domingo, 16 de abril de 2017

R$3 BILHÕES DE PRECATÓRIAS

Estado e Prefeitura somam débitos de R$ 3 bi em precatórios

Joyce de Sousa
Ucsal aguarda desde 1979 pelo pagamento de R$ 2 mi - Foto: Xando Pereira | Ag. A TARDE

Ucsal aguarda desde 1979 pelo pagamento de R$ 2 mi
Xando Pereira | Ag. A TARDE

Após quase 15 anos de espera, o servidor aposentado Renato Santana, 71, acaba de receber o pagamento por uma ação coletiva, movida por delegados, escrivães e agentes policiais, em relação a uma indenização do fundo previdenciário estadual (Funprev). O prazo refere-se apenas à liberação do dinheiro depois do direito ter sido reconhecido pela Justiça – sem contar todo o tempo de tramitação do processo, até a sentença favorável, em última instância.
A causa coletiva ganha contra o Estado da Bahia envolvia 66 servidores aposentados, mas, diante da demora para o pagamento, 16 deles morreram no período, sem ter recebido a indenização. "Ainda assim, só recebemos agora porque, após a morte de muitos colegas, aceitamos a proposta de acordo, com prejuízo do nosso direito" , destacou Santana.
Com o acordo, os credores perdem 40% do valor que deveriam receber, facilitando a entrada no orçamento previsto para essa finalidade, ampliando as chances do dinheiro sair "mais rápido" do que se fosse esperar pela liberação, por ordem cronológica, a partir da entrada dos processos no Tribunal de Justiça.
Precatórios
Quando um cidadão ou uma empresa ganha o direito a uma indenização em um processo judicial contra a União, estados ou municípios, o pagamento do valor devido é feito por meio dos chamados precatórios. As requisições para o pagamento pelos entes públicos são expedidas pelo Judiciário, após a condenação definitiva, sem mais recurso.
Até o início de abril, o governo baiano acumulava R$ 2,5 bilhões de débitos de precatórios, envolvendo 1.615 processos. Na Prefeitura de Salvador, o saldo é de R$ 422 milhões, aproximadamente, para pagar 133 precatórios. Juntos, portanto, somente o Estado e a prefeitura da capital somam quase R$ 3 bi de débitos de precatórios.
40 anos penando
Engana-se, entretanto, quem pensa que ter precatório junto à administração da capital é menos penoso. Ao contrário: enquanto, no Estado, o processo mais antigo, a ser quitado seguindo a ordem cronológica, é de 2002; na prefeitura, o primeiro da lista foi apresentado para requisição do pagamento pela Justiça em 1978. Ou seja: há quase 40 anos – isto só para liberar o pagamento, após todos os anos de audiências e recursos do processo na Justiça
Não é à toa que os dois primeiros precatórios a serem pagos pela ordem cronológica são hoje devidos aos familiares dos contribuintes que originalmente ganharam as questões contra o Município: ambos os titulares das ações morreram sem receber o pagamento. A lista completa dos precatórios do Estado e de todas as prefeituras baianas está disponibilizada no site do Tribunal de Justiça: www.tjba.jus.br.
Na Prefeitura de Camaçari, por exemplo, são poucos processos (menos de 20 até o início do mês), mas o saldo devido é relativamente elevado: R$ 220 milhões, aproximadamente. O primeiro processo a ser pago, ou seja, o mais antigo pela ordem cronológica, tem quase uma década de espera.
"Avanços"
De acordo com a juíza Verônica Ramiro, titular do Núcleo Auxiliar de Conciliação de Precatórios (NACP), mesmo ainda com prazos considerados longos, o pagamento de precatórios está avançando um pouco mais agora no estado. O esforço concentrado do próprio TJ-BA, bem como a nova Emenda Constitucional nº 94, que passou a vigorar no final do ano de 2016, seriam as razões.
Resultado: em menos de um ano, o NACP conseguiu pagar R$ 375 milhões, ante os R$ 101 milhões efetuados nos dois anos anteriores. A nova norma prevê destinação obrigatória do orçamento para precatórios e que todos devem ser quitados até, no máximo, 2020.
Lista de credores reúne hospitais e universidade
Instituições e empresas conhecidas do público também estão na lista de precatórios. O Instituto Brandão de Reabilitação (IBR), hospital de referência no município de Vitória da Conquista, no oeste do estado, está desde 2006 à espera pelo pagamento de uma causa que ganhou na Justiça contra o governo baiano.
São devidos, aproximadamente, R$ 172 mil. A instituição está na 32ª posição na fila para receber a indenização, o que pode levar anos ainda. Em primeiro lugar na lista de precatórios do estado está uma construtora (Queiroz Galvão), cujo processo, no valor de aproximadamente R$ 7 milhões, está à espera por pagamento desde 2002.
Preferências
Na relação da Prefeitura de Salvador, em quarto lugar da fila está a Universidade Católica do Salvador, ou melhor, a Associação Universitária e Cultural da Bahia, que aguarda desde 1979 pelo pagamento de R$ 2 milhões. Já em Camaçari, a Defensora Pública do Estado está entre os credores, em 13º lugar, para receber R$ 48 mil.
A juíza Verônica Ramiro, do Núcleo Auxiliar de Conciliação de Precatórios (NACP), frisa o esforço que vem sendo feito pelo TJ baiano para agilizar o pagamento dos precatórios, antes mesmo da Emenda 94.
“Para se ter uma ideia, além dos avanços intermediando acordos que aceleram o pagamento, estamos em dia com todas as preferências, pagando precatórios que deram entrada este ano”, frisou a juíza, referindo-se aos casos envolvendo créditos alimentícios de idosos, portadores de deficiência ou doenças crônicas.
OAB e afpeb fiscalizam  
e criticam lentidão
“A Fazenda Pública deveria ser tão rigorosa na hora de pagar o que deve aos contribuintes quanto o é na hora de cobrar, imputando pesados juros e, muitas vezes, bloqueando atividades econômicas. Não age da mesma forma, entretanto, quando é ela quem tem de pagar”. A declaração é do advogado André Barachisio, presidente da Comissão de Precatórios da seção baiana da Ordem so Advogados do Brasil (OAB-BA).
A comissão da OAB acompanha o cumprimento dos prazos, inclusive de entrega de documentos, exigidos para pagamento. A juíza Verônica Ramiro, do Núcleo Auxiliar de Conciliação de Precatórios (NACP), explica que, em muitos casos, a demora para a liberação do dinheiro ocorre por conta da quantidade de pendências judiciais envolvendo os credores. “Se o credor, pessoa jurídica, está para receber e perde uma outra ação que bloqueia parte do pagamento para questões trabalhistas dele com funcionários, por exemplo, toda a documentação judicial e seus prazos para expedição, bem como os novos cálculos, devem constar do processo do precatório e acabam travando o pagamento”, disse.
“É um desrespeito”, diz o advogado Joseval Carneiro, chefe do setor jurídico da Associação dos Funcionários Públicos do Estado da Bahia (Afpeb). “Infelizmente, tem sido comum que os procuradores se desdobrem para adiar, ao máximo, os pagamentos com os chamados embargos de gaveta”, criticou.
De acordo com o NACP, os funcionários públicos são os principais credores. Para o presidente da Afpeb, Armando Oliveira, “os precatórios têm se configurado numa tentativa de calote oficial”. Ele espera avanços após as sanções criadas pela Emenda 94, que prevê para os entes inadimplentes até o bloqueio de repasses dos fundos de participação (FPM e FPE).

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