Desesperado, Putin tenta se manter no jogo
Presidente russo anunciou mobilização parcial da população nesta semana e ameaçou utilizar "todos os meios" à disposição para proteger o país
A Rússia está perdendo a guerra contra a Ucrânia. Ainda não foi derrotada, mas está caminhando nessa direção. E o presidente Vladimir Putin tem cada vez menos cartas para jogar.
A combinação das derrotas recentes no campo de batalha com a determinação do Ocidente — em particular, uma percepção de que a Europa pode simplesmente passar o próximo inverno usando suas reservas, sem precisar dos volumes habituais de energia da Rússia, já que os políticos ocidentais estão resolutos em não admitir a derrota —
deixou a Rússia “nas cordas” nesse ringue.
A suposta força militar do país e o seu status de superpotência energética (energia à qual os europeus dependiam) pareciam ser os ativos mais poderosos do governo russo. Mas agora se vê que essa era uma premissa errada.
Assim, Putin, um extremista mal induzido pelos seus subordinados acovardados sobre as verdadeiras capacidades do país, foi forçado a fazer uma manobra como se estivesse em um jogo de pôquer. Com as últimas cartas, ele renovou as ameaças nucleares (o que tem feito, aliás, há 15 anos) e lançou com uma manobra mais impopular, mas menos arriscada do ponto de vista político, que é a mobilização parcial de 300 mil reservistas.
É a ameaça do uso de armas nucleares, é claro, que faz com que os tomadores de decisão do Ocidente façam uma pausa e, em alguns casos, fiquem inseguros – e é essa a intenção. Afinal de contas, ninguém pode tratar com leveza algo assim vindo de um Estado que se voltou para o fascismo e detém cerca de metade das armas nucleares do mundo.
No entanto, uma maioria crescente das potências ocidentais e, atualmente, também de países não ocidentais, têm notado que não se pode ceder à chantagem nuclear e que as consequências da vitória da Rússia na guerra teriam efeitos danosos duradouros na segurança europeia e global.
Muitos líderes mundiais podem querer fazer concessões passando por cima dos líderes da Ucrânia. Mas é politicamente difícil fazer isso quando agressor e vítima são claramente distinguíveis entre si. E quando a Rússia parece estar em fuga.
De qualquer forma, uma pesquisa recente publicada pela Chatham House sugere que o limiar da Rússia entre a utilização ou não de armas nucleares é extremamente elevado. O quadro militar russo profissional tem procedimentos e processos ativos, ou seja, há uma série de controles e barreiras antes de se considerar o uso de armas nucleares.
Ameaçar um ataque nuclear preventivo é uma coisa, mas as pessoas sérias em posições importantes na Rússia sabem que as consequências seriam extremas – e, não menos importante, que trariam muitos mais países para a guerra com armamento cada vez potente. Assim, o uso do arsenal nuclear não é impossível – trata-se de uma situação insegura – mas permanece improvável.
Dito tudo isso, muitos políticos ocidentais ainda receiam de chamar de derrota a campanha russa, temendo as consequências das ações de um ditador desesperado ou de uma Rússia em estado de implosão (com um líder ainda mais extremo).
As lideranças dos Estados Unidos, da Alemanha e da França, em particular, não são tão explícitas ao ponto de fazer essa declaração, mesmo com a inconveniência de parecerem ignorar um resultado desfavorável à Rússia.
Em vez disso, os líderes ocidentais falam mais vagamente dos crimes da Rússia e do apoio à Ucrânia (“pelo tempo que for necessário”, como disse o chanceler alemão, Olaf Scholz, de forma encorajadora).
Mas esses países não conseguem conceber uma Rússia derrotada e falam da necessidade de não humilhar a Rússia (ou mesmo Putin) — sem ligar os pontos de que ajudar a Ucrânia a restaurar a sua integridade territorial do país humilharia muito o Kremlin.
Na verdade, os políticos têm razão em temerem uma Rússia enfraquecida e humilhada. Mas a lógica sugere que eles devem ser ainda mais cautelosos em relação a uma Rússia forte e encorajada. O discurso de Putin na quarta-feira (21), portanto, pouco muda.
Certamente não altera a determinação ucraniana, mas é fácil imaginar que assusta ainda mais o povo russo, com medo de ser envolvido na disputa. Muitos russos ainda apoiam Putin (ou pelo menos são ambivalentes), mas a maioria não quer lutar.
Da mesma forma, os referendos a serem realizados na região de Donbass, na Ucrânia, ainda dominada pela Rússia, também terão pouco efeito. Na verdade, essas “votações” nem sequer se destinam a parecer legítimas, como acontece com tantas outras “eleições” russas.
Isso seria exigir demais de todos, exceto para os apoiadores mais fervorosos de Putin. Na melhor das hipóteses, os referendos poderão servir de pretexto a uma mobilização russa mais ampla e para o caso de a guerra ser travada no território russo – justificando assim a nova pressão por reservistas e o seu inevitável sacrifício.
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