Ponto turístico abandonado: insegurança esvazia comércio da Barra
Os pontos turísticos são conhecidos pelo comércio forte, mas em Salvador a realidade é outra. Além do Pelourinho, a Barra também vem sofrendo com o fechamento do comércio local. Para os moradores e comerciantes que resistem, o cenário é preocupante e reforça problemas antigos: a insegurança e a falta de estrutura para receber o público que lota o bairro nos finais de semana.
As paisagens do Farol, Porto e Cristo estão dividindo espaço com portas de lojas e restaurantes fechados e imóveis com placas de vende-se e aluga-se. Na Avenida Oceânica e nas ruas Afonso Celso e Almirante Marques de Leão, há pelo menos dez estabelecimentos fechados onde antes funcionavam comércios. O levantamento foi feito pela reportagem.
Para os comerciantes e donos de hotelaria, o fechamento é reflexo da falta de segurança pública que cresce durante o período de baixa temporada. Nos dias de Carnaval e de eventos como o aniversário da cidade, há policiais nas vias principais e nas ruas internas do bairro. Durante o resto do ano, eles afirmam que o policiamento é insuficiente.
O patrulhamento na Barra é feito pela 11ª Companhia Independente de Polícia Militar com o apoio do Batalhão Especializado de Polícia Turística (Beptur) e pela Guarda Civil Municipal (GCM).
Segundo Carolina* (nome fictício a pedido da fonte), que tem um estabelecimento próximo ao Farol da Barra, apesar de os agentes das duas guarnições serem vistos diariamente no local, eles permanecem em média 30 minutos e nunca após as 18h. No final de semana, ela afirma que o tempo de permanência é um pouco maior.
A reportagem esteve no Farol das 14h às 18h. Neste período, uma viatura da PM foi vista passando e uma da Guarda ficou estacionada com alguns agentes. A guarnição da CGM permaneceu no local por duas horas, das 15h40 às 17h40.
“Quando ficam [os policiais] batem papo, riem, se distraem, fazem tudo, menos observar o que está ao redor para garantir nossa proteção. Às vezes o carro é deixado sozinho e ninguém os encontra quando procura. Às 18h ninguém vê policiais e o medo de ficar com o comércio aberto aumenta”, afirma Carolina, que foi assaltada há dois meses, depois de fechar sua loja, às 20h..
Comerciantes reclamam de falta de policiamento à noite (Foto: Paula Fróes/ CORREIO) |
Já Vitória* (também nome fictício), que trabalha na Barra, vai e volta com medo. Há um mês, ela ouviu tiros vindos de dentro de um galpão na Avenida Oceânica, em frente ao Cristo. O local já foi um restaurante, sediou um camarote no Carnaval e agora está vazio. Também fica próximo a um ponto de ônibus.
“Eu pego transporte ali todos os dias. Sempre foi inseguro, porque não há policiamento, mas depois do Carnaval piora. Neste dia, eu estava esperando o ônibus e vi um homem dentro [do galpão]. Depois ouvi vários tiros vindos de lá. Passou um ônibus e eu entrei correndo, mas ainda deu para ver o rapaz baleado no chão e outros homens se aproximando. Acho que eram seguranças”, disse.
Autoproteção
Nem o intenso movimento de sábado e domingo deixa os comerciantes seguros. De acordo com Carolina, o “deserto” em que a Barra se transforma de segunda a sexta mexe com a rotina da semana inteira e leva os comerciantes a adotarem as próprias medidas de segurança.
Os celulares não são deixados no balcão da loja, os funcionários evitam ficar de costas para não serem pegos distraídos e o horário de funcionamento do estabelecimento foi reduzido. “Não temos mais condições de fechar às 20h e fechamos 18h. Esse é justamente o horário que a Barra lota nos finais de semana, mas não vale a pena ficar porque não tem mais segurança”, diz Carolina.
Dono de uma pousada na Barra, Marcos Papaya instrui os hóspedes a andarem em grupo depois das 18h. “As pessoas são assaltadas à noite e temos o velho problema de ninguém denunciar porque já sabe que não vai dar em nada”, comenta.
Sobre isso, o registro das ocorrências é importante para que os autores dos delitos possam ser identificados e responsabilizados. Além disso, os dados ajudam a PM a intensificar o policiamento onde se mostra mais necessário.
“A gente não se sente seguro em lugar nenhum, mas é triste que isso aconteça até nos pontos turísticos, onde geralmente a segurança é maior. Não dá para deixar de vir, porque são nossos cartões postais, mas o celular só sai da doleira para uma foto rápida”, conta a representante comercial Fátima Souza, de 51 anos.
Moradores
Os moradores da Barra não só compartilham as insatisfações dos comerciantes, empresários e visitantes sobre a insegurança, como somam outros problemas à lista. Para o presidente da Associação de Moradores e Amigos da Barra (Amabarra), Watson Campos, falta manutenção nas vias, capinagem e conscientização dos visitantes quanto ao acúmulo de lixo e a depredação do patrimônio.
“O poder público vê a Barra como um palco e só se empenha em melhorar algo nas vésperas de grandes eventos, como o Carnaval. Depois deixa a Deus dará”, afirma.
Já a aposentada Sara Azevedo destaca a falta de ordenamento no uso do espaço. Segundo ela, o bairro não comporta o número de pessoas que recebe no final de semana, por também ser residencial. “Faltam fiscalização e policiamento, além de uma política de ações para trazer turistas e moradores para a rua com segurança”.
Respostas
A Polícia Militar informou que o policiamento na Barra é feito com o reforço do Batalhão Especializado de Polícia Turística (Beptur) e conta com policiais, viaturas e bases móveis em regime de 24 horas. Para isso, afirma levar em consideração os índices de ocorrências registradas e de acionamentos feitos.
A reportagem solicitou um posicionamento da Guarda Civil Municipal (GCM), da Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA) e da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo (Secult), mas até o fechamento desta matéria não houve resposta.
A Polícia Civil também foi procurada para informar o número de ocorrências de furto, roubo, homicídio e tentativa de homicídio registrados em 2022 e este ano na Barra. A corporação afirmou precisar de um prazo de 72 horas para realizar o levantamento.
*As fontes pediram para ter o nome preservado por medo de retaliações.
**Com orientação de Flávio Oliveira.
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