Seus verdugos farão com que ele nunca tenha existido
Enviar um cartão de boas-festas com uma imagem de Woody Allen exige hoje certa coragem. Nos últimos meses, a campanha nos EUA para destruir Woody como artista parece ter sido vitoriosa. Ele tem um filme pronto há um ano, “A Rainy Day in New York”, e sem previsão de lançamento porque a produtora, a Amazon, teme que um boicote decrete seu fracasso na bilheteria.
A acusação de ter abusado de sua filha adotiva Dylan Farrow quando ela tinha sete anos, iniciada meses depois do suposto fato por sua ex-mulher, Mia Farrow, e ultimamente martelada pela propria Dylan, nunca foi provada. Mas quem quer saber?
Se seu filme já pronto tem poucas chances de ser exibido, pode-se presumir que ele nunca mais encontrará quem financie os que ainda poderia fazer —e sua média como diretor, desde 1969, era de um filme por ano, para deleite de seus fãs, dos críticos e, desde há muito, dos historiadores do cinema.
E este é o ponto. Um articulista da revista The New Yorker perguntou-se outro dia se ainda poderíamos gostar dos antigos filmes de Woody Allen. Ou seja: seus verdugos não se limitarão a extirpar Woody do cinema de agora em diante, mas a partir do próprio dia em que ele começou ou, quem sabe, nasceu. Será como se nunca tivesse existido.
Essa prática não é nova. Era comum na URSS do ditador Stálin, cujos ex-aliados “sumiam” de repente, apagados dos documentos, das fotos e da própria história.
Ruy Castro
Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues.
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