sábado, 31 de agosto de 2019

BREVIÁRIO DO PIRÔMANO SUICIDA

José Eduardo Agualusa

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O imenso crime em curso na Amazônia, e a consequente degradação da imagem do presidente Jair Bolsonaro e do Brasil no mundo, eram eventos de tal forma previsíveis que até eu fui capaz de os prever, em crônica recente, publicada neste mesmo espaço. Está feito: Bolsonaro já é o grande vilão global do nosso tempo. Nem Donald Trump conseguiu alguma vez vaia tão forte e tão unânime.
Deve ser uma sensação estranha, para o presidente dos EUA, ser ultrapassado no desvario, e na ululante rejeição planetária, por um proto-ditador caipira sul-americano. Imagino o pobre Donald, abandonado na solidão oval do seu gabinete, a fulgurante melena desgrenhada, o beiço esticado, tentando perceber se isso pode ser encarado como uma vitória ou como uma derrota.
Animado por este pequeno acerto atrevo-me a ir mais longe. Vou agora prever o que ocorrerá ao longo das próximas semanas. Se acertar em cinco pontos ou mais isso não significa que me tornei vidente. Significa apenas que certos atos têm consequências não apenas previsíveis, mas inevitáveis.
Resultado de imagem para CARICATURA BOLSONARO1. Aumentarão as denúncias de instituições brasileiras e internacionais sobre o envolvimento de grandes proprietários rurais no recente ataque à floresta.
2. Os países escandinavos, todos eles criptocomunistas, como sabe qualquer discípulo do grande filósofo Olavo de Carvalho, anunciarão boicotes à soja, couros, carne e outros produtos provenientes de áreas roubadas à floresta. Anunciarão ao mesmo tempo o apoio direto a movimentos ecologistas e de defesa dos povos indígenas.
3. Os restantes governos europeus, pressionados pelas ruas — pois as manifestações contra a destruição da Amazônia continuarão a multiplicar-se —, começarão a estudar medidas semelhantes.
4. Em outubro, Raoni Metuktire ganhará o Prêmio Nobel da Paz. Interrogado a respeito pelos jornalistas, Jair Bolsonaro perguntará: “E quem é esse Raoni, porra?!”
5. Por essa altura, a bancada ruralista, em absoluto desespero, já estará defendendo abertamente a destituição de Jair Bolsonaro.
6. Se Bolsonaro não cair, entretanto, a bancada ruralista terminará propondo o derrube em bloco do atual governo e a convocação de novas eleições.
7. Eleitores de Bolsonaro em viagem para Paris ou Lisboa vestirão camisetas “Lula Livre”, se não quiserem ser hostilizados pelas multidões de descontentes com as responsabilidades do atual governo brasileiro na destruição da Amazônia.
8. A China proporá comprar, por metade do preço, os produtos brasileiros que a Europa recusa. Na eventualidade de Donald Trump não conseguir ser reeleito, restará a Jair Bolsonaro aliar-se ao último grande país comunista do mundo. Quando interrogado a respeito dessa bizarra aliança, o presidente brasileiro encolherá os ombros: “O comunismo funciona muito bem na China porque lá eles são chineses, tá ok? Você é chinês? Não? Então cala a boca!”
9. Brigitte continuará casada com Emmanuel Macron, e Michelle continuará casada com Jair. Coitada da Michelle.
10. A Amazônia continuará a arder — e a imagem do Brasil também.

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