Significado de remoer, verbo transitivo: moer de novo, repisar, importunar, remoer a paciência. Separação silábica: re-mo-er, assim, soletrando para que fique completamente em evidência o verbo utilizado pelo Presidente Lula, no dia 28 de fevereiro quando, em referência as rememorações dos 60 anos do golpe empresarial militar de 1964, disse estar mais preocupado com a tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023 do que com “remoer o passado” dos anos de chumbo do terrorismo do estado. Talvez a frase mais infeliz do Lula 1, Lula 2 e o Lula 3? Até acrescentaria, aos três governos do ex operário metalúrgico, a extensão desta tenebrosa sombra da palavra remoer, todo o seu passado de luta sindical iniciada precisamente no período ditatorial. Em suma, uma substantiva trajetória manchada por um verbo.
Confesso que, ao ler que o Lula, cuja presidência atual é também fruto da luta popular eleitoral recente face ao saudosismo de torturas, estupros e desaparecimentos que quase se reflete numa segunda presidência de um sujeito que reivindica um dos principais expoentes daquele período de terror, Carlos Brilhante Ustra, o coronel das torturas e assassinatos, confesso que um calafrio profundo trouxe à tona tanto sangue que jamais deveria ser colocado embaixo do tapete, seja pelo motivo que for, inclusive um relacionamento estratégico com as Forças Armadas
Como é possível, além de afirmar com esta atitude de subserviência ao Poder Militar, reivindicar o protagonismo da época - e o de hoje - da classe empresarial ligada aos interesses dos grandes monopólios através do papel dos Estados Unidos no Golpe de Estado de 1964, e se curvar ao esquecimento de um passado que está sempre alerta para dar o bote, como aconteceu há pouco mais de um ano neste país?
Há antecedentes de uma deplorável atitude similar a esta? Há sim. Em 2010, antes dos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, instituída em 2012, que apurou as violações dos Direitos Humanos, o atual presidente se manifestou contrário a modificar a Lei de Anistia, mantendo na impunidade os crimes de Estado da ditadura empresarial militar, crimes similares aos da Operação Condor que países vizinhos condenaram com exemplares prisões, inclusive de generais e presidentes militares.
Certamente “não remoer o passado” não pode ser apenas uma declaração individual, uma exclusiva decisão presidencial, assessores do Palácio do Planalto também são responsáveis por esta afronta à resistência popular durante a longa noite de 21 anos. Hoje, em pleno governo popular, assistimos a destruição daquilo que norteou, no livro Brasil Nunca Mais, o esclarecedor trabalho de Dom Paulo Evaristo Arns: o exercício da coragem perante o horror militar.
Carlos Pronzato
Cineasta, diretor teatral, poeta e escritor
Sócio do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB)
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