segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

NÃO É UM, GOVERNO MEDÍOCRE

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Não é verdade que temos hoje no Brasil um governo medíocre. Quem assim o classifica faz-lhe um elogio imerecido. É coisa de uma parte da mídia que tenta esconder o fracasso evidente da política econômica ora implementada, só porque ela satisfaz a sede de privilégio de seus patronos mais gananciosos. Mas trata-se de um disparate. Por qualquer critério, este que se impôs aos brasileiros está muito abaixo da média histórica.
Um governo medíocre tem algum respeito pelo interesse público, preocupa-se em mostrar um certo decoro, busca tornar-se em alguma medida aceitável pelo conjunto da sociedade, evita crises institucionais tanto quanto pode. Mesmo não sendo brilhante nem criativo, tenta não ser de todo inepto na gestão dos recursos públicos, na atenção a demandas fundamentais da população. Um governante mediano talvez não consiga, mas busca parecer estadista. Pode ser mesquinho, porém não exibe sua mesquinhez de forma despudorada. Teme o ridículo. Cuida de manter, quando nada, uma aparência de dignidade. Leva em conta o chamado respeito humano. Receia fazer papel de tolo, ou de trapalhão inconveniente no campo das relações internacionais. Não posa de lacaio, nem de desaforado. Ainda que minta, esforça-se por não ser pateticamente inverossímil nas suas mentiras. Procura manter algum canal de diálogo com seus opositores e por muito que os deteste não o manifesta de forma incivil. Na surdina, pode até privilegiar seu clã, mas não escancara seu nepotismo.
Não sejamos injustos: o governante medíocre evita passar por bronco. Se não tem, quando nada finge algum interesse pela cultura. Em todo o caso não a combate: não insulta nem hostiliza abertamente quem a ela se dedica, quem se destaca neste campo. Não minimiza a educação nem deixa claro que manda às favas a saúde pública. E procura formar uma equipe apresentável, senão respeitável.
Não é o que estamos vendo hoje em nosso país. Temos um tipo muito rebarbativo de governo lumpen encabeçado por um político truculento, parvo, que formou sua equipe à sua imagem e semelhança. Depois de declarar seu ódio ao educador brasileiro mais conhecido e respeitado no mundo, celebrado nas maiores universidades da Europa e dos Estados Unidos, procurou para o cargo de Ministro da Educação pessoas com características opostas: despreparo, insignificância, estultícia. 

O primeiro nomeado era um pobre paspalho que logo se cansou da farsa. 
Da segunda vez o presidente achou o que procurava: um professor aloprado, com um currículo pífio, sem produção científica, com dificuldades para exprimir-se na sua língua nativa, incapaz de escrever um texto aceitável, mas profundamente ressentido, pronto a vingar-se do fracasso de sua carreira acadêmica atacando as instituições públicas de ensino, que calunia sem pudor.
Para o Ministério do Meio Ambiente foi escolhido um réu de crime ambiental, ignorante em tudo que concerne à área e de todo avesso a qualquer procedimento correto na abordagem dos assuntos críticos afetos a seu cargo — tanto que se fez, por ação e omissão, responsável por grandes desastres ecológicos, calamidades sinistras. 

Para as Relações Exteriores foi designado um chanceler delirante, afetado e grotesco, que parece empenhado em humilhar a diplomacia brasileira. 
Com o claro propósito de inviabilizar a atenção aos Direitos Humanos (que sabidamente despreza) e de descuidar dos sérios problemas das mulheres brasileiras (que não leva a sério) o presidente escolheu uma figura patética, uma senhora capaz de suscitar ao mesmo tempo compaixão, revolta e gargalhadas. Em todo o caso, ela não parece discrepar muito dos outros figurantes do bisonho ministério do capitão. 
Este seguiu a mesma linha tortuosa no trato com a cultura, que aborrece e detesta, talvez por estar fora do alcance de sua limitada compreensão. Com efeito, parece ser uma característica sua odiar o que lhe falta, o que não consegue entender. Para tratar do que tanto abomina, o primeiro mandatário achou uma figura a seu gosto: um dramaturgo obscuro que, sem sucesso no teatro, buscou aparecer insultando uma grande atriz, Fernanda Montenegro, respeitada e querida por todo o Brasil. Mostrando coerência, a primeira façanha do novo Secretário foi declarar guerra aos artistas brasileiros, num discurso grotesco em que deixou espantados e visivelmente consternados os ministros da cultura de diferentes países. Mas foi só o começo. Agora ele excedeu-se. 
Para presidir a Fundação Palmares designou um homem perturbado, em conflito com sua própria origem, que nos primeiros pronunciamentos declarou-se contrário às finalidades da instituição posta sob sua égide, e sequer se deu conta de que assim se desautoriza. Esta nomeação escancara o racismo visceral de quem a fez e de quem a sancionou. Torna-o patente não só o claro propósito de hostilizar o movimento negro, de agredir uma instituição criada para dar combate às terríveis sequelas do escravismo, mas o próprio vilipêndio inerente ao ato. Envenenado pelo racismo que internalizou, tornado cego por seu triste empenho de igualar-se a quem o espezinha, o infeliz nomeado pelo jeito não percebe sua humilhação, a degradação a que foi submetido. Não se sabe até que ponto sua inconsciência o protegerá, mas o vexame já é brutal: envergonhou o irmão, foi exposto ao país como um filho traidor do pai, um renegado. Exibiram sua ignorância patética, cobriram-no com a sordidez e o coroaram de infâmia. É evidente o sadismo de quem o o escolheu para tão triste papel. Mas ele não percebe a violência a que foi submetido, num ato de que a zombaria é parte evidente. Dessa vez foram longe na sordidez e no gozo de humilhar um negro, aproveitando-se da mutilação de sua consciência pelo racismo instilado. 
Mas estão muito enganados os promotores dessa farsa se pensam que vão calar o povo de Zumbi. São milhões os que resistem e levantam ainda a bandeira de Palmares. 

Os assassinos de Marielle Franco estão rindo à toa, mas não triunfaram. 
Palmares vive.
ORDEP SERRA

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