha responsabilidade. Não cabe aqui descriminar os absurdos. O resto do centro histórico está em total abandono desde os anos 90.

O desleixo é marca registada da esmagadora maioria de nosso patrimônio. O Teatro Castro Alves, o Elevador Lacerda, Solar Boa Vista, Museu do Cacau, Centro de Convenções, Abelardo Rodrigues, Mercado do Ouro, Jandaia, Excelsior, encosta do Santo Antônio, Udo Knoff, Wanderley Pinho, Frans Krajcberg... a lista é longa, muito longa.

Em harmonia com a incompetência da estatal, temos as tristes intervenções da Fundação Mário Leal Ferreira, que se permite destruir o terminal do Aquidabã para colocar meia dúzia de barraquinhas que nem sanitário têm, e enfeita a Conceição da Praia com um caixão de concreto que mais parece um bunker da Primeira Guerra Mundial. Mas para cuidar das marquises do Comércio prestes a cair ou a Coelba afastar das fachadas os postes perigosamente carregados, aí não tem arquiteto ou engenheiro com tempo suficiente. Em caso de uma ou mais mortes, entre o Ipac, o Iphan, a Codesal e outras secretarias, assistiremos, mais uma vez ao costumeiro empurra-empurra.

E a cultura? Quem, por exemplo, hoje se lembra da III Bienal Internacional da Bahia? Aconteceu em 2014. Nossos responsáveis (sic) deixaram perder o espaço temporal de cinco (5) bienais. Não por falha da curadoria do Marcelo Rezende, quando diretores de museus vieram até da Europa e dos EUA. Roger Buergel (Documenta-Kassel), Yilmaz Dziewior (Museu Ludwig-Zurich), o curador cubano Geraldo Mosquera, a crítica Lisette Lagnado e outros.

Apesar dos participantes da Bienal serem baianos em 80%, não faltaram comentários rançosos de quem preferia uma bolha bem provinciana e um tanto xenófoba. Lembremos o destaque para prestigiar Juarez Paraíso, Juraci Dória e Rogério Duarte. Para alguns baianos, o evento serviu de trampolim para uma divulgação a nível internacional, como Tiago Sant´Ana e Airson Heráclito. Mas a bienal não se limitou à costumeira gentrificação Corredor da Vitória / Campo Grande / Solar do Unhão. Foi até ao subúrbio com o Acervo da Laje e ocupou o Arquivo Público da Quinta dos Lázaros.

Sintomático é o Museu de Arte Moderna ser hoje mais uma casa de eventos. E haja decibéis!

Dimitri Ganzelevitch

A Tarde, sábado15 fevereiro 2025

 

 

 

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