sexta-feira, 24 de junho de 2022

AS PEDRAS DE MINHA RUA

 


Acaba de ser descoberto um gigantesco sarcófago de granito enterrado há cerca de dois mil anos perto de Alexandria. Estava em perfeito estado.

Mas o que vale para o granito egípcio não vale para o granito dos meios-fios da Rua Direita de Santo Antônio e da Ladeira do Aquidabã. Durante a avacalhação geral que foi – e ainda é – a famigerada obra de reabilitação (sic) de parte do bairro, um arquiteto responsável (sic) afirmou que a substituição dos meios-fios velhos de três ou quatro décadas foi por razão de segurança (sic). Fotografei alguns e não me foi possível constatar o perigo que ofereciam. Suponho, portanto, que as aparentemente inofensivas pedras dissimulavam seu jogo com a maior hipocrisia. Mas onde estão, hoje, as pedras originais?

Outra bizarrice foi a substituição dos paralelepípedos originais, em perfeito estado de conservação por outros, de tamanho muito mais modesto, portanto mais leves e mais fáceis de se soltarem. O motivo apresentado pelo mesmo responsável (re-sic) foi a dificuldade de se retirar o asfalto grudado em parte das pedras. Posso opor novo questionamento? Sessenta anos atrás, o templo inteiro de Abu Simbel foi deslocado para recolocação numa colina feita de propósito, 64 metros acima do nível original. E a CONDER não é capaz de remover uma camada de 20 ou 30 centímetros de espessura de betume? Mas onde estão, hoje, as pedras originais? Alguém está nos fazendo de retardados.

O clímax de tanto amadorismo - ou mera falta de caráter - foi atacar a picareta os degraus tricentenários da escada da igreja de Nossa Senhora do Boqueirão para substitui-los por finas lâminas de arenito. Tudo feito sem o menor embasamento técnico, nem a vigilância de arqueólogos/historiadores especializados. A agressão foi devidamente acompanhada por um restaurador (sic) que, quando a comunidade começou a protestar, imediatamente telefonou ao Bruno Tavares, superintendente do IPHAN. Existem testemunhas. Alguém me expliqua?

Não fosse a reação sadia e imediata da comunidade, hoje teríamos uma escadaria de dar inveja a um shopping center.

Restar-nos-ia falar, mas o espaço é curto, das cores berrantes (Tintas Renove para pisos e quadras) ridicularizando o casario do bairro. Colocar chapas de acrílico em fachadas que precisam respirar para eliminar o excesso de umidade é puro vandalismo.

O que estou denunciando é o topo do topo da pirâmide de omissões, indiferenças e ignorância dos gestores - sejam eles municipais, estaduais ou federais - para não falar em motivações mais graves. O riquíssimo patrimônio cultural da Bahia está sendo depredado quando não simplesmente destruído.

Alô! Governador! Saiba que o turismo nunca se alimentará só de praias, aliás cada dia mais poluídas.

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